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Especial Brasil-Japão: Kimi Nii, criar é a palavra-chave

Especial Brasil-Japão: Kimi Nii, criar é a palavra-chave

Para quem conhece o trabalho de Kimi Nii, é difícil acreditar, mas seu envolvimento com a cerâmica começou na feirinha da Praça da República, no centro de São Paulo. Foi em uma barraquinha de rua que ela encontrou o que procurava: uma cerâmica utilitária autêntica e de alta temperatura. “A barraquinha pertencia a um senhor japonês, e eu perguntei a ele com quem eu poderia aprender a fazer peças como aquelas”. A resposta veio rápido: “Você quer aprender? Eu posso te ensinar”.

Logo depois de se formar em Desenho Industrial pela FAAP, Kimi absorveu tudo o que aquele senhor podia ensinar e se sentiu realizada ao executar as peças que projetava, diferentemente da época da faculdade, em que só desenhava. “Eu chegava em casa depois da aula e não conseguia dormir, pensando ‘Eu fiz! Eu fiz!’ Eu estava apaixonada por aquilo tudo”.

Após três meses de curso, ela seguiu seu próprio caminho, pesquisando e experimentando sozinha. Sua primeira fornada de peças, no entanto, foi um fracasso. Na época, ela e a prima, também ceramista, levavam as peças para queimar no forno de um amigo, em Embu das Artes. Como a ocasião era muito esperada, se reuniam com amigos na sequência para celebrar os resultados. “Naquele dia, as minhas peças saíram do forno todas com algum defeito e muitos ceramistas mais velhos me falavam: ‘nossa, estou com pena de você, nenhuma das suas peças deu certo'”. Com esses comentários, Kimi Nii confessa que chorou, desapontada.

Os defeitos tinham a ver com a argila experimental, com o forno construído pelo próprio amigo e com a sua ousadia de criar peças de formatos experimentais logo no início de sua carreira. Com o tempo, Kimi Nii aprimorou esses e outros detalhes técnicos e começou a errar menos, como ela mesma diz.

Sobre seus formatos ousados ao longo dos anos 1970 e 1980, ela comenta: “Eu não conseguia vender minhas cerâmicas, eu fazia peças diferentes e os meus tipos de desenho não eram comuns na época; mas eu precisava criar alguma coisa, não ficava satisfeita fazendo vasos que todo mundo já tinha feito”. Hoje as coisas mudaram e a linguagem desenvolvida por Kimi Nii na cerâmica é compreendida e aclamada.

Representada pela galeria Emmathomas, do colecionador Marcos Amaro, com direção artística de Ricardo Resende, a artista já realizou incontáveis exposições coletivas e 20 individuais em diversas capitais brasileiras e cidades como Barcelona, Bruxelas e Tóquio. Passeando pelo pequeno jardim entremeado por esculturas na entrada de seu ateliê, localizado no Butantã, Kimi Nii faz uma última reflexão, ao final da entrevista: “O imperfeito tem mais graça, você não acha?”

Especial Brasil-Japão: A rua dos japoneses tradicionais

Especial Brasil-Japão: A rua dos japoneses tradicionais

O bairro da Liberdade foi povoado por japoneses no início do século XIX e, após os anos 1970, também começou a receber chineses e sul-coreanos. Uma pequena rua, no entanto, preserva a essência japonesa dos tempos da imigração. Com início no Largo da Pólvora, na Avenida da Liberdade, e fim na Rua Galvão Bueno, defronte ao Hospital LeForte, a Rua Thomaz Gonzaga tem um único quarteirão de extensão e abriga estabelecimentos japoneses tradicionais – quiçá os primeiros a serem abertos em São Paulo. A maioria deles é até hoje comandada por famílias de imigrantes e seus patriarcas, ou então pelos filhos ou sobrinhos. Descubra nas próximas linhas um pouco da história de algumas dessas famílias e seus estabelecimentos.

Ban: Rua Thomaz Gonzaga, 18

Yaki udon e chawanmushi

Masanobu Haraguchi chegou ao Brasil em 1979, convidado para assumir o sushi bar do antigo Suntory. Em 2001, após passar por outras casas, decidiu abrir seu próprio restaurante a fim de elaborar pratos seguindo os ensinamentos de seu mestre Ban, que dá nome à casa. O menu, criado por Haraguchi, segue a gastronomia tradicional japonesa. Ele é quem comanda o sushi bar, enquanto seu sobrinho se ocupa dos pratos quentes. Desde 1979 até os dias de hoje Haraguchi é seguido por clientes fiéis. Lá, peça um chawanmushi, considerado por muitos o melhor da cidade.

– De ter. a sex., das 11h30 às 14h30 e das 18h às 22h30; sáb. e dom., das 11h30 às 15h30 e das 18h às 21h30.

 

Kenzo: Rua Thomaz Gonzaga, 45F

Niguiris e sushis variados, servidos aos pares

Takashi Okuno é pescador e muito crítico com relação às comidas japonesas que prova em São Paulo. Foram esses dois fatores que o levaram a abrir, há um ano, um restaurante extremamente caprichoso especializado em sushi. Todos os dias – exceto às segundas – é ele quem vai até os fornecedores escolher os peixes e outros frutos do mar para servir no Kenzo. Suas filhas Tina e Cinthia cuidam do atendimento enquanto Hiro Mitsu Kohno, amigo de infância da família Okuno, comanda o sushi bar. Tradicional, a casa foi batizada com o nome do único neto do fundador, o garoto Kenzo, de 13 anos.

– De seg. a sex. das 11h30 às 14h30 e 18h30 às 22h; sáb. e dom. das 12h às 15h e 18h30 às 22h

 

Ikkousha: Rua Thomaz Gonzaga, 45E

Tonkotsu lámen e porção de guiozas

Esta casa é uma das duas únicas em São Paulo especializadas em tonkotsu lámen. Este caldo, típico de Hakata, região sul de Honshu, é feito a partir do cozimento de ossos de porco por várias horas. Como acompanhamento, peça os famosos guiozas do restaurante.

De ter. a sex., das 11h30 às 15h e 18h às 22h.; sáb. das 11h às 15h30 e 18h às 22h; dom. das 11h às 15h30 e 18h às 21h.

 

Lamen Kazu: Rua Thomaz Gonzaga, 51

Kara misso lámen

A casa abriu na data dos 100 anos da imigração. A ideia do grupo era apresentar, no Festival do Japão daquele ano, o lámen como ele é feito em seu país de origem, com ingredientes importados (como fazem até hoje). O restaurante trabalha com três tipos de missô, além do shoyu lámen e do shio lámen.

– De seg. a sex. das 11h às 15h e 17h30 às 22h30; sáb. das 11h
às 15h30 e das 17h30 às 22h30 e dom. das 11h às 15h e 17h30 às 21h

 

Kintaro: Rua Thomaz Gonzaga, 57

Raiz de lótus, sardinha marinada e berinjela com missô

Dona Líria sobe a porta de correr do Kintaro sempre às 7h. Logo, começa a preparar os petiscos do dia. Ela e seu marido abriram o izakaya ¬ botequim japonês ¬ em 1993 para ter onde beber com os amigos. Por volta das 17h, Líria deixa o bar e um de seus filhos, Wagner, chega para atender os clientes no período mais movimentado. O lugar, pequeníssimo, tem um balcão com poucos assentos, opções de cervejas, destilados, porções e muitos bonecos de sumô. Isso porque Wagner e seu irmão são lutadores – ambos já disputaram campeonatos mundiais. Não passe por lá sem beber uma kirin ichiban e provar as porções da casa, que mudam diariamente. Para saber quais são as do dia, basta assistir aos stories do Instagram do estabelecimento: izakaya_kintaro.

– De seg. a qui. das 7h30 às 23h; sex. das 7h30 às 24h; sáb. das 7h30 às 21h.

 

Hinodê: Rua Thomaz Gonzaga, 62

Katsudon

Sekai veio do Japão, ainda de colo, no penúltimo navio de imigrantes, em 1971. Sua mãe trabalhou em casas como Sushiguen e Sushi-Yassu. Em 1999, ela decidiu comprar o restaurante Hinodê, fundado em 1965. A única condição do antigo dono era que o nome, que significa “sol nascente”, fosse mantido. O seu filho Sekai passou, então, três anos em Tóquio se especializando em gastronomia. Voltou no ano 2000, preparado para assumir o comando do Hinodê. O menu da casa, um dos mais extensos da Rua Thomaz Gonzaga, oferece mais de 90 itens, a fim de atender japoneses, integrantes da colônia em São Paulo e brasileiros.

– De seg. a sex. (exceto ter.) das 12h às 14h30 e das 18h30 às 22h30, sáb. das 12h às 15h e das 18h30 às 22h30, dom. das 12h às 16h e das 18h30 às 22h.

 

Kazu Cake: Rua Thomaz Gonzaga, 84

Choux cream tradicional

A doceria foi responsável por introduzir a moda do choux cream na Liberdade. A receita da casa, elaborada pelo chef Felipe Tadao, leva dois tipos diferentes de massa e recheio de creme de confeiteiro bem gelado com um toque secreto.

De seg. a dom. das 10h às 21h.

Especial Brasil-Japão: Descubra a Liberdade

Especial Brasil-Japão: Descubra a Liberdade

Estação Liberdade da linha 1, azul, do metrô. Durante os dias úteis, poucas pessoas desembarcam do trem – a maioria de olhos puxados. Durante os finais de semana isso muda e gente de diferentes tribos e etnias descem ali, na Praça da Liberdade, onde todos os domingos acontece a feirinha de utensílios, roupas, bugigangas e comidinhas orientais, que vão desde guioza, yakissoba e espetinhos de camarão até combinados de sushis e banchá. O caminho quase natural para todos os passantes desbravadores é seguir as lanternas vermelhas suzurantô pela Rua Galvão Bueno, por onde há mercados entupidos de clientes que buscam legítimos ingredientes orientais para seus lares.

A presença nipônica no bairro começou por volta de 1912, como uma alternativa de aluguel barato para as famílias imigrantes. Ali surgiram armazéns, cinemas, restaurantes, hospedarias e outros estabelecimentos coordenados por japoneses. Esse cenário se transformou por volta de 1970, com a chegada do metrô e mudanças estruturais nas ruas da Liberdade, ocasionando a saída de parte da colônia japonesa ali instalada para outras regiões da cidade. Com isso, comércios chineses e sul-coreanos passaram a aparecer no bairro. Isso tudo, somado aos improvisos tipicamente brasileiros e ao cenário caótico e cinzento da cidade de São Paulo, resulta na miscelânea cultural que pode ser vista a olhos nus pelas ruas da região – uma mistura maravilhosa, diga-se de passagem.

Abaixo, algumas dicas para sair da Liberdade com uma experiência bacana do universo japonês no Brasil.

 

Para cozinhar em casa: Marukai

Este mercadinho é o mais bem-sucedido da rua Galvão Bueno. Lá você encontra cogumelos frescos variados, frutas, legumes, missôs, arroz japonês, temperos para o preparo de sushis, doces japoneses e outros incontáveis mantimentos. Se estiver perdido em meio a tantos produtos, compre um quilo de arroz Momiji de grão longo, um pacote de furikake Futaba sabor nori (para colocar em cima do arroz, depois de cozido), uma embalagem de Bulldog (molho para milanesa tonkatsu, mas que vai bem com qualquer legume cozido) e, para a sobremesa, leve uma bandeja de mochi com recheio de feijão azuki.

Rua Galvão Bueno, 34, Liberdade, tel. 3341-3350.

 

Made in Japan: Tenman-Ya

Ainda que taiwanesa, a loja é especializada em artigos fabricados no Japão, majoritariamente voltados para a cozinha. Lá você encontrará desde porcelanas e hashis até bentôs fofos para montar marmitas e panelas super tecnológicas.

Rua dos Estudantes, 19, Liberdade, tel. 3209-9960.

 

Os chás da moda: Tea Station

Um lugar literalmente underground, bonitinho e muito frequentado por descendentes de orientais. Prove os famosos bubble teas feitos com chá, yakult e bolhas de xarope de frutas que estouram na boca.

Rua da Glória, 326, Liberdade, tel. 3271-4656.

Especial Brasil-Japão: o traço marcante de Hiro Kawahara

Especial Brasil-Japão: o traço marcante de Hiro Kawahara

Crédito: Luiz Maudonnet

Hiro Kawahara está na lista dos notórios brasileiros com ascendência japonesa. O nome pode não ser familiar à primeira vista, mas provavelmente você já viu o trabalho dele alguma vez: há 26 anos Hiro cria e ilustra as toalhas de bandeja do McDonald’s.

“A quantidade é surreal”, comenta Hiro, nascido em Mogi das Cruzes há 53 anos. “São impressos 12 milhões de unidades de cada modelo, o que me tornou o ilustrador com mais visibilidade do mundo. Sei de ilustradores de renome que começaram a desenhar copiando traços de toalhinhas antigas. É um marco insuperável na minha carreira”.

Em seu portfólio constam também trabalhos publicitários para as marcas Pão de Açúcar, Itaú e Nestlé, entre outras. Dono de um estilo único, ele comenta que foi moldando essa identidade depois de estudar artistas que trabalham com desenvolvimento de personagens para animações americanas e europeias – alguns nomes seriam Shane Glines e Glen Keane.

“Meu trabalho não está relacionado ao traço, mas à ideia que quero passar e à sensação que quero transmitir para quem o observa. E nesse quesito minha influência maior foi o artista japonês Hayao Miyazaki, com a sua maneira delicada de contar histórias. O que eu aprendi de sutileza na narrativa, na eliminação dos clichês e na beleza do movimento foi assistindo em looping infinito filmes como Totoro e Kiki”.

Sobre os animes e mangás, Hiro Kawahara acredita que esse é um fenômeno de sucesso não só no Brasil. “Isso se dá graças aos jovens. Para eles, o mangá não é só quadrinho, e anime não é só desenho animado japonês. Isso expressa o que eles sentem, o que tornou essas artes populares em todas as classes sociais”.

Além de ilustrador, Hiro é quadrinista. Já produziu três livros – o mais recente, “O Bestiário Particular de Parzifal”, bateu recordes de arrecadação no Catarse e teve uma tiragem inicial de 4.500 exemplares, um estouro em termos de livro independente. Hoje trabalha em dois quadrinhos: “Últimos Deuses”, com roteiro de Eric Peleias, que deverá ser lançado em dezembro, e “Duas Sereias”, previsto para maio de 2019.

Especial Brasil-Japão: Yuko Fujii, a nova técnica da seleção masculina de judô

Especial Brasil-Japão: Yuko Fujii, a nova técnica da seleção masculina de judô

Crédito: Rafal Burza

Foi em maio desse ano que a Confederação Brasileira de Judô (CBJ) anunciou a japonesa Yuko Fujii como nova técnica da seleção masculina de judô. A notícia trouxe consigo um ineditismo: pela primeira vez na história da modalidade uma mulher comanda a equipe masculina.

“Eu me sinto muito honrada”, afirma Yuko, de 36 anos. “Agradeço e admiro o Comitê Olímpico do Brasil e a CBJ pela coragem nessa decisão que eles tomaram. Gostaria de ser um exemplo para mostrar que mulheres conseguem trabalhar junto com homens, potencializando o que cada um tem de bom e alcançando as metas”.

Yuko é natural da cidade de Toyoake, na província de Aichi, no Japão. Ela está no Brasil desde 2012, quando veio a convite da CBJ para auxiliar na preparação dos judocas brasileiros, especialmente na transição do júnior para o sênior – anteriormente ela havia trabalhado como auxiliar técnica da seleção britânica. Mestre em Educação Física pela Universidade de Hiroshima e faixa preta yon-dan, ela integrou a seleção nacional júnior do Japão no período de 1997 a 2000.

“O judô no Brasil tem histórico de resultado nas Olimpíadas e também é um meio de educação, para formar uma pessoa”, ela comenta. “Vejo que o judô foi bem recebido e as suas essências como Seiryoku zenyo (máxima eficiência) e Jita kyoei (benefício mútuo, solidariedade), têm influenciado na cultura brasileira”.

Sobre as preparações para as Olímpiadas de 2020 em Tóquio, Yuko Fujii assegura: “Continuamos potencializando pontos fortes e corrigindo os erros. Estamos treinando agora no Japão e os atletas vêm respondendo bem, criando uma energia bastante positiva”.