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Maria Ribeiro se reinventa a cada dia, encontrando novos caminhos para expandir sua obra

Maria Ribeiro se reinventa a cada dia, encontrando novos caminhos para expandir sua obra

Maria Ribeiro gosta de falar – e deixa isso claro logo no início da conversa com o repórter. Diz até que tem que se controlar porque fala alto. Nem é bem assim, mas uma coisa é certa: parece já ter refletido sobre qualquer assunto que apareça. Seja sobre a insana política brasileira ou os doces dramas do cotidiano, a atriz sempre tem algo a comentar. Ela está de olho em tudo.

Não foi à toa que, depois de quase duas décadas como profissional das artes cênicas, nos últimos anos Maria se descolou um pouco dos textos alheios e abriu caminhos para suas próprias palavras. Como quem não quer nada, em dois tempos tornou-se comentarista do programa “Saia Justa”, na TV a cabo, cronista na grande imprensa, escritora, diretora e autora de peças teatrais e de documentários. Mas mantém-se, sobretudo, atriz.

Maria Ribeiro

Única artista da da família, Maria Ribeiro apresenta seu olhar de repórter a todo momento. Fotos: Jorge Bispo

“Eu AMO trabalhar”, diz ela, cariocamente enfática. “Acordo às seis já cheia de ideias, chamo amigos para os projetos. Não paro quieta nem um minuto. Amo”.

A julgar pela sua agenda próxima, eis aí o tipo de amor (ou paixão) fértil. Entre o finzinho de 2019 e 2020, Maria Ribeiro enfileira muitas estreias: tem o documentário “Outubro”; “Isso Não é Aqui”, longa de Felipe Nepomuceno com o ator Alexandre Nero; a segunda temporada de “Desalma” e a série “Todas as Mulheres do Mundo”, ambas no GloboPlay. Tem também o monólogo “Pós F”, baseado na obra da escritora, roteirista e atriz Fernanda Young, grande amiga que morreu em agosto deste ano. Nessa correria, promete revirar a gaveta dos afetos e trabalhar no documentário “Leonídio”, sobre o próprio pai, morto em 2013.

Com produtividade em alta, falta um romance para o currículo de Maria. Ou talvez não, porque assunto ela tem de sobra – e já tem até editora, o que costuma ser o mais difícil. Difícil mesmo, no caso, é ela se quietar para escrever.

“Sou superindisciplinada”, diz ela. “E preciso ver se tenho realmente algo a dizer”. Certamente não há razão para esse receio, como se vê pelas crônicas semanais que publica no jornal O Globo desde 2016. Quem a acompanha já percebeu que a – escritora tem pelo menos uma característica essencial para quem vive da palavra: a curiosidade.

“Sou daquelas que perguntam mesmo. Não tenho medo de perguntar”, explica. “Tenho muito interesse nos outros, tenho alma de repórter, quero saber da vida das pessoas. E, como pergunto sem maldade, até coisas íntimas vêm à tona”.

Elenco de “Todas as Mulheres do Mundo”

Essa alma de repórter não sossega. Tomando seu café pingado em um bistrô carioca, com um olho atento ao redor, outro olho no interlocutor, nada do que é humano lhe escapa; parece mesmo que está fazendo anotações mentais. E está, porque tudo pode virar material de trabalho.

É assim que Maria exercita o pensa mento ágil e abre o verbo, sem medo (nem – intenção) de chocar. Quer apenas se expressar, como todos. E, vá lá, se chocar, é só um pouquinho, o bastante para chacoalhar as ideias que pairam sobre a mesa. Faz bem; reforça sua presença. Mas nem sempre foi tão fácil. A depender da família, de um estilo tão tradicional como há tempos já não se vê por aqui, o papel de Maria no planeta seria mais discreto.

“Tive uma infância bem burguesa, nada artística, até porque não havia artistas na família. Como sempre fui boa de falar, meu pai dizia que seria capaz de convencer todo mundo se eu fosse advogada”.

Aos 14, a menina entrou na companhia “Atores de Laura” e caiu naquela vida acelerada de ensaios intermináveis. Encontrou sua turma. Pela família, tudo bem, contanto que essa coisa de teatro não virasse profissão. Como se sabe, a família perdeu essa batalha, mas a caçula da Marina e do Leonídio teve que comprar muito barulho para seguir nos palcos. Teve até que encarar uma faculdade e tirar um diploma – e foi por isso que se formou em jornalismo pela PUC do Rio, embora tenha tido a sensatez de não exercer o ofício.

Maria Ribeiro e o ator Alexandre Nero no longa “Isso Não é Aqui”

Quando a família viu, Maria do Amaral Ribeiro já estava lá metida com teatro – principalmente depois de conhecer Domingos Oliveira (1936-2019), cineasta genial que retratou como poucos as pequenezas e as grandiosidades dos relacionamentos contemporâneos:

“O Domingos foi arrebatador, mostrando o tipo de dramaturgia que eu queria”.

Não é por acaso que outro projeto da atriz para 2020 é publicar parte dos 25 anos da sua troca de correspondências com Domingos. Já tem até parceiro para organizar a relíquia. No dia a dia, nos palcos ou nas telas, a influência do amigo sobre a obra de Maria Ribeiro é notável. Pode-se dizer, sem medo, que ela herdou do cineasta esse dom, ou tom, de espalhar afetos.

As colunas no jornal tratam disso. Bem, tratam de qualquer coisa, mas relacionamentos são um tema-chave, assim como a política. Ela chega ao ponto de misturar esses dois assuntos numa sacada que Domingos certamente assinaria:

“Nossa democracia é assim como o casamento: você percebe que já acabou, mas ainda fica torcendo para dar uma virada”.

Frases assim – tão domingueiras – chamam a atenção de leitores de todas as faixas etárias ou socioeconômicas. Tanto que o pequeno “Crônicas para Ler em Qualquer Lugar” (Editora Todavia, 2019), que reproduz textos seus e dos amigos-irmãos Gregório Duvivier e Xico Sá, tem recebido elogios entusiasmados Brasil afora.

Ao lado de Gregório Duvivier e Xico Sá, em viagem pelo sertão do Brasil

Maria conta que, na esteira de lançamento do livro, os três percorreram cidades incríveis de um país que a gente ignora.

“Pirei com o sertão”, confessa. “É deslumbrante. Brasileiro não conhece o sertão. Vai para o Marrocos, mas não vai pro sertão. Não pode”.

Nas estradas, ao lado dos outros dois coautores, ela esteve com milhares de pessoas e, melhor de tudo, ouviu muitas histórias. Amou:

“Sou do tipo que se emociona com as coisas, as situações, e sempre vejo o que tem de arte atrás daquilo. É meio uma deformação profissional. Então tento ir fundo e tornar aquele momento uma dramaturgia”.

Pelo jeito, ela sempre consegue.

Outubro inesquecível

Aos 44 anos de idade, Maria Ribeiro está animadíssima com a série “Todas as Mulheres do Mundo”. Serão cinco episódios baseados em histórias do amigo Domingos Oliveira e escritas por Jorge Furtado. Idealizadora da série, ela acredita que é preciso falar de amor. “Neste momento da primavera feminista, todo mundo está à flor da pele, então é importante falar disso”.

Diferente da maioria dos seus pares, ela não gosta de se esconder quando o assunto é política. Pelo contrário. Sempre foi presença certa em palanques e eventos da esquerda. Prova disso está no documentário “Outubro”, que dirigiu com Loiro Cunha e será exibido no Festival de Cinema do Rio, em dezembro.

Maria Ribeiro em cena de seu documentário, “Outubro”

De tênis e vestida de noiva (mas sem véu nem buquê), ela acompanhou, nas ruas de São Paulo, a semana que antecedeu o segundo turno das eleições de 2018. “Agora entendemos que Bolsonaro foi eleito e que ele é mais parecido com o Brasil do que a gente gostaria. Ele representa uma indelicadeza institucionalizada, que acha OK ser grosseiro, desumano, racista, desigual. Mas essa coisa “eles e eu” não adianta. É o nosso país”.

Para Maria, agora é hora de gestar “Leonídio”. Tendo o pai como personagem central da história, o filme será montado a partir de cenas gravadas há quinze anos, numa casa de praia da família. As imagens ficaram intocadas durante todo esse tempo e devem render boa poesia. A casa foi vendida, outras viriam; o pai partiu, os filhos crescem. São dois: João, de 16 anos, fruto do casamento com o ator Paulo Betti, e Bento, de 9, filho dela e do também ator Caio Blat.

De origem humilde na Penha ao sucesso na TV, Paolla Oliveira é amorosa, mandona e feliz

De origem humilde na Penha ao sucesso na TV, Paolla Oliveira é amorosa, mandona e feliz

No ar como a influenciadora digital Vivi da novela “A Dona do Pedaço”, a atriz faz um mergulho profundo em suas origens na zona leste de São Paulo. Fotos: Leo Faria

Paolla Oliveira é, digamos assim, a pessoa jurídica da consagrada atriz que prestou serviço para o SBT e a Record antes de pavimentar de vez seu talento na Globo. Em quinze anos de carreira, participou de vinte novelas e doze filmes. Não são poucos os que a admiram, muito além de sua beleza, pelo talento e pela versatilidade no ofício de interpretar personagens tão distintas como a mocinha de época, a policial militar com sangue nos olhos e a garota de programa. Longe das telas, porém, é Caroline Paola Oliveira da Silva, 37 anos, o nome escolhido pelos pais, quem entra em cena.

Filha de Daniele Oliveira e do ex-policial militar José Everaldo Oliveira, que verteram suor para ganhar a vida na Penha, bairro da zona leste paulistana, Paolla experimentou, bem antes das benesses do show business, uma educação rígida, imposta pelo pai, extremamente austero. “A criação dos filhos foi muito dura, mas não sem amor”, recorda-se a atriz, que têm três irmãos e mora no Rio de Janeiro com uma tia, cachorros e gatos.

Nesta entrevista, ela fala de suas origens, de como Caroline se transformou em Paolla, e de sua atual personagem na novela “A Dona do Pedaço”, a influenciadora Vivi Guedes.

Como foi crescer na zona leste paulistana?

Tenho muito carinho por aquela época. Eu morava na Penha, acordava muito cedo para pegar ônibus e estudar no Ascendino Reis. Eu ia babando de sono e geralmente alguém me acordava para eu não perder o ponto para descer. Depois da condução, eu subia a rua Tuiuti inteirinha a pé, como um zumbi de tanto sono, para chegar ao colégio. Eu gosto do Rio do Janeiro, onde moro, mas a minha vida, a essência, é São Paulo, na zona leste da cidade.

Sua família ainda mora na Penha?

Sim. Lá estão meus amigos de colégio, foi onde aprendi muita coisa, onde vivi. Lembro de vizinhos ficarem bravos porque a gente jogava bola. Tenho três irmãos e jogava com eles. Eu era a goleira. Gosto muito de esporte, faz parte da minha personalidade, talvez por ter tido uma infância na rua, por frequentar clubes, sítios. Até carrinho de rolimã eu curti, que loucura! Eu era um moleque praticamente.

Começou a trabalhar cedo?

Depois de terminar o ensino médio, fui fazer faculdade de fisioterapia e também comecei a trabalhar com teatro. Mas desde os 14, 15 anos, eu voltava da escola, estudava um pouco em casa e ia ajudar na confecção dos meus pais. Eu era ótima em dobrar, embalar e arrematar roupa. Curioso que em entrevistas a gente costumeiramente fala do presente, do que almeja para o futuro, mas pouca gente sabe onde os nossos pés foram e estão fincados. Por que eu sou tão dedicada hoje e me saio bem no trabalho? Porque eu aprendi a dar valor a isso cedo.

Como era a relação com os seus pais?

A gente tem de ser uma versão melhorada dos nossos pais. Falo isso porque lá em casa não tinha muita conversa. Era muito claro quem mandava, quem obedecia, tudo muito militar. Com o meu pai não havia papo sobre namoro, sensibilidade não entrava em pauta. Não se questionava quais eram as nossas dúvidas. A criação dos quatro filhos foi muito dura, mas não sem amor. Mas eu quero ser uma pessoa melhor em comparação aos meus pais. Quero que as pessoas em volta possam resolver coisas com o diálogo. Isso tudo eu não vivi dentro de casa, onde a arte não tinha espaço. Ouvíamos pouca música, o meu pai não entendia os filmes. Até hoje ele só vai ao cinema para ver os filmes nos quais eu atuo. Nunca houve alguém na nossa família inteira que trabalhou com arte.

Paolla Oliveira na novela “A Dona do Pedaço”, estrelando Vivi Guedes

Tento imaginar a situação dos seus namorados quando apresentados ao seu pai…

Ele falava algo marcante: “Essa aqui é minha filha. Bonita, né? Vai namorar somente quando estiver com 30 anos”. Enfim, eu convivi com privilégios para os meus irmãos. Eu amo dirigir, só que o meu irmão mais novo teve a chance de guiar um carro antes de mim. Quando eu tirei a carta de motorista, meu pai falou: “É, você dirige bem, mas nunca irá guiar como o seu irmão.” Talvez, hoje, eu deva me sair muito melhor do que o meu irmão em um rally, por exemplo. A força feminina e a luta contra o machismo passam pela educação, por um pai educando uma menina, uma mulher educando um homem. Eu tento passar para os meus pais ensinamentos que nos tornam melhores. Esse é o caminhar equilibrado da vida.

Como conseguiu convencer o seu pai a aceitar a sua opção pela carreira artística?

Fiz um booking com fotos minhas e ele perguntou o que era aquilo. Aí tive ajuda da minha mãe, que foi muito guerreira e enfrentou devagarzinho, com calma, a situação naquele ambiente militar. Fui fazendo um trabalho aqui, outro ali, e quando meu pai percebeu já sentia orgulho da minha opção. Hoje é fã, o primeiro a elogiar, fica feliz com as minhas conquistas. E eu fico feliz de ter trazido, com persistência, o velho José Everaldo para o mundo das artes.

Conviver com um policial militar em casa deve ter facilitado a sua vida quando fez a policial Jeisa em “A Força do Querer”, em 2017.

O meu pai não entendia a minha profissão e a questionava duramente até entendê-la. Passa o tempo e ele vê a filha interpretando uma policial na novela das 21h da Globo. A Jeisa foi uma homenagem a ele. Brinquei, dizendo que me tornei major em bem menos tempo do que ele levou para ser coronel (risos).

Na pele da policial Jeisa, em “A Força do Querer”

Qual o grande ônus de uma vida sob os holofotes?

Tive uma criação focada para que eu não errasse, com um pai severo e sem muita conversa. Volto nisso porque diz sobre o lugar no qual me encontro. Quando a gente está exposto, o limite para errar é pouco. Quando estreei em uma novela, lembro de muita gente reparando em mim ao desembarcar em um aeroporto. Comecei a olhar para a minha roupa e ver se havia algo errado. Eu não me dei conta de que eu fazia parte de uma novela e as pessoas estavam apenas me reconhecendo. A minha primeira reação sempre foi procurar o que eu havia feito de errado. Quando eu equalizei tudo isso, ou seja, que a exposição traz bônus e ônus, eu me apeguei ao bônus, ao carinho e ao elogio, à credibilidade que o meu trabalho passa às pessoas. E o restante foi ficando cada vez mais longe. Mas isso demorou e hoje a gente tem uma nova questão.

Qual?

O mundo passa por um julgamento muito maior. A internet parece ser feita para julgar. Antes, eu sentia muito medo daquela pressão. Atualmente, é muito fácil ser julgada, há mais poder na mão das pessoas e parece que todas as coisas estão aí para serem julgadas. Até hoje fico procurando um equilíbrio.

Você citou a internet e eu lembrei que, durante a pesquisa, a primeira notícia que apareceu quando digitei seu nome era “Paolla Oliveira quebra a internet ao dançar música de Beyoncé”.

Olha, relutei muito contra as mídias sociais, não as entendia, achava que eram mais uma maneira de me expor. Eu já tenho exposição suficiente e gosto de ser reservada em alguns aspectos da minha vida. Mas ou a gente faz as coisas do nosso jeito ou assiste os outros fazerem. Optei por encontrar uma maneira de não me expor além da conta e ficar feliz de compartilhar algo para quem acompanha o meu trabalho. Então, a minha rede social diz muito sobre mim: é real, espontânea, tem humor.

Mas você já foi vítima de rede social. Fotos nas quais aparecia seminua em uma gravação foram compartilhadas por um integrante da equipe técnica que prestava serviço para a série “Assédio”.

Então, esse não é o outro lado da rede social, mas o outro lado do ser humano. Foi uma pessoa que teve a coragem de compartilhar o que não é correto. Eu estava trabalhando em uma situação delicada, um nu, que encaro sem pudor ou problema. O meu corpo está para o meu trabalho e continuo agindo assim. Mas agora tenho mais cuidado com quem está envolvido na produção, para que todos falem a mesma língua e sejam responsáveis.

Curioso que na atual novela das 21h você dá vida a uma influenciadora digital.

Eu agradeço a carreira que tenho. Ela me deu a possibilidade de fazer mocinha de época, policial militar e agora uma mulher moderna que teve uma infância humilde, foi abandonada aos cinco anos e hoje é segura, descolada, influenciadora digital da moda.

Na minissérie “Felizes para Sempre”, em que intepretou Danny Bond

Recentemente você afirmou se dar conta de que podia se achar bonita. Você não era feliz com a aparência?

Como adolescente que tem mania de dar muita atenção à opinião dos outros, é difícil conquistar maturidade sem o passar dos anos e os erros. Já quis ser mais magra, alta, ter o cabelo diferente, mas não quero mais. Essa convicção vem do fato de eu dar mais valor ao que eu penso e acho bonito em mim. Eu tenho a sorte de as pessoas pensarem coisas ótimas sobre mim (risos). Todo mundo dizia que eu era linda, mas eu queria ser diferente, parecer com alguém que estava distante da minha condição. Afastei as idealizações. Isso me trouxe calma, serenidade e segurança. O meu trabalho passa pelo meu corpo.

Você já fez análise?

Sim, quando vim para o Rio de Janeiro. Muita coisa havia mudado. Saí da casa dos meus pais, em São Paulo, cheguei sozinha aqui e não dava conta de fazer tudo. Eu faço análise ainda, não com a frequência que deveria. É uma boa maneira de me conhecer melhor. A minha última investida foi na corrente lacaniana, que é um pouco mais durinha em relação à freudiana que eu havia optado de início. Eu gosto porque coloca as coisas no lugar sem culpar ninguém. O inferno pode não ser os outros.

Li que você procura energizar a sua casa com vela de sete dias, imagens de Buda e Oxum e um cristal de Abadiânia, de Goiás, que trouxe da casa do João de Deus. Você ainda exibe o cristal aí?

Eu estive sim na casa do João de Deus, acompanhando alguns amigos, e fui muito bem recebida. O que tenho para dizer é que assédio tem de ser discutido e mudado culturalmente. João de Deus e Roger Abdelmassih são casos de polícia e têm de ser investigados sem nenhum tipo de perdão ou alívio. Eu tenho ainda o cristal dele aqui, no mesmo lugar, porque a imagem de quando estive em Abadiânia está preservada.

Fora do trabalho, você procura agito ou tranquilidade?

Eu sou inquieta. Se tem uma obra em casa, gosto de estar presente. Toco a rotina do sítio à distância, cuido da vida de todo mundo em São Paulo: pai, mãe, irmãos. Sou insuportavelmente amorosa. Como trabalho muito e praticamente vivo em função da carreira, estar em contato com todos é uma maneira de demonstrar o meu carinho. Eu delego, mas tenho prazer de liderar. E aprendi a me apropriar melhor do meu tempo livre me dedicando a leituras, teatro, cinema, meditação e yoga.

Conte uma mania que pouca gente saiba.

Tenho muitas. A maior é sair dirigindo por aí. Sempre que termino um trabalho, procuro viajar para um local em meio à natureza, que coloca a gente no nosso tamanho real. O meu trabalho, que faz com que o tempo inteiro eu esteja exposta, tira a gente da realidade. Muitas vezes é dado ao que a gente faz um tamanho muito maior do que ele é. E a natureza tem esse poder de nos reconectar ao tamanho real das coisas.

Confira o Ping Pong 29 com a atriz:

Selton Mello concilia direção e o papel principal na quarta temporada de “Sessão de Terapia”

Selton Mello concilia direção e o papel principal na quarta temporada de “Sessão de Terapia”

Atriz fará parte da série "Sessão de Terapia"

Selton Mello e Morena Baccarin

Há cinco anos, em uma entrevista de capa para a 29HORAS, Selton Mello falou do prazer em dirigir “Sessão de Terapia”, naquela fase em sua terceira temporada. Meia década se passou e agora ele assume dois papéis, o de diretor e ator. Selton interpreta Caio, terapeuta supervisionado por Sofia, vivida pela atriz Morena Baccarin. Aqui ele comenta sobre a alegria de trabalhar com Morena, da missão que a série tem com o público, levando empatia, e de seu retorno às novelas em 2020, como Dom Pedro II.

Por que aconteceu um intervalo tão grande entre a terceira e a quarta temporada de “Sessão de Terapia”?

O intervalo foi o desejo de fazer coisas novas, como “Ligações Perigosas” e “Treze Dias Longe do Sol”, na Globo, e meu terceiro longa-metragem, “O Filme da minha Vida”. Voltamos porque deu saudade, e sabemos que a série cumpre um papel fundamental com o público.

É uma série que faz bem fazer e faz bem pra quem assiste. O Zécarlos Machado (ator que interpretava o terapeuta Theo) estava impedido por contrato, então eu e Roberto d’Ávila, da produtora Moonshot Pictures, decidimos que seria legal eu fazer o terapeuta e aproveitar para dar uma repaginada na configuração. O texto segue com a excelência criativa de nossa roteirista Jaqueline Vargas.

Quais são as principais mudanças?

Poucas mudanças, na verdade. Segue sendo um seriado para fazer pensar, para promover insights e comover pela humanidade que emana da tela. A diferença é a presença de um terapeuta mais jovem, mais sanguíneo, e de sua nova supervisora, Sofia, vivida por Morena Baccarin, em sua primeira atuação em português, uma honra para nós todos.

Por que pensou em convidar a atriz Morena Baccarin para a série?

Porque é uma amiga querida, já tentamos trabalhar juntos antes e não deu certo, e agora tudo se encaixou lindamente. Morena nas telas brasileiras é uma alegria sem fim, uma realização pessoal para ela. Os espectadores vão se encantar em ver a atriz fantástica de “Homeland”, “Deadpool” e de tantos sucessos internacionais finalmente em seu país de origem, fazendo algo potente e bem brasileiro. Como você define o seu personagem, o Caio? Caio Barone é um terapeuta excelente, vivendo conflitos pessoais gigantes. Isso o torna mais fascinante ainda.

Você já havia comentado que faz terapia há anos. Suas sessões inspiram de alguma forma a série?

De alguma forma sim, a dinâmica principalmente. Mas não trago para o trabalho o que vivi. Trago minha observação do trabalho do meu terapeuta e a evolução que conseguimos diariamente. Trato essa série como uma missão. Uma ode ao trabalho da psicanálise e um olhar generoso sobre algo que anda muito em falta no mundo: a empatia.

Você tem 46 anos, uma carreira maravilhosa e trabalhos importantes no cinema e na tevê. O que virá nos próximos meses?

O que tenho de fato marcado é meu retorno às novelas, após um hiato de vinte anos. Estreia no ano que vem a novela das 18h, “Nos Tempos do Imperador”, na qual darei vida ao mítico Dom Pedro II. Estou superanimado com esse retorno. Agora é cuidar do lançamento de “Sessão de Terapia”, fazer com que muita gente assista no Globoplay a partir de 30 de agosto.

O que te move?

O prazer em levar a arte como uma forma de reflexão, expandir corações e mentes.

A atriz franco-americana Alli Willow fala sobre “Bacurau”, filme vencedor do Prêmio do Júri em Cannes

A atriz franco-americana Alli Willow fala sobre “Bacurau”, filme vencedor do Prêmio do Júri em Cannes

A atriz Alli Willow

Alli assume o papel de Kate em “Bacurau”. Foto: Juliana Colinas

“Bacurau” é uma distopia. A história retrata um pequeno povoado do sertão brasileiro que sofre com a morte de Dona Carmelita, uma mulher querida na cidade. Dias depois, a comunidade não está mais nos mapas e uma série de assassinatos apavora os moradores.

A produção é de Kleber Mendonça Filho, que divide a direção com Juliano Dornelles, seu diretor de arte em “Aquarius”. No elenco do longa, que estreou nos cinemas no dia 29 de agosto, estão nomes como as brasileiras Sonia Braga e Karine Teles e o alemão Udo Kier.

O filme é uma coprodução Brasil-França, gravada no Sertão do Seridó, divisa do Rio Grande do Norte com a Paraíba. Nesse cenário improvável, a atriz franco-americana Alli Willow despertou ainda mais a sua curiosidade com o cinema brasileiro e estreia no papel de Kate. “A minha personagem faz parte do núcleo americano que traz a problemática da história. Eu filmei algumas cenas violentas e fiz uma transformação física para envelhecer e ter marcas de sol. É um papel marcante e aprendi muito”, conta.

Para Alli, “Bacurau” leva a pensar, a indagar sobre o poder político do cinema. “Não é apenas entretenimento. Assim como a literatura, a filosofia, o teatro e a poesia, o cinema é um caminho para o questionamento”. Aclamado, “Bacurau” provocou impacto em Cannes, levou o Prêmio do Júri e, pela primeira vez, o país conseguiu duas premiações no festival. “Além de mostrar um Brasil profundamente brasileiro, o filme aponta para uma realidade muito parecida com a nossa atual”.

Atriz Ana Beatriz Nogueira estrela peça “Um Dia a Menos”, no teatro Petra Gold

Ana Beatriz estreia na peça em setembro

Na peça, com texto de Clarice Lispector, a atriz Ana Beatriz Nogueira luta contra a solidão e a rotina. Foto: André Arruda

Para alguns, o tempo voa. Para outros, um dia equivale a uma eternidade. Na peça “Um Dia a Menos”, uma adaptação do conto homônimo de Clarice Lispector, escrito um ano antes de sua morte, o espectador tem a oportunidade de acompanhar um fragmento do cotidiano de Margarida, uma mulher que tem diante de si a árdua tarefa de atravessar um dia inteiro sozinha, dentro de casa.

Nossa anti-heroína acorda, cozinha, come, cuida da casa, lê, fica de bobeira sem fazer nada e sonha. O tempo todo, reflete sobre a vida. É uma surra de melancolia e solidão, mas que traz também uma mensagem de que a vida, ao final das contas, vale a pena. Ou pelo menos faz com que a gente se questione: vale a pena?

Em cartaz até 13 de outubro no Teatro Petra Gold, o espetáculo é um solo da atriz Ana Beatriz Nogueira, conhecida por dezenas de trabalhos no cinema (como o longa “Vera”, de Sérgio Toledo, que lhe rendeu o Urso de Prata de melhor atriz no Festival de Berlim, em 1986) e 17 obras na TV, além de 14 peças de teatro.

A transposição para a cena da história de Margarida tem momentos engraçados e outros patéticos, como a vida de qualquer pessoa. “O que mais me encantou neste texto da Clarice foi justamente essa humanidade da minha personagem. Toda mulher reconhece um pouco de si na Margarida. Somos todas Margaridas!”, comenta Ana Beatriz.

No palco, a expressão dessa humanidade prescinde do apoio de muitos elementos cênicos. Isso explica a ausência de cenários exuberantes, de troca de figurinos e de um elenco numeroso. A ação foca no texto contundente e emocionante de Clarice e no trabalho da talentosa Ana Beatriz. A economia de recursos é um caminho para chegar ao essencial do teatro: o ator e a ideia contida no texto, transmitida de forma clara, terna e envolvente.

“Esta montagem de ‘Um Dia a Menos’ é incrivelmente complexa na sua simplicidade, é uma reafirmação da crença no poder de comunicação do teatro que, se resiste há cinco mil anos e sobrevive a todas as crises, é porque pode abrir mão de tudo, menos do humano. Do elemento, do questionamento e do pensamento humanos. Ainda temos muito o que entender sobre nós mesmos”, analisa Leonardo Netto, que assina a direção da peça.