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Rádio Vozes: Almério é a dica para este verão

Rádio Vozes: Almério é a dica para este verão

Estamos em pleno verão aqui na América do Sul. Muitos estão aproveitando as férias, o descanso e o ócio tão desejados. Separando material para essa temporada na Rádio Vozes, achei um poema de Antônio Cicero, filósofo e letrista de grandes canções, que fez parcerias com Adriana Calcanhotto, Marina Lima (sua irmã) e a mais recente com Arthur Nogueira, cantor e compositor paraense que dedicou um disco inteiro à obra do poeta. O poema se chama “Presente”, foi dedicado a Eucanaã Ferraz e publicado no livro “Porventura”, de 2012.

“Por que não me deitar sobre este
gramado, se o consente o tempo,
e há um cheiro de flores e verde
e um céu azul por firmamento
e a brisa displicentemente
acaricia-me os cabelos?
E por que não, por um momento,
nem me lembrar que há sofrimento
de um lado e de outro e atrás e à frente
e, ouvindo os pássaros ao vento
sem mais nem menos, de repente,
antes que a idade breve leve
cabelos, sonhos, devaneios,
dar a mim mesmo este presente?”

Álbum “Desempena”, do cantor pernambucano Almério. Foto: Divulgação

Dá vontade de deitar-se na grama, na areia quente da praia, na varanda, em uma rede, no quarto no meio do caos da cidade, ouvir boa música e ter pensamentos bons.

Sim, porque estamos vivendo dias difíceis. O horror nos assombra cotidianamente. Mas, aqui e em todo e qualquer lugar onde eu tenha voz, eu digo e repito: a arte, a poesia, a delicadeza, essas coisas todas é que nos salvam e dão força para enfrentarmos a sombra. Seja de que tamanho for.

Meu encantamento agora é pela nova música que vem de Pernambuco. Jovens cantores e compositores que trazem a lírica do cordel, dos versos livres e daquela verve sedutora e peculiar com delicioso sotaque.

Almério talvez seja o mais conhecido deles. Tem se apresentado ao lado de artistas como Zélia Duncan e Ceumar. A banda é maravilhosa, a presença de palco é um assombro. Não por acaso acho que lembram os artistas libertários e transformadores dos anos 1970. Isabela Moraes, uma poeta poderosa. Jovem e intensa, tem a tradição do forró no seu som, mas no canto, a braveza da sertaneja, o lirismo dos desafios poéticos em rimas ricas, estrofes e mais estrofes. O princípio é o verbo. Está lançando agora seu primeiro disco, mas já tem músicas gravadas por Mariana Aydar.

E Martins, autor de uma das músicas mais lindas cantadas por Almério, “Queria Ter Pra te Dar”, que lançou no final do ano (2019) seu primeiro solo. Dono de um timbre muito peculiar, de um violão bonito, ele também traz em suas letras essa proposta de Antônio Cícero. Cabelos, sonhos, devaneios…

Anote esses nomes e escute assim que possível. Na Rádio Vozes, estão todos no ar. Cícero, inclusive, porque gravei para esse verão várias vinhetas poéticas para embelezar ainda mais o seu dia. Aproveite.

Trilha sonora certa para todos os Carnavais, Ivete Sangalo completa 27 anos de carreira

Trilha sonora certa para todos os Carnavais, Ivete Sangalo completa 27 anos de carreira

O sol parece sempre brilhar para Ivete Sangalo. Na verdade, ela é a chama e o próprio astro rei da maior festa popular do país, o Carnaval. Mas sua fama e seu conhecido agito ultrapassam fevereiro e março, faz gente de toda cor, todo lugar e toda idade pular em qualquer época do ano. “É a melhor cantora do país”, gritam paulistanos mesmo debaixo da tradicional garoa da cidade, em um show ainda a dois meses dos blocos, desfiles, folias e alegorias, no Festival Eletriza, no Anhembi. A energia e a potência incidem do palco em duas horas de apresentação. Quase três décadas de carreira tornam Veveta referência e ídolo, e anunciam que, se depender dela, ainda muita festa virá pela frente.

Ivete Sangalo

Ivete comemorando os 10 anos de sua carreira solo

Se é a melhor cantora do país, Ivete não gosta de comparações e prefere não responder. É a mais popular. O que importa é incluir todo mundo na sua música: “Se relacionar bem é ter empatia. Eu quero ser respeitada e ouvida por todos, então me esforço para perceber as outras pessoas também”.

São diversas parcerias desde o início de sua carreira solo, quando saiu da Banda Eva, em 1999. Os duetos internacionais incluem a canadense Nelly Furtado, o espanhol Alejandro Sanz e até a banda de rock norte-americana Dave Matthews Band. Por aqui, os “feats” vão de Roberto Carlos, Criolo, Daniela Mercury, Maria Bethânia, Carlinhos Brown a Ludmilla, companheira do possível hit do Carnaval de 2020, ainda não divulgado.

Como se vê, o axé não é o único combustível de Ivete. Já em seu primeiro álbum, que ganhou disco de platina em 2000, com 1 milhão de cópias vendidas, a cantora apresentou outros ritmos. A balada romântica “Se eu não te amasse tanto assim”, composta por Herbert Vianna e Paulo Sérgio Valle, é a prova e foi cantada por grandes nomes da música brasileira como Caetano Veloso e Gilberto Gil.

E música de sucesso é o que não falta no seu repertório. Suas canções dialogam com o Brasil. Marcam acontecimentos relevantes de nossa história recente. O hit “Festa” é gatilho de felicidade e traz a lembrança do pentacampeonato na Copa do Mundo de 2002, já que foi a música da comemoração do troféu na TV e em todos os cantos. “Nunca imaginava cruzar as fronteiras da Bahia, a música que eu faço é original de onde venho. Então me deixa honrada ser compreendida e acolhida pelo país, ainda mais em clima de união. Vejo que minha música mexe com as pessoas”.

Ivete, com sua família

Desde quando começou a cantar profissionalmente, em 1993, até hoje são mais de 300 canções. Ivete já vendeu mais de 20 milhões de cópias e recebeu mais de 150 prêmios nacionais e internacionais, como o Grammy Latino. Por mês, a cantora realiza uma média de 10 intensos shows e suas redes sociais somam incríveis 45 milhões de seguidores.

Veveta maré cheia

O Brasil de Ivete é diverso e, principalmente, alegre. As raízes explicam. “É como se eu morasse em Juazeiro até hoje, aquele lugar ainda está na minha memória. O bem viver que levo vem de lá”. Na casa de infância da cantora, a música vinha do violão do pai e da voz da mãe, que ouviam e cantavam juntos a música de Clara Nunes “Conto de areia”, o que rendeu o apelido “Veveta maré cheia”, dado pelo pai para a caçula.

Havia ainda os ritmos diversos dos quatro irmãos, que desde cedo tocavam e ouviam de tudo. “Com uma casa cheia dessas, não tem como não se abrir para novos estilos… Era viola, percussão, era uma diversidade imensa”. Foi o irmão Ricardo quem percebeu o talento de Ivete e começou a agendar shows em bares de Salvador. Durante uma apresentação em Morro do Chapéu, cidade a 390 quilômetros da capital baiana, ela chamou a atenção do produtor Jonga Cunha, dono do Bloco Eva, que a convidou para integrar a banda.

Cantora desfilando na escola de samba Grande Rio, em que foi homenageada em 2017

Com o trabalho da cantora, a família passou a ter uma vida estável novamente, após anos de dificuldade causada pela morte do pai e de um dos irmãos, Marcos. Durante aquele período, Ivete e sua irmã, Cyntia, chegaram a vender marmitas feitas pela mãe, Maria Ivete. Mas com o sucesso na música, Cyntia ficou responsável pelo figurino dos shows e, hoje, a família está toda envolvida na IESSI Music Entertainment, empresa responsável pela carreira da baiana, com 40 funcionários trabalhando diretamente para ela.

Quando se casou com o nutricionista Daniel Cady, em 2008, Ivete formou um novo núcleo familiar, também repleto de alto astral. Teve o filho Marcelo, hoje com 10 anos, que já acompanha a mãe na bateria em algumas festas. “Com o tempo, ele também vai poder se encontrar nos próprios ritmos”. E há dois anos a cantora viveu uma nova experiência com a maternidade, gestou as gêmeas Helena e Marina. “Elas são diferentes, às vezes esqueço que nasceram juntas, já mostram que têm seus jeitos particulares”. Ivete ainda deseja ter mais filhos, quantos forem possíveis, em suas palavras. “Venho de uma casa cheia e gosto muito disso”.

A cantora parece ultrapassar as barreiras do envelhecimento, ou melhor, os anos passam e a disposição, feliz e simplesmente, não. Com 47 anos, Ivete mostra que envelhecer apenas é um problema se existem obstáculos, o que para ela, com uma rotina de exercícios físicos e, principalmente, simpatia, não há. “Minha fonte de juventude são meus filhos também”.

Com ternura e desenvoltura

Sair dos palcos para apresentar programas de TV foi um caminho natural. Muito amiga da apresentadora Xuxa, a cantora comandou o “Programa da Xuxa” na TV Globo em 1998, durante a licença-maternidade da apresentadora. “Naquela época, tentei transmitir a naturalidade de Xuxa, falando para o público com ternura e desenvoltura. Acho que deu certo!”.

Quatorze anos depois, Ivete voltou à televisão, mas dessa vez em horário nobre e atuando no papel de Maria Machadão na novela “Gabriela”, de Walcyr Carrasco, inspirada no livro de Jorge Amado. “Atuar foi uma das melhores experiências que tive, e foi algo inesperado e surpreendente, pois nunca havia desejado aquilo até então”.

Desde 2018, Ivete é jurada no The Voice. Na última edição, esteve ao lado de Iza, Lulu Santos e Michel Teló aconselhando cantores de todo o Brasil. Para os novos talentos, a cantora enfatiza a autenticidade, o que ela própria leva para a vida.

Ivete ao lado dos apresentadores e outros jurados do The Voice. Foto: Globo / Paulo Belote

“Digo para terem uma postura honesta com todo mundo, seja com o público, com os jurados e com outros artistas. As pessoas lembram disso, você acaba colhendo a honestidade”. Este ano, ela também estreia no programa “Música Boa”, do Multishow.

Os shows continuam lotados mesmo entre as aparições na TV e alguns foram a amostra da potência de Ivete. Gravado no Estádio do Maracanã, em 2006, o disco “Ivete no Maracanã” reuniu grandes sucessos, como “Sorte Grande”, “Abalou”, “Arerê”, “País Tropical” e “Taj Mahal”, em um show para 60 mil pessoas no Rio de Janeiro.

O DVD teve quase um milhão e meio de cópias comercializadas, batendo todos os recordes mundiais da Universal Music, desbancando U2, Amy Winehouse e outras estrelas da companhia na época. Em 2010, Ivete gravou no Madison Square Garden, em Nova York, o quarto DVD da carreira, com participações do argentino Diego Torres, do colombiano Juanes, de Seu Jorge, do britânico James Morrison e da dupla de reggaeton porto-riquenha Wisin & Yandel.

Sempre em Salvador

Os planos para fevereiro são viver intensamente Salvador, como é seu costume há 27 anos. “No Carnaval, não tem jeito, eu não saio de lá”, brinca. Neste ano, a cantora anunciou um camarote próprio para convidados no circuito Dodô (Barra-Ondina), além de seguir no Bloco Coruja, que desfi la durante o sábado, domingo e segunda e tem a cantora como atração nos três dias de folia, arrastando milhares de pessoas pelas ruas em festa.

Cantora no papel de Maria Machadão, na novela “Gabriela”

“Curto muito as festas do Rio, de Sampa e de Olinda, o Carnaval é diverso e traz muitos estilos, é natural ter bloco para todo mundo. Mas abraçamos a rota de Salvador há muito tempo e não tenho planos de sair de lá. É a minha casa”. Para Ivete Sangalo, 2020 só começa de fato após a festa popular e, para o novo ano que chegou, a baiana continua desejando alegria a seu comando: “O melhor jeito de passar o Carnaval é comigo!”, avisa.

Confira nosso Ping Pong com a cantora:

Cantor e compositor Diogo Ramos traz samba em francês em seu novo álbum

Cantor e compositor Diogo Ramos traz samba em francês em seu novo álbum

Escutar samba em francês pode parecer inusitado, mas o ritmo e a voz suave de Diogo Ramos provam que o inesperado pode ser agradável. O compositor e produtor musical paulistano se inspira na tradição popular do cancioneiro e apresenta o disco “Samba sans Frontières”, em que faz homenagem ao Canadá e interpreta canções na língua de seu novo país com o som tropical de suas origens.

Novo CD de Diogo Ramos

“Samba sans Frontières”, de Diogo Ramos

Em 2010, em busca de novos horizontes, Diogo Ramos se estabeleceu em Montréal, onde completou seus estudos de violão na Universidade do Québec. Com uma carreira de vinte anos como produtor musical, o artista já recebeu vários prêmios e se apresentou nos mais famosos festivais, como Montréal Jazz Festival, Festival Nuit D’Afrique et Festival du Bout du Monde, entre outros.

Em “Samba sans Frontières”, ele contou com a colaboração de músicos do Brasil e do Canadá, unindo línguas, religiões e nacionalidades. “Sou um filho da Tropicália, mamãe me ninava com Gilberto Gil… Nosso planeta clama por mais encantamento e menos destruição”, afirma o músico. O disco, disponível nas plataformas digitais, teve uma turnê de lançamento mundial e dois shows em São Paulo no final de 2019.

Rádio Vozes: tempo, tempo, tempo

Rádio Vozes: tempo, tempo, tempo

Celebrar é ritualizar a passagem do tempo. Eu acabo de completar 21 anos de Vozes do Brasil, a 29HORAS completa 10 anos, estamos chegando em 2020 no calendário cristão, e no judaico já estamos em 5780.

“Tempo, tempo, tempo, um dos deuses mais lindos”, diz a canção. “Tempo bom, tempo ruim”, diz uma outra, “Rainha dos Raios”. E isso é importante perceber, essa alternância do bom e do ruim, da maré alta e baixa. E lembrar que na baixa tem marisco, nem tudo está sempre ruim o tempo todo. Tem a hora do bom e o bom a gente celebra.

Show do Vozes do Brasil no Sesc Vila Mariana

A foto que abre essa coluna foi tirada no Sesc Vila Mariana no comecinho dos anos 2000, quando eu fazia o programa ao vivo e com auditório. Já passamos por vários formatos. Do diário ao vivo até o digital que hoje distribuo pelo aplicativo Rádio Vozes.

Mas tem uma coisa que tenho amado fazer e que tem sido o mais importante na minha atuação profissional. Dar aulas. Ensinar e aprender sobre linguagem é emocionante.

Tenho mais de 30 anos de trabalho em rádio. Adoro conhecer rádios pequenas, comunitárias, polos de difusão pelo interior do país. E quando falo interior, não é necessariamente longe da água. Fui pra Ilha do Marajó uns anos atrás a convite da Caravana do Esporte e a experiência foi maravilhosa. Distribuí gravadores para jovens e adolescentes, fizemos reuniões de pauta, gravamos, editamos e colocamos no ar um programa de domingo ao vivo com um grupo de carimbó dentro do estúdio. Falamos sobre cultura, mas muito mais sobre questões ambientais que nunca haviam passado pela cabeça deles. Lixo, esgoto, um matadouro na beira do rio.

E esse ano, agora em novembro, fui convidada a ministrar uma oficina no Festival Arte na Usina. Uma iniciativa linda, que ocupa o município de Água Preta, na zona da mata de Pernambuco, a partir de uma usina de cana desativada. Há 5 anos, a fazenda abriga obras de arte, instalações espalhadas pelo Jardim Botânico, oficinas das mais diversas e uma rádio comunitária chamada Rádio Catimbó.

Criamos juntos o programa Vozes da Nação. Entrevistas, depoimentos, docs sonoros, especiais musicais. Tudo foi para o app Rádio Vozes e compartilhado com a turma da oficina.

Conversamos muito sobre linguagem. Como passar a mensagem que se deseja e atingir o público que se quer? Como falar para seus iguais? Como sair do conforto e buscar novos públicos? Eles me trouxeram um programa que é campeão de audiência em Recife chamado Bandeira 2. O locutor é um mestre! Conta atrocidades, crimes, assaltos, mortes, muita violência, como se fosse um narrador de futebol. Primeiro, a gente se assusta com o conteúdo, 5 minutos depois está rindo por causa da forma, uma loucura. Imaginei o mesmo formato levando conteúdo poético, educador, formador… seria revolucionário!

Aqui vai o link para o resultado da Oficina de Rádio 2019 do Festival Arte na Usina disponível na Rádio Vozes.

E se quiser me chamar para uma Oficina, mande uma mensagem por aqui. Feliz 2020!

Como a tecnologia de streaming deu novo fôlego para a indústria fonográfica

Como a tecnologia de streaming deu novo fôlego para a indústria fonográfica

Já faz mais de um século que a tecnologia vem mudando radicalmente a nossa relação com a música. Em 1877, Thomas Edison apresentou ao mundo o fonógrafo, que possibilitou pela primeira vez reproduzir gravações de áudio no conforto de casa. Com o invento, surge a indústria musical, que só conseguiu se manter graças a sua capacidade de reinvenção.

O vinil, o walkman, o videoclipe e o mp3 inovaram completamente a forma de se consumir música, e quem não soube se adaptar saiu no prejuízo. Agora, a bola da vez é o streaming.

Primeiro disco de vinil foi lançado em 1948

O Youtube é a plataforma de streaming de música mais popular do planeta. Segundo um estudo divulgado pela IFPI, uma organização internacional que promove os interesses da indústria fonográfica, 77% dos entrevistados acessaram o Youtube para ouvir música pelo menos uma vez por mês. Dados coletados em 19 países (a maioria são os considerados países desenvolvidos, mas a pesquisa contempla também Brasil, Argentina, África do Sul e Rússia) indicam que, em 2019, 89% das pessoas utilizam plataformas de streaming para ouvir música. A pirataria continua, mas agora com índices bem mais baixos do que nos anos 2000: apenas 27% dos entrevistados dizem ter usado métodos não licenciados.

As principais razões apontadas pelos pesquisados são a possibilidade de acesso instantâneo a milhões de canções, a liberdade para ouvir o que eles querem, e o fato de considerarem a forma mais conveniente de ouvir música. “Hoje só quem é muito hipster quer ter o CD ou o vinil. Essa não é a tendência daqui para frente, mas sim a desmaterialização do suporte e o consumo da mídia em tempo real. Houve uma mudança cultural que atingiu as pessoas que consomem e produzem música, elas ganharam muito mais autonomia de fazer escolhas”, comenta Marciel Consani, músico de formação, doutor em Ciência da Comunicação e professor titular da USP.

O antigo Napster, usado para baixar álbuns

Essa mudança não começou com o streaming, mas com o Mp3. Em 1999, surgiu a primeira plataforma capaz de oferecer o download gratuito de música, o Napster. Protagonista de uma série de embates judiciais entre a indústria fonográfica e as redes, o programa de compartilhamento de arquivos fez com que a venda de CDs despencasse.

Em abril de 2003, a Apple lançou o Itunes Music Store, plataforma que permitia comprar música licenciada no formato Mp3. Não foi o bastante para barrar a pirataria. Com o preço do álbum digital muito próximo ao do CD físico, o modelo de vendas era pouco atrativo para os internautas, que já baixavam música gratuitamente.

“A mudança tecnológica revelou-se irreversível e a indústria teve que se adaptar aos novos padrões. O modelo comercial só mudou definitivamente quando a própria indústria que dominava o mercado do disco viu um caminho economicamente sustentável para investir nos novos canais de distribuição”, ressalta Consani.

Primeira geração do iPod foi lançada em 2001, revolucionando o mercado

Foi apenas em 2008, quando uma startup sueca chamada Spotify desenvolveu um novo modelo de streaming de música, que o download ilegal de música começou a decair. Com um acervo de milhões de músicas, a plataforma entregava duas opções ao ouvinte: a versão gratuita, acompanhadas de alguns anúncios; e o plano de assinatura, com o acesso ilimitado após a cobrança de uma taxa mensal de baixo custo.

O empresário musical Ricardo Chantilly está no ramo desde a década de 1990 e conta que, a princípio, houve uma discussão para as gravadoras licenciarem o uso dos fonogramas para o Spotify, mas isso acabou rápido. “Como a pirataria digital era muito grande, os serviços de streaming foram vistos com bons olhos em pouco tempo”.

Atualmente, plataformas como o Spotify dominam a indústria

Já tendo administrado a carreira das bandas Jota Quest e O Rappa, Chantilly afirma que os downloads ilegais afetam mais as gravadoras do que os músicos. “O faturamento dos músicos, principalmente dos grandes artistas, não vem das vendas de CDs nem de streamings. Ele recebe mais em função de seus shows. O CD servia mais como uma ferramenta promocional do artista. Quanto mais ele vendia – ou agora, quanto mais streaming ele tem –, mais shows costumava ter. O show é, e sempre foi, o grande faturamento dos artistas”.

Tudo indica que o streaming de áudio vai se manter hegemônico nos próximos anos. Segundo a Statista, empresa especializada em pesquisas, a receita mundial das plataformas de streaming de música em 2019 deve alcançar os US$ 11 bilhões, com mais de 1 bilhão de usuários em diversas plataformas. As projeções indicam um crescimento contínuo na receita e no número de usuários até 2023. A pirataria parece estar com seus dias contados. Talvez o exemplo mais claro dessa mudança é que o próprio Napster é hoje uma plataforma de streaming de música.