Japão para além do óbvio: um mergulho na província de Miyazaki, no sul do país

Japão para além do óbvio: um mergulho na província de Miyazaki, no sul do país

A província de Miyazaki, ao sul do Japão, é destino de natureza singular e imersão cultural, religiosa e histórica ainda pouco explorado por turistas brasileiros

O fascínio pela cultura milenar e a curiosidade pela convivência pacífica entre a tradição e a modernidade atraem visitantes do mundo inteiro ao Japão, e o Brasil não é exceção. Para nossa sorte, desde o final de setembro, brasileiros em viagens de curta permanência não necessitam mais de visto para visitar o país do sol nascente.

O principal destino para quem viaja ao Japão é a cosmopolita Tóquio, além do símbolo nacional Monte Fuji e as cidades relativamente próximas à capital, como Quioto, Nara, Osaka, Hiroshima e Kobe, e que podem ser acessadas por trem-bala, o shinkansen. Mas o país asiático é repleto de destinos incríveis e, se quiser estender um pouco mais a estadia, você pode se surpreender com a diversidade de passeios que outros locais menos visitados proporcionam.

 

Vista das palmeiras Phoenix e da formação rochosa de Oninosentakuita em Horikiri Pass – foto iStockphoto

 

O Japão é constituído por quatro ilhas maiores: Hokkaido ao norte, a ilha maior Honshu, Kyushu e Shikoku mais ao sul, e as ilhas de Okinawa. A 932 km de Tóquio, na ilha de Kyushu, fica a província de Miyazaki, conhecida como o Japão ensolarado. A região está entre as melhores do país em temperatura média, horas de sol e número de dias ensolarados. O voo direto de Tóquio a Miyazaki dura pouco menos de duas horas. Caso vá de trem, tome o trem-bala da JR Tokaido/Sanyo/Kyushu Shinkansen de Tóquio até Kagoshima, e de lá o trem da JR Kirishima Limited Express até Miyazaki, totalizando 9,5 horas de deslocamento. Esse trajeto é coberto pelo JR Pass, um passe de trem exclusivo para turistas estrangeiros válido para linhas de Japan Railways Group.

Miyazaki também é repleta de mitologia japonesa e relacionada a lendas sobre o primeiro imperador do Japão e fundador da dinastia imperial, o Jinmu Tennou. Segundo a tradição xintoísta, Jinmu é considerado descendente direto da deusa do sol, Amaterasu Ômikami, citado em Kojiki, considerado o livro mais antigo sobre a história do país.

Ao norte da província está localizado o famoso Desfiladeiro de Takachiho, na cidade homônima. O cenário da beleza natural junto ao rio Gokase, torneado pelo estreito desfiladeiro, é de tirar o fôlego. Por ali, é possível alugar botes a remo e navegar pelo rio, apreciando a tranquila paisagem e a queda de 17 metros de altura da cachoeira Manai (Manai no taki) – o aluguel sai por 4100 ienes (R$ 135 na cotação atual) para três pessoas em um passeio de 30 minutes, de terça a quinta-feira, e o valor fica em 5100 ienes (R$ 168) de sexta a segunda.

 

Desfiladeiro de Takachiho e a cachoeira de Manai – foto Depositphotos

 

Takachiho tem ainda importância no âmbito religioso e espiritual. Próxima ao desfiladeiro, está a caverna sagrada Amano Iwato, palco de um episódio mitológico envolvendo a deusa do sol. Irritada com o caos criado pelo seu irmão Susanoo, deus do mar, Amaterasu escondeu-se na caverna celestial Amano Iwato. Mergulhados na escuridão com a falta de luz, os deuses planejaram uma grande festa para despertar a sua curiosidade. A estratégia funcionou e ela teria espiado pela fresta da rocha que fechava a caverna, de modo que foi puxada para fora e o mundo voltou a ser iluminado. Nesse local, foi erguido o santuário Amano Iwato Jinja – possivelmente construído durante o século 9. A caverna não pode ser acessada, porém há um mirante atrás do edifício principal do santuário, de onde os visitantes contemplam o rio. Para acessá-lo, é necessário solicitar a um sacerdote uma visita guiada.

 

Santuário de Amano Iwato – foto Tereza Maeyama

 

E essa história é encenada em um espetáculo de dança com 33 atos, conhecido como Yokagura, com dançarinos mascarados e música com instrumentos tradicionais japoneses. Como a apresentação inteira é longa, recomenda-se assistir a Takachiho Yokagura – uma versão em quatro atos, encenada todas as noites, das 20 horas às 21 horas, no santuário Takachiho Jinja, com ingresso a 1000 ienes (R$ 33 na cotação atual). O lugar fica no extremo oeste do centro da cidade, a 15 minutos a pé do Centro Rodoviário Takachiho. Alguns hotéis da região oferecem ônibus gratuito de ida e volta para as apresentações noturnas.

Paisagem quase tropical

Seguindo viagem em direção ao sul pela costa de Nichinan, o cenário montanhoso dá lugar à linda vista do Oceano Pacífico e à rodovia margeada por palmeiras Phoenix – árvore-símbolo oficial da província – trazendo à lembrança a nossa paisagem tropical. De fato, Miyazaki possui um clima mais ameno em relação ao norte do Japão, a ponto de ser famoso pela produção de mangas.

Uma das principais atrações de Miyazaki é a ilha de Aoshima, cujo acesso do continente é feito atravessando a ponte Yayoi. A areia é substituída pela peculiar formação rochosa chamada Oni no Sentaku Ita, ou literalmente “Tábua de lavar do Diabo”, visível na maré baixa. Essas rochas que circundam a ilha são compostas de arenito e argilito que se acumularam em camadas no fundo do mar há 6,5 milhões de anos, sofreram erosão das ondas, formando desníveis. A própria ilha foi denominada monumento natural, enquanto a sua flora, composta por plantas subtropicais, é “monumento natural nacional especial”. Da estação de Miyazaki à estação de Aoshima são apenas 30 minutos de viagem de trem.

 

A ilha de Aoshima – foto divulgação

 

A cerca de 40 km da capital Miyazaki, está o santuário Udo Jingu — a apenas 90 minutos de ônibus a partir da cidade. O honden, santuário principal, localizado dentro de uma caverna na encosta de um penhasco, oferece uma vista espetacular e fica aberto das 6h às 18h. Para chegar até lá, percorre-se o caminho pela encosta, com vista para o mar. Dedicado a Ugayafuiaezu, pai do imperador Jinmu Tennô, o santuário é associado à gravidez e ao parto. Como em outros santuários, há lojinhas que vendem amuletos para diversos fins, como proteção à saúde e sucesso.

 

Penhasco a caminho de Udo Jingu – foto Rose Oseki

 

Para descansar e recarregar as energias após todos esses passeios, o Phoenix Seagaia Resort – um espaçoso resort à beira-mar que se estende por quase dez quilômetros de costa – oferece atrações como fontes termais, spas, restaurantes, praias para prática de surf, quadras de tênis e diversas atividades ao ar livre. Em frente, está o Sheraton Grande Ocean Resort, um edifício de 45 andares, cujos quartos apresentam uma vista panorâmica espetacular do Oceano Pacífico, além de incluir campos de golfe Tom Watson, projetados pelo famoso jogador Tom Watson da PGA, e o Phoenix Country Club, que sedia um dos maiores campeonatos da Japan Golf Tour.

A riqueza gastronômica também se manifesta na província. Em Miyazaki, além de pratos típicos da região, como Chicken Nanban (frango mergulhado em vinagre doce) e o Hiyajiru (sopa fria), pode-se saborear a culinária japonesa com ingredientes frescos da estação, como no almoço servido em Obi Hattori-Tei, a 40 minutos de carro de Aoshima. O restaurante funciona diariamente, das 11h às 14h, em uma propriedade centenária e a cidade é conhecida por abrigar casas de samurais bem preservadas.

 

Almoço servido em Obi Hattori-Tei com ingredientes locais – foto Rose Oseki

 

Sheraton Grande Ocean Resort
Hamayama, Yamasakicho, Miyazaki 880-8545, Província de Miyazaki.
Diárias a partir de R$ 1.250,00.

*A editora de arte viajou a convite do governo de Miyazaki

Riade recebe pela segunda vez festival de arte contemporânea com obras cheias de tecnologia e inovação

Riade recebe pela segunda vez festival de arte contemporânea com obras cheias de tecnologia e inovação

Riade, capital da Arábia Saudita, sedia o Noor Riyadh, um dos festivais de luz e arte contemporânea mais instigantes da atualidade

A atenção global se volta ao oriente médio neste fim de ano. Para além de receber jogadores e torcedores de futebol para a Copa do Mundo da Fifa, a região também se abre para artistas e apreciadores de inovação, design e cultura. A uma distância curtíssima de um voo de uma hora e meia de Dubai e uma hora de Doha, no Catar Riade, capital da Arábia Saudita, caminha para se tornar uma cidade cosmopolita e vibrante. Com uma população jovem e crescente hoje são mais de 7 milhões de habitantes a maior cidade do país também sedia grandes eventos culturais, como o Noor Riyadh, um dos festivais de luz e arte contemporânea mais instigantes da atualidade.

Esta foi a segunda edição do evento, com quase o triplo do tamanho de 2021, e contemplou mais de 190 obras e 130 artistas sauditas e internacionais distribuídas pela cidade, transformando-a em uma imensa galeria de arte a céu aberto. “Noor” (“luz” em árabe) Riyadh é um dos programas organizados por Riyadh Art uma iniciativa nacional de arte da Comissão Real, com o objetivo de incentivar os artistas locais e ampliar a economia cultural e criativa da Arábia Saudita. Sob o tema “We dream of new horizons” (Sonhamos com novos horizontes), o festival traduziu o sentimento de esperança no futuro.

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

 

Grande parte das instalações estiveram expostas pela capital de 3 a 19 de novembro, distribuídas em 40 lugares e cinco eixos principais: Bairro Diplomático (The Diplomatic Quarter ou DQ), Distrito Financeiro Rei Abdullah (King Abdullah Financial District ou KAFD), Distrito JAX um novo espaço criativo com ateliês de artistas, Parque Salam e Parque Rei Abdullah. Foram intervenções arquitetônicas em grande escala, esculturas efêmeras, projeções em 2D e 3D, instalações site-specific imersivas, show de drones e peças de realidade aumentada, entre vários recursos de luminotécnica empregados, que materializaram o que há de mais tecnológico na arte internacional contemporânea.

Para aqueles que ainda pretendem visitar esta edição do evento, uma parte do festival a exposição “From spark to spirit” (Da fagulha ao espírito), com obras de 30 artistas e instalada em JAX 03 pode ser vista até 4 de fevereiro de 2023. Sob curadoria de Neville Wakefield e Gaida Almogren, a mostra contempla a obra “Bold copper lights” da artista brasileira Jac Leirner, que traz sua linguagem minimalista conectando uma tomada a uma lâmpada através de quatro mil metros de fio elétrico, contrapondo o grande caminho percorrido pela energia ao imediatismo da velocidade da luz.

Foto Cortesia do Artista

Foto Cortesia do Artista

 

Foto Cortesia do Artista

Foto Cortesia do Artista

 

Outro brasileiro com presença marcante no Noor Riyadh foi Leandro Mendes, mais conhecido como Vigas, cuja obra multimídia “Apparatus 1010” esteve presente no Distrito Financeiro Rei Abdullah (KAFD), moderno complexo urbanístico de negócios e lazer. Artista multidisciplinar, ele iniciou seus trabalhos como VJ e transita entre videomapping, instalações com luzes e criação de espaços efêmeros que permitem ao público se sentir transportado para um lugar fora da realidade. Para o festival, foi criado um pavilhão onde o espectador pudesse se desconectar do entorno e trazê-lo para dentro de uma experiência sensorial única e viajar entre os universos paralelos. LIGHT FALLS, sua última obra lumínica em formato de cachoeira na fachada de um prédio com oito metros de altura, pode ser vista até janeiro no festival Glow Georgetown, em Washington, nos Estados Unidos.

Uma das atrações mais esperadas aconteceu ao ar livre no Parque Rei Abdullah: o espetacular show aéreo de enxame de 2 mil drones concebido por Marc Brickman designer de iluminação conhecido pelos seus trabalhos em shows de Pink Floyd, filmes como Minority Report, de Steven Spielberg, e iluminação do Empire State Building. A mostra incluiu também obras mais introspectivas como “I see you brightest in the dark” (Vejo você mais brilhante no escuro), do artista local Muhannad Shono uma bela intervenção que ocupou um edifício da década de 1980 no distrito Bayt Al Malaz, com instalações que usavam fio branco e luz para produzir estruturas luminosas.

Foto Rose Oseki

Foto Rose Oseki

 

Além das imersões nas obras de arte pelo público em geral, tours guiados, workshops, apresentações musicais, palestras e debates, leilão beneficente e excursões escolares também fazem parte do programa de Noor Riyadh, que já tem edição de 2023/2024 confirmada, com data a ser divulgada no site www.riyadhart.sa/en/noor-riyadh/.

Ruas ocupadas, arte viva

Por causa das temperaturas mais amenas à noite, em torno de 15 graus celsius, Riade é uma cidade essencialmente noturna. Famílias e amigos costumam se reunir em parques e estendem seus tapetes sobre a grama para fazer churrascos e piqueniques, e foi assim que também apreciaram as instalações do festival. Áreas públicas como o Parque Rei Abdullah, o Bairro Diplomático e Wadi Hanifa um vale de 120 km de comprimento que corta a cidade foram intensamente ocupadas por obras de arte que trouxeram muita cor, beleza e imersão sensorial ao espaço. Até as dunas do deserto foram palco para instalações gigantescas como OASIS, de Arne Quinze, com 16 metros de altura e 40 metros de comprimento, e AXION, de Christopher Bauder.

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

 

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

 

Ao passear pela capital, fica evidente a mistura de vários estilos arquitetônicos. Em contraponto aos modernos arranha-céus de influência ocidental do Distrito Financeiro, no bairro antigo da cidade, é possível conhecer uma construção feita de barro com a técnica tradicional nadj, o Forte Al-Masmak, ligado à história da Arábia Saudita. Em 1902, o lugar foi palco da disputa que ficou conhecida como a Batalha de Riade, que acabou por unificar os reinados locais e formou o país como o conhecemos atualmente.

Um grande destaque da cultura da Arábia Saudita é o café, que faz parte do ritual de hospitalidade e costuma ser servido aos visitantes com a mão esquerda em uma cafeteira tradicional chamada “dallah” e em pequenas xícaras. Para nós, brasileiros, a bebida se parece mais com um chá, por ser suave, e foi reconhecida como patrimônio cultural imaterial da Humanidade pela Unesco.

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

Foto Cortesia do Artista | ©NOOR Riyard 2022, Programa de Riyard Art

 

Foto Divulgação

Foto Divulgação

 

A caminhada pelo Souq Al-Zel, o mercado mais conhecido da cidade, é indispensável. Por ali, se encontram tapeçarias, vestuários tradicionais, como abaya, perfumes e incensos, além de ser o lugar ideal para exercitar a arte de pechinchar, como é tradição em muitos países árabes. Há até leilões de objetos antigos ao ar livre!

Ótimas e diversificadas opções gastronômicas não faltam em Riade, como o restaurante italiano Il Baretto, localizado em KAFD; a cozinha saudita tradicional de Suhail; e The Globe, de cozinha europeia moderna, no interior da esfera dourada do topo da Torre Al Faisaliah, que oferece uma experiência espetacular da visão panorâmica da cidade. Aliás, a torre é um arranhacéu de 267 metros de altura projetada pelo arquiteto inglês Norman Foster e abriga um hotel cinco estrelas, do grupo Mandarin Oriental. Com excelente localização, é uma hospedagem elegante entre a arte e as luzes desse lugar milenar.

Foto Rose Oseki

Foto Rose Oseki

 

Foto Istockphoto

Foto Istockphoto

 

Antes de viajar, atenção!

Para visitar a Arábia Saudita, é necessário obter visto. A embaixada sugere contratar serviços de empresas para facilitar o processo e é preciso apresentar certificado internacional de vacina para febre amarela antes de embarcar. A viagem aérea inclui conexão, em geral em Dubai, nos Emirados Árabes. Para as mulheres, é importante se atentar ao uso de roupas mais discretas e que não sejam curtas ou muito justas ao corpo. O uso de véu não é obrigatório para estrangeiras, com exceção da visita às mesquitas.

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HOTEL AL FAISALIAH
King Fahd Rd, Olaya, Riyadh 11491, Saudi Arabia
Diárias a partir de R$ 2.500.