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Viagem pela natureza baiana

Viagem pela natureza baiana

Trabalho como executivo de novos negócios em uma das maiores empresas brasileiras de e-Commerce. Sou fascinado pelo meu trabalho e pela natureza. E, em um domingo qualquer, comecei a me questionar: se gosto tanto dessas duas coisas, por que dedico a maior parte do meu tempo ao trabalho e fico tão pouco na natureza?

Barquinhos em Moreré (foto divulgação)

A partir desse dia, abandonei aquela ideia de que uma boa viagem é necessariamente dentro de um navio, em um hotel com conforto e serviços e resolvi fazer uma viagem de férias fugindo disso tudo, buscando me conectar ao máximo com ela, a natureza, ou elas: nossas praias, estradas, rios, frutas e, principalmente, o nosso povo. Comprei uma barraca, uma mochila grande, um snorkel e voei para a Bahia a fim de conhecer os mínimos detalhes da natureza e da população litorânea de lá.

Sem reservas ou itinerário pré-definido, percorri o seguinte trajeto em 22 dias: Salvador, Bom Despacho, Valença, Moreré (Ilha de Boipeba), Gamboa, Morro de São Paulo, Valença, Camamu, Barra Grande, Taipu de Fora, Ilhéus, Porto Seguro, Arraial D’ajuda, Trancoso, Caraíva e Corumbau.

“Onde você mora?”, perguntei. “No mesmo lugar que você”, ele respondeu. Quis confirmar: “São Paulo?!”, e ele, na lata: “Não, seu bobo, no planeta Terra! Quem tem moradia fixa não aprende o que tem para aprender com esse mundo!”. Durante os trajetos de van, ônibus, trator, carro, ferry boat e barco, conheci os mais diferentes tipos de pessoas. “O que você faz da vida?”, “De tudo!”, “Mas de tudo o que?”, “De tudo que me faz feliz, e você, o que faz da vida?”. As conversas fluíam e mesmo quem estava a caminho do trabalho conseguia adentrar diálogos autênticos, independente de conhecer seus interlocutores ou não – um pouco diferente do que vemos nos transportes em São Paulo.

Como as praias foram muitas e todas elas me marcaram de um jeito especial, falarei aqui sobre as menos conhecidas e sobre aquelas que ainda não foram fisgadas e maltratadas como rota do turismo massivo.

Moreré. Uma praia marcada por sua simplicidade e pela atividade majoritária da região: a pesca. Na maré alta, dezenas de barcos na água, bem próximos à areia. Na maré baixa, todos em terra. Esse curioso movimento da natureza, que faz a maré recuar cerca de um quilômetro, acontece diariamente.

Para quem gosta de caminhar, a trilha até Castelhanos é uma boa. São duas horas de trajeto, passando pela praia de Bainema, por caminhos repletos de flores e guaiamuns, espécie de caranguejos azuis que vão adentrando suas tocas conforme os humanos se movimentam por perto.

Chegando em Castelhanos, o mar é limpo e gostoso para banho. Ainda ali, há uma série de barracas construídas em palha com comidas típicas e caipirinhas feitas com frutas locais, como siriguela, biribiri, cacau e umbu. Caso saia de lá ainda com fome, a melhor alternativa é pegar um barco até a Cova da Onça (São Sebastião), onde há os restaurantes mais gostosos da área.

Gamboa é a praia que fica ao lado do famoso Morro de São Paulo. Seu diferencial é a tranquilidade e o pequeno número de pessoas na areia. Lá, existem paredões de argila que fazem muito bem para a pele. A indicação é esfregar a argila pelo corpo, esperar secar e tomar um banho de mar.

Barra Grande (foto Rosilda Cruz)

“Se você passar mais de cinco dias aqui, não vai mais conseguir ir embora”. Foi o que me disseram logo que cheguei em Barra Grande. Pois bem, passei lá quatro dias inesquecíveis e garanto que se ficasse mais um, realmente não arredaria pé. Ponta do Mutá, Três Coqueiros, Bombaça, Taipu de Dentro, Taipu de Fora. Além destas praias, a região conta com duas lagoas: a Lagoa Azul e a Lagoa do Cassange, ambas vazias e com vistas maravilhosas. Na Lagoa do Cassange há um bar com puffs à beira d’água. A melhor coisa? Deitar em um destes e tomar um drink à base de “mel de cacau”, uma especiaria produzida exclusivamente pela população local. Como é feita? Deixando a fruta do cacau aberta em folhas de bananeira, o que faz com que o sulco – mel – escorra e possa ser coletado. Tomei o drink bem gelado e nunca havia provado nada parecido, principalmente se considerarmos a pitadinha de cachaça baiana contida nele.

Caraíva fica próxima a Porto Seguro e acredito que foi a melhor escolha para fechar a viagem. Faz menos de dez anos que a região passou a ter energia elétrica, portanto, é marcada pela simplicidade do ambiente e de seus habitantes, muitos deles descendentes dos índios Pataxós. Na praia não há guarda-sol, mas sim pequenas tendas feitas com filetes de madeira e panos coloridos. Logo a frente destas coberturas está a foz do Rio Caraíva, de águas escuras, as quais se misturam com o mar resultando em ondas negras no no oceano, um fenômeno deslumbrante.

Rio Caraíva (foto Denise Ikuno)

Também tive o prazer de participar do carnaval de Caraíva, que é chamado de Carnaboia. Lá, todos os foliões vão para dentro do rio Caraíva com suas respectivas bóias ou qualquer outra coisa que flutue e seguem o fluxo do rio ao som de uma banda que vai tocando em uma pequena embarcação no sentido contrário ao mar. A energia dentro da água é incrível, o caminho que o rio faz é lindo e a festa ao fim do Carnaboia é uma coisa única no mundo.

Para concluir, saí de São Paulo com uma barraca e uma mochila tentando encontrar algo diferente daquilo que vivo todos os dias, alguma resposta. E posso afirmar que esta viagem foi como um curso muito bem ministrado pela natureza e pelo povo baiano. Aprendi que a beleza da vida está na simplicidade, que o tempo é criação do homem e que a felicidade não era o que eu pensava. Felicidade é apreciar um pôr-do-sol sem pressa, é comer uma fruta do pé e pensar que ela simplesmente nasceu ali e está disponível para você. É ouvir uma história de gratidão de alguém que tem uma vida tão difícil. Enfim, felicidade é ter a humildade de admitir que não sabemos nada da vida e pedir com carinho para que ela nos ensine a viver.