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Hotéis e destinos que usam os recursos naturais de forma sustentável

Hotéis e destinos que usam os recursos naturais de forma sustentável

A sustentabilidade é algo de extrema importância. Pensando nisso, apresentamos alguns hotéis que usam os recursos naturais de forma responsável, com respeito ao meio ambiente e às comunidades locais.

Experiência na Amazônia

Às margens do Rio Negro, em frente ao Parque Nacional de Anavilhanas, o segundo maior arquipélago fluvial do mundo, fica um hotel lindo e concebido de forma sustentável. O Mirante do Gavião Amazon Lodge, projetado pelo Atelier O’Reilly, priorizou a adequação ao seu entorno: as construções têm pisos elevados, de modo a preservar a permeabilidade do solo; o desenho busca a iluminação e a ventilação naturais; placas de energia solar abastecem o sistema. A obra, que utilizou a tecnologia de construção de barcos, empregou sessenta pessoas da comunidade ribeirinha por dois anos. A preocupação com a cultura local envolve a gastronomia: o restaurante do hotel, Camu Camu, destaca os ingredientes amazônicos, em receitas assinadas pela chef Debora Shornik.

No paraíso

Na Serra da Mantiqueira, o Vale do Matutu, a 17 km de Aiuruoca, em Minas Gerais, é um convite à conexão com a natureza. Na língua indígena dos antigos habitantes da região, Matutu significa “Cabeceira Sagrada”, e realmente não há palavra melhor para definir esse vilarejo localizado a 1300 m de altura, repleto de cachoeiras. Área de Proteção Ambiental, o povoado conserva seus recursos naturais intactos devido ao intenso trabalho da Associação de Moradores da região. A maior parte das pousadas serve comida vegetariana e mantém hortas orgânicas e construções com madeira certificada. Duas boas opções de hospedagem são a Mandala das Águas, um lugar lindo, cuidado pelo casal Marcia Arreguy e Rickson Sluss, e a Pousada Patrimônio, que conta com energia solar fotovoltaica.

Árvores e nascentes

Com 400 unidades na América do Sul, a rede francesa AccorHotels conta com uma ampla política interna para promover sustentabilidade. Um de seus principais programas é o Planet 21, que envolve, além de funcionários e parceiros, os hóspedes e as comunidades. Entre as ações da rede há a redução do desperdício alimentar, a nutrição responsável (os restaurantes não servem espécies de peixes ameaçadas de extinção), hortas nos hotéis e a construção de edifícios com baixas emissões de carbono, feitos com materiais recicláveis e madeira certificada.

Em cinco anos, o consumo de água foi reduzido em 9%, o de energia em 5%, e as emissões de carbono em 6%. Quando os hóspedes reutilizam as toalhas, metade dessa economia é doada ao plantio de mudas em regiões degradadas. No Brasil, o projeto é realizado na Serra da Canastra, em Minas Gerais. Já foram plantadas quase 580 mil mudas de mais de cem espécies nativas da região, reflorestando 332 hectares nas bacias dos rios São Francisco, Araguari e Rio Grande e 241 nascentes foram preservadas.

SAIBA MAIS:

patrimoniodomatutu.com.br
mirantedogaviao.com.br
accorhotels.com

Eduardo Srur usa a arte para conscientizar a sociedade

Eduardo Srur usa a arte para conscientizar a sociedade

Os caiaques no Rio Pinheiros (2006)

Eduardo Srur é conhecido pelo questionamento dos problemas urbanos por meio de intervenções artísticas em espaços públicos. Dessa vez, após uma trajetória de dez anos utilizando a rua como plataforma, ele leva o discurso de volta a uma instituição formal, o Museu de Arte Contemporânea da USP (MAC), com a instalação “Caos”, uma forte crítica à ditadura do carro.

Dois paredões de carrinhos de brinquedo foram construídos bem no pátio do museu, medindo 6,4 x 3,3 metros e edificados com quatro mil exemplares amontoados. A reflexão proposta é clara: o sufocamento causado pelo trânsito nas metrópoles. “Agora, em 11 de dezembro, a obra estará diferente. Vou desmontar as paredes e fazer um estacionamento gigante com os milhares de carrinhos, e o público vai poder levar embora. Vou doar esse trabalho”, ele avisa.

Srur chamou atenção em 2008 com as esculturas em forma de garrafas pet gigantes que colocou nas margens do Rio Tietê. Outra de suas obras famosas é a réplica de uma carruagem imperial alçada a 30 metros de altura na Ponte Estaiada da Marginal Pinheiros, em 2012. Naquele mesmo ano, ele construiu um labirinto enorme de resíduos sólidos no Parque Ibirapuera. Em 2013, ocupou o centro de São Paulo com “Farol”, uma instalação com milhares de ratos de borracha no Vale do Anhangabaú.

O “Pintado”, em 2017

Para ele, o meio ambiente, o consumismo e a mobilidade urbana são questões cotidianas que mexem com qualquer pessoa que esteja numa grande metrópole como São Paulo. “Como artista, comecei a trazer esses assuntos para gerar um balanço visual que provoca e faz refletir. Traz um pouco de humor, mas também tem uma questão política. É uma vontade de explicitar, de maneira diferente, estes erros urbanísticos”, ele diz. Srur gosta do trabalho que tem algo a dizer, aquele que gera uma reflexão na sociedade. “É importante buscar uma nova perspectiva da realidade sobre as questões contemporâneas. Como o Ai Wei Wei está fazendo na Oca, com “Raiz”, ele compara.

Em 2017, o seu “Pintado”, um peixe colorido, gigante e inflável, navegou sobre as águas poluídas do rio Pinheiros. À noite, o peixe ficava iluminado por energia solar ao lado da ciclovia do rio. “Se a sociedade é incapaz de cuidar do rio Pinheiros, o “Pintado” nos lembrará que a arte é um caminho possível. O artista não dá o peixe, ele ensina a pescar”, ecoa Eduardo.

Além de toda preocupação política, ele cuida para que suas obras não causem impactos.”Procuro evitar o resíduo. Quando não dá, sigo transformando. As garrafas pet, por exemplo, viraram mochilas escolares, os carrinhos serão compartilhados… sempre tenho um pensamento que chamo de resíduo zero pós-produção/exposição. Ou a transformação das obras em outras coisas”.

Famosa na noite paulistana, a D. Edge promove baladas ao som de rock nas segundas-feiras

Famosa na noite paulistana, a D. Edge promove baladas ao som de rock nas segundas-feiras

Na D.Edge, linhas de LEDs piscam no ritmo da música

As luzes de Natal se acendem em São Paulo e isso me faz lembrar que os meus netos já são praticamente adultos e não podem ganhar brinquedos de presente. Saudades dos tempos quando eu sabia o que comprar para eles. Ainda assim, para mim eles sempre serão meus pequenos.

Frustrada com as minhas compras de Natal, saí de mãos vazias do shopping Bourbon e caminhei a esmo pelas ruas da Barra Funda. Era uma noite de segunda-feira quando, durante minha andança, vi-me na frente da D. Edge. Tomada pelo espírito da noite, decidi entrar naquela casa noturna.

E que adorável decisão a minha. O lugar é uma típica balada: escuro e com luzes de neon. No primeiro andar fica a pista de dança. O teto e as paredes são tomados por linhas que piscam no ritmo da batida da música. Nas segundas-feiras, as músicas são dedicadas para o gênero rock’n roll. É ali também onde fica o bar: na ocasião, pedindo duas doses de Jägermeister, o terceiro saía por conta da casa.

O efeito foi suficiente para eu dançar a noite toda. Subindo mais um lance de escada chega-se no terraço, um espaço ao ar livre onde as pessoas fumam, conversam e fazem novas amizades. Fiz várias. Conheci um grupo de jovens que deveriam ser verdadeiros cinéfilos porque conversavam empolgadamente sobre o ator Michael Douglas. Também conheci a Julia Bueno, uma ruiva muito simpática e que foi DJ naquela noite.

Aliás, essa minha noite pode ser resumida assim: uma transumância entre a pista de dança, passando vez ou outra no bar para pedir gim-tônica ou caipirinha, e o terraço, onde eu conversava e aproveitava a vista noturna que se tem do Memorial da América Latina. O tempo passou rápido, lembro de sair de lá com o sol nascendo – o que foi bom, porque na volta para casa já aproveitei e passei em uma padaria para comprar pão.

Meu único conselho é ficar atento aos preços das bebidas da D. Edge, a conta pode sair cara no final da noite.

E, ah! Termino aqui dizendo que ainda não resolvi o que comprar para os meus netos. Espero que você, leitor, tenha melhor sorte nos seus presentes de Natal.

Beijos!

André Trigueiro busca um modo mais sustentável para o mundo

O nome mais importante do jornalismo ambiental do país, André Trigueiro se multiplica para dar conta de todas as suas atividades. Professor e criador do curso de jornalismo ambiental da PUC-Rio, palestrante, editor-chefe do programa “Cidades e Soluções”, comentarista do programa “Estúdio i” (ambos do GloboNews) e articulista da Folha, ele também é autor de seis livros e conferencista espírita. Premiado por suas reportagens ligadas à temática socioambiental, André Trigueiro é um apaixonado pela causa, defensor da educação como forma de nos livrar do risco do colapso: “A gravidade da crise ecológica precisa ser objeto de atenção nas escolas, do contrário formaremos novas gerações de analfabetos ambientais”.

André Trigueiro

Jornalista que abraçou a causa do meio ambiente com rigor, André Trigueiro fala sobre a urgência de buscarmos um modelo de desenvolvimento sustentável

Em sua palestra na HSM você frisou a urgência de empresários e executivos investirem na sustentabilidade. O mundo corporativo evoluiu nesses últimos anos?

Sem dúvida, há avanços. Hoje as empresas buscam certificações ambientais, produzem relatórios de sustentabilidade, reduzem consumo de água e energia, dão destinação inteligente aos resíduos, entre outras ações. Há ainda mobilizações coletivas através de entidades como o Ethos e o CEBDS, assumindo publicamente compromissos em favor do meio ambiente ou cobrando ações do governo na mesma direção.

Entretanto, há ainda quem invista em campanhas publicitárias sem mudanças efetivas nos meios de produção ou, pior, induzindo deliberadamente o consumidor ao erro. O caso mais escandaloso de “maquiagem verde” foi o da Volkswagen, que burlou um sistema que aferia a emissão de poluentes de veículos movidos a diesel. A montadora foi obrigada a reconhecer a fraude e isso abalou gravemente sua imagem e a reputação. Onde há democracia, imprensa livre, Ministério Público atuante e redes sociais compartilhando informações rapidamente, erros como esse custam caro e podem ser fatais.

Qual é o papel das empresas na construção de uma sociedade sustentável?

Não há futuro para marcas que não sejam comprometida com o meio ambiente. Pesquisas de prospecção de cenários no mundo corporativo têm apontado o crescimento de uma nova categoria de consumidor, cada vez mais exigente em relação aos impactos causados pelo produto ou serviço que deseja adquirir. Como comer uma carne que tenha cheiro de floresta queimada ou digital de mão de obra escrava ou infantil?

A certificação da carne (rastreabilidade e selagem) está sendo negociada para atender as expectativas dos importadores (especialmente da Europa) e de um contingente cada vez maior de brasileiros. A expansão da consciência ambiental obriga o setor produtivo a fazer ajustes. Não fazê-los significa perder competitividade. Só permanecerão no mercado os que perceberem a inevitabilidade dessa nova cultura.

Por que não boicotamos produtos de empresas que agridem o meio ambiente, como acontece lá fora?

Esse nível de mobilização e consciência costuma acontecer em países onde o nível de informação, educação e cultura são altos. Mas não é impossível vermos isso acontecer por aqui, se as circunstâncias forem favoráveis. O agravamento da crise ambiental abre caminho para esse gênero de protesto.

A tragédia causada pela Samarco é sempre citada como “o desastre de Mariana”, minimizando a responsabilidade dessa empresa. O que podemos aprender com essa triste história?

Não foi acidente. Houve omissão e irresponsabilidade. Os erros que precederam o rompimento da barragem do Fundão foram tão escandalosos que o Ministério Público Federal acusou os responsáveis por homicídio doloso. O fato de até hoje ninguém ter sido preso, nenhuma multa ter sido paga, os que perderam suas casas ainda estarem em hotéis, e não haver previsão de quando será possível recuperar os quase 700 km da bacia do rio Doce (além do litoral capixaba na altura de Regência) configura um dos maiores vexames de nossa história. A Vale e a BHP Billiton (que estão por trás da Samarco) ficarão marcados pela tragédia e pelo que fizeram depois. É simplesmente um escândalo.

“Me pergunto quantas crises ainda precisaremos atravessar até aprendermos a usar com maior cuidado a água que temos”, diz André Trigueiro

20% da Amazônia já foram destruídos. Como evitar mais uma tragédia?

Um estudo recente do economista da PUC-Rio e diretor do Instituto Internacional para a Sustentabilidade, Bernardo Strassburg, revela em números o bom negócio da preservação da Amazônia e do Cerrado. Segundo ele, um hectare de floresta amazônica realiza serviços ambientais (produção de água, regulação do clima, manutenção da fertilidade do solo, prevenção da erosão, polinização das culturas) que, se convertidos em valores, somariam R$ 3.500 por ano. No Cerrado, esse valor seria de R$ 2.300 por ano.

Nos dois casos, os valores superariam com sobras o retorno do investimento no mesmo hectare de floresta desmatado para pecuária (R$ 60 a R$ 100) ou soja (R$ 500 a R$ 1.000) por ano.

Devemos estimular projetos que conciliem a exploração de madeira, minério, proteína animal e soja com a preservação desse monumental ativo que é a floresta. Do jeito que as coisas vão, nossa cultura desenvolvimentista se assemelha a uma praga de gafanhotos. O economista Ladislau Dowbor, da PUC (SP), resumiu em uma frase essa sanha de crescimento insustentável: “Crescer por crescer é a filosofia da célula cancerosa”.

Falando em água, as pessoas só economizam mesmo quando há risco eminente de uma crise. Esse “empurrar com a barriga” é característica da nossa cultura?

O Brasil é imenso, ocupa um território continental e isso explica o chamado “mito da abundância”, quando nos percebemos em “berço esplendido” vivendo no país que detém 12% da água doce do planeta. Ocorre que 70% de toda essa água estão concentrados na Região Norte, onde vivem apenas 7% da população. Ou seja, a escassez de água doce no Brasil é real e mensurável, e com a mudança do ciclo da chuva esse cenário tem se agravado.

Tive a honra de entrevistar um dos maiores hidrologistas do mundo, o saudoso professor Aldo Rebouças, da USP. Ele me disse que os países não são reconhecidos pela quantidade de água que têm, mas pelo uso que fazem dela. Israel é um país pequeno, tem metade de seu território situado em uma região desértica, e virou referência em dessalinização da água do mar e tecnologias de irrigação.

Me pergunto quantas crises precisaremos atravessar até aprendermos a usar com cuidado a água que temos. Lavagem de calçada com mangueira e ducha grátis em posto de gasolina (com água potável) são considerados crimes em outros países.

Fale um pouco de Niterói, onde o reúso de águas cinzas é lei.

Niterói depende de um único rio para abastecer 500 mil habitantes. A mudança do ciclo da chuva e a depredação da bacia hidrográfica inspiraram a aprovação de uma lei que tornou obrigatória a instalação nas novas edificações de hidrômetros individuais, coleta de água de chuva e de águas cinzas (água ensaboada da pia, chuveiro, tanque e máquina).

As águas coletadas são tratadas e recirculam nos condomínios como “água de reúso”, usadas para vasos sanitários, rega de jardim, lavagem de pisos etc. Usa-se, portanto, menos água potável (cada vez mais cara) para fins não nobres. O bolso agradece e a demanda de água dos mananciais se reduz drasticamente.

A Amazônia é um monumental ativo que precisa urgentemente ser protegido

Qual o futuro do Brasil na área ambiental? O que esperar da política do governo Bolsonaro para o meio ambiente?

Entre os aliados do presidente eleito encontram-se as principais lideranças da bancada ruralista, que defendem – entre outras ideias – a flexibilização da legislação ambiental e dos mecanismos de fiscalização e licenciamento. Mas boa parte do mercado internacional já sinalizou que poderia suspender a importação de grãos e de proteína animal se esses produtos determinarem o avanço do desmatamento ou o desrespeito aos direitos das comunidades indígenas.

Entendo que a expansão da fronteira agropecuária poderia acontecer sem qualquer novo desmatamento. Considerando apenas a área de pasto degradado, o Brasil já soma aproximadamente 50 milhões de hectares, o que equivale a duas vezes o Estado de São Paulo. O desenvolvimento não precisa ser sinônimo de destruição. Dá para fazer diferente. Espero que o presidente eleito siga nesta direção.

Como desenvolver um modelo de educação para sustentabilidade?

Os Parâmetros Curriculares Nacionais do MEC já consideram o meio ambiente um assunto transversal que deve ser abordado pelos professores em sala de aula. Mas precisamos avançar mais.

A singularidade do Brasil perante o mundo (somos o país com maior estoque de água doce, solo fértil e biodiversidade) deveria inspirar uma abordagem estratégica sobre as vantagens do desenvolvimento sustentável. Defendo também a prática da coleta seletiva em todas as escolas, visitas guiadas a aterros sanitários, estações de tratamento de água e de esgoto, e conteúdos criativos sobre a urgência do consumo consciente.

A gravidade da crise ecológica precisa ser objeto de atenção nas escolas, do contrário formaremos novas gerações de analfabetos ambientais. O conhecimento pode nos livrar do risco do colapso.

Em São Paulo e no Rio temos exemplos de grande descaso ambiental: os rios Pinheiros e Tietê e a Baía da Guanabara. O que poderia solucionar?

Por incrível que pareça, tanto nos casos dos rios Tietê e Pinheiros, quanto na Baía de Guanabara, houve avanços na redução dos esgotos despejados. No caso do Tietê, há hoje 122 km de mancha de poluição (em 2010 essa mancha era de 243 km).

Em apenas um ano, a mancha foi reduzida em 8 km. Na Baía de Guanabara, as novas estações de tratamento de esgoto reduziram o despejo de matéria orgânica em uma escala que tornou possível mergulhar sem riscos, dependendo do dia, em algumas praias da Ilha de Paquetá. É evidente que a situação ainda é preocupante e há muito que fazer. É preciso cobrar resultados com veemência. Os avanços são lentos e tímidos. Mas estão acontecendo.

André Trigueiro, em reportagem

André Trigueiro é o principal jornalista ambiental do Brasil

Fale um pouco sobre o ecocídio no Brasil. E qual é o país que você admira, pelo trabalho de proteção ao meio ambiente?

Uma possível definição sobre ecocídio seria a obstinação de uma coletividade reproduzir hábitos, estilos de vida e padrões de consumo insustentáveis, mesmo sabendo que eles podem levar ao colapso da civilização.

A verdade é que não se muda cultura por decreto. Não depende apenas dos governos, mas das empresas, do terceiro setor, das lideranças sociais e religiosas etc. Ocorre que, pela primeira vez na história da humanidade, precisamos fazer as escolhas certas em um intervalo de tempo curto.

China e Alemanha impressionam pelo empenho em investir em fontes limpas e renováveis de energia. A Califórnia, nos Estados Unidos, tem varias ações que vão nessa direção do senso de urgência. Florianópolis, para dar um exemplo daqui, tornou-se a primeira cidade “lixo zero” do Brasil, ao aprovar uma lei que reduz o envio de resíduos para aterros sanitários, estimulando a reciclagem e a compostagem.

O que você faz em seu dia a dia para tornar sua vida mais sustentável e verde?

Procuro ser um consumidor consciente evitando excessos e desperdício. Discrimino plástico descartável em todas as suas resoluções, uso copo retornável de água, não uso canudo e rejeito embalagens de isopor. Sou lixo zero dentro de casa porque separo materiais para reciclagem, crio minhocas que transformam lixo orgânico em adubo e pago R$ 60 por mês para a organização Ciclo Orgânico levar o que as minhocas não dão conta de digerir (6 kg de matéria orgânica por semana).

Esse material é levado de bicicletas para compostagem e é devolvido para mim na forma de adubo no fim do mês. Tenho um carro mil cilindradas que não lavo (no máximo uma vez por ano e com água de poço) e só abasteço com etanol por ser menos impactante para o clima. Não consigo me deslocar de bicicleta no Rio por causa dos meus trajetos e do trânsito enlouquecido e ameaçador da cidade.

Você lançou em 2017 um livro sobre suicídio. O que o motivou a mergulhar nesse assunto?

Quando lancei o livro “Viver é a Melhor Opção” (Editora Correio Fraterno), com 100% dos direitos autorais para o CVV (Centro de Valorização da Vida), muita gente estranhou porque esperava mais um livro sobre sustentabilidade.

Para mim, não houve mudança de assunto. Entendo que o suicídio é o mais grave desastre ambiental que existe, que o meio ambiente começa no meio da gente, e que a defesa da vida se resolve no macro (prevenção do ecocídio) e no micro (prevenção do suicídio). Entendo que a vida é sagrada, um bem precioso e inestimável, e que vivemos um tempo em que a psicologia e a psiquiatria desenvolveram importantes recursos terapêuticos para nos ajudar em momentos de crise. Quem sofre a ponto de pensar em abandonar a existência precisa de ajuda.

O CVV disponibiliza por telefone, pela internet ou presencialmente o precioso recurso da escuta amorosa, com atenção e respeito. É um trabalho reconhecido pelo Ministério da Saúde como de utilidade pública, porque o desabafo pode, muitas vezes, evitar tragédias. São três milhões de atendimentos gratuitos por ano, pelo número 188. A organização precisa urgentemente de mais voluntários para dar conta dos chamados. Fico feliz por ajudar a divulgar esse belo serviço de apoio emocional e prevenção do suicídio.

Vozes da nova era: cinco mulheres sustentáveis e inspiradoras

Vozes da nova era: cinco mulheres sustentáveis e inspiradoras

Reunimos na Horta das Corujas, um espaço comunitário, lindo e muito verde na Zona Oeste paulista, cinco brasileiras: as executivass Rachel Maia, Karine Bueno e Macia Hirota, a nutricionista Alessandra Luglio e a empreendedora Chiara Gadaleta. Cada uma a seu modo contribui para tornar o Brasil e a sociedade mais sustentáveis e mais justos.

Rachel Maia

Fundadora de um projeto social que capacita jovens para o mercado de trabalho, a executiva Rachel Maia tem a educação como sua bandeira.

No dia em que foram feitas as fotos desta matéria na Horta das Corujas, Rachel Maia havia acabado de assumir o posto de CEO da Lacoste Brasil. Mesmo assim, ela conseguiu escapar para se juntar ao grupo, colocar os pés na terra e refletir sobre sustentabilidade e diversidade, temas caros para essa executiva que já foi CEO de diversas marcas de luxo, como a Tiffany & Co e a rede de joalherias Pandora. “Acredito que essa consciência ou vem de forma natural ou de forma induzida. E toda oportunidade que tenho para falar desses valores eu aproveito. Trazer executivos para esse universo é fantástico”.

Paulistana formada em ciências contábeis, pós-graduada na USP em finanças e com cursos de especialização em Vancouver e Harvard, Rachel compara a diversidade à inovação. “Uma empresa que acolhe pessoas de pensamento diverso é inovadora, criativa, transformadora. E isso em relação a tudo: etnia, gênero, idade, orientação sexual, condição física. A diversidade é enriquecedora pois traz novos olhares e pensamentos e isso é muito importante”.

Em suas palestras, ela costuma pedir para que as pessoas meçam a diversidade na sua vida de forma genuína. “Se você tem um círculo de amigos e eles são muito parecidos com você, a roda não é diversa. Se apenas 15% do quadro executivo das empresas globais são mulheres, a coisa está desbalanceada”, observa Rachel, com a experiência de quem teve que superar mil e uma barreiras para chegar onde está.

“Represento 0,4% do universo de presidentes que são mulheres negras”, ela ressalta. “Realmente precisamos trabalhar, e isso é no mundo todo, questões étnicas, sexistas e diferenças salariais que afetam mulheres e negros, para que haja justiça social. Isso se chama sustentabilidade”.

Fundadora do projeto Capacita-me, que leva educação e empregabilidade a pessoas na linha de vulnerabilidade social, Rachel diz que seu objetivo é mostrar aos jovens que o conhecimento é poder. “Eu mostro que a educação é mola propulsora para a virada e uso minha influência com outros executivos e presidentes para inseri-los no mercado de trabalho. Literalmente, meto a cara de pau e peço emprego para eles”. O Capacita-me formou cem pessoas em 2018 e Rachel pretende dobrar o número em 2019. “Estou aqui para inspirar”.

Karine Bueno

À frente do banco Santander, Karine Bueno mostra que a sustentabilidade não é apenas um negócio possível para empresas e instituições, ele é também muito rentável.

Superintendente Executiva de Desenvolvimento Sustentável do Banco Santander no Brasil, Karine acredita que o período em que as empresas faziam filantropia passou, agora todos precisam planejar projetos que minimizem impactos negativos de suas ações e ampliem a oportunidade de crescimento sustentável. É o que o Santander faz há mais de vinte anos.

Sustentabilidade é uma tradição no banco, que foi considerado, em 2012, “o banco mais verde do mundo” pelas consultorias independentes Interbrand e Deloitte. Segundo Karine, isso se deve à integração da sustentabilidade ao modelo de negócio da instituição. “Além de promover soluções financeiras que ajudam a proteger o meio ambiente, como o financiamento de projetos de energia renovável, o Santander minimiza o impacto ambiental em seus programas internos”, diz a executiva. O banco também é forte em relação à mobilidade: a Torre Santander, em São Paulo, oferece bicicletário com noventa vagas, vestiário com espaço para alongamento e armários, desenvolveu um programa de carona para os funcionários, que passam a ter vaga no estacionamento com preço subsidiado, e instituiu o horário flexível, para evitar entrada e saída nos horários de pico.

Karine também seleciona as iniciativas que podem receber apoio do banco e coordena a gestão interna e sustentável dos recursos, como a redução de consumo de água, luz e papel. Para ela, grandes empresas podem ser geradoras de grandes mudanças, com impactos positivos para toda a população. “O investimento em energia renovável, uma das frentes do nosso trabalho, mostra que este é um negócio possível e, inclusive, muito rentável”.

Alessandra Luglio

Para ela, somos todos parte de um ecossistema harmonioso, impactado fortemente pelos hábitos alimentares.

O caminho convencional da nutrição nunca agradou Alessandra. “Jovens querendo ganhar músculos e mulheres obcecadas em emagrecer. Por muito tempo, os nutricionistas focavam apenas em objetivos estéticos”, ela observa. Em 1996, recém-formada em Nutrição pela Universidade de São Paulo, ela queria saber de onde vinha a comida, por que o vegetarianismo não era estimulado e quais eram os impactos ambientais das escolhas alimentares. Contribuía para isso a sua história de vida.

Alessandra cresceu indo toda sexta-feira para o sítio da família, no interior de São Paulo. “Vivia perto dos animais, cuidando da horta, fazendo compostagem e separação do lixo. Minha mãe sempre foi uma ecologista intuitiva e eu absorvi esses valores”.

Vegana e inconformada com o sofrimento animal e o impacto da alimentação carnívora, ela começou a pesquisar a teia de equilíbrio entre o homem e a natureza. “A produção de energia animal (carne, leite e ovos) emite mais CO2 do que todos os meios de transportes juntos”. As causas envolvem a necessidade do imenso espaço para pastagem e para produzir soja e milho para a pecuária industrial, à base de uso massivo de agrotóxicos. “Isso está devastando todos os biomas. E tudo para produzir o que a gente não precisa comer. Porque a gente vive sem, não é uma necessidade”, lembra a nutricionista, que também é palestrante e tem um blog no Estadão.

Diretora do departamento de nutrição da Sociedade Vegetariana Brasileira, Alessandra aponta três razões para escolher o veganismo. A primeira é os animais. “Não é racional ficar cego à brutalidade com que eles são tratados na pecuária industrial”. A segunda diz respeito ao meio ambiente, uma vez que a escolha de fontes de origem animal é a que mais destrói a natureza. O terceiro ponto é a saúde. Vários estudos mostram que a redução de alimentos de origem animal pode evitar doenças como câncer e diabetes. “No Uruguai e no Rio Grande do Sul, onde as pessoas consomem muita carne, há as maiores incidências de câncer de intestino e de próstata”.

Chiara Gadaleta

Antecipadora de tendências, Chiara Gadaleta percebeu o descompasso entre a indústria da moda e o que o planeta precisa e criou um projeto inovador.

Primeiro era preciso provocar questionamentos e colocar luz no cenário da moda, da beleza e do design: setores que, no início do século 21, ainda se mostravam distantes de discussões ambientais e sociais. “De que moda precisamos? Qual o design que representa os nossos tempos? Com certeza, não aquele que destrói o meio ambiente e o bem-estar social”, diz Chiara. Depois, era preciso engajar pessoas com essa mesma preocupação: transformar a moda em um setor sustentável, consciente e socialmente responsável. Foi o que Chiara Gadaleta, ex-modelo, diretora criativa e hoje empreendedora, fez com o seu projeto ECOERA, fundado em 2007.

Desde que começou o ECOERA, Chiara faz muito trabalho de campo em vilarejos remotos, inclusive na Amazônia, com o objetivo de capacitar as comunidades, colocar luz nos projetos sociais e colaborar para um mercado mais competitivo, valorizando a cultura local e os biomas brasileiros.

Em 2011, lançou a primeira semana de moda sustentável no Brasil com desfiles e oficinas de moda, alavancando marcas que fomentam esse mercado. Em 2015 veio o Prêmio ECOERA, que discute metas para o futuro e destaca empresas que promovem a diversidade, a sustentabilidade e a inovação. “O debate sobre sustentabilidade é integrativo, as pessoas estão abertas para entender as alternativas e a moda é a ferramenta dessa comunicação.

Práticas como economia circular, reaproveitamento e upcycling se mostram cada vez mais viáveis”, diz Chiara, que hoje apresenta um reality show sobre consumo consciente no Discovery e no dia a dia está à frente de uma equipe de especialistas que colaboram com as empresas dispostas a uma jornada cada vez mais sustentável.

Marcia Hirota

Nascida em Mogi das Cruzes (SP), área com quase sete mil hectares de floresta, Marcia Hirota luta pela recuperação da Mata Atlântica, que abrange 15% do território brasileiro.

Diretora executiva da Fundação SOS Mata Atlântica, Marcia Hirota chama a atwenção para a preservação ambiental como algo que afeta a rotina nas cidades e diz respeito a todos nós. A missão de seu trabalho é inspirar a relação das pessoas com o meio ambiente no cotidiano, para que possamos entender que a água e o ar limpo, e até mesmo o bem-estar físico e psicológico, têm a ver com reflorestamento.

“São os serviços ambientais, que temos acesso apenas com o cuidado e a recuperação da natureza; são nossos parques e rios; é a floresta que está presente nas nossas vidas e garante água e ar de boa qualidade”, diz Marcia. Afinal, florestas preservadas contribuem para a purificação do ar, a regulação do clima, a proteção do solo – ajudam a evitar deslizamentos de terra – e protegem rios e nascentes, favorecendo o abastecimento de água nas cidades.

A SOS Mata Atlântica busca o engajamento da população para pressionar políticas públicas ambientais, além de produzir conteúdo importante para alertar e gerar mudanças sobre realidades alarmantes.

Uma das florestas mais ricas em diversidade de espécies e ameaçadas do planeta, a Mata Atlântica conta hoje com apenas 12,4% da mata original no Brasil. Mas desde 1986, quando foi fundada, a instituição mostra que é possível fazer diferente. “Com a ajuda de nossos parceiros e patrocinadores plantamos mais de 40 milhões de árvores nativas, restaurando uma área de 23 mil hectares, equivalente ao tamanho da cidade de Recife”, diz Marcia, referindo-se ao último relatório de atividades da ONG.