Reynaldo Gianecchini experimenta novos formatos e estreia este mês o musical “Priscilla, a Rainha do Deserto”

por | maio 29, 2024 | Cultura, Entrevista, Espetáculos, Pessoas & Ideias | 0 Comentários

O ator Reynaldo Gianecchini desfruta de sua liberdade e investe em novos formatos e narrativas. Este mês, ele estreia em seu primeiro Musical, “Priscilla, a Rainha do Deserto”, no teatro Bradesco

Ícone máximo no universo drag, RuPaul fez história na televisão norte-americana ao apresentar para a sociedade sua arte e inspirar milhares de meninos do mundo todo a seguirem o mesmo sonho. Seu reality de competição “RuPaul’s Drag Race”, lançado em 2009, foi um sopro de ar fresco para aqueles que queriam se ver representados e ter coragem para assumir suas verdadeiras identidades e sexualidades.

Mais de uma década antes, em 1994, um filme também quebrou barreiras e foi fundamental para que artistas como RuPaul viessem com mais força: “Priscilla, a Rainha do Deserto” (do diretor australiano Stephan Elliott), que conta a história de duas drag queens e uma transexual contratadas para fazer um show em Alice Springs, cidade no deserto da Austrália. Para chegar ao destino, elas viajam a bordo do ônibus Priscilla e, claro, passam por diversas aventuras ao longo do percurso. Com tamanho sucesso, a obra foi adaptada para os palcos em 2006, virou um hit na Broadway e ganhou versões no mundo todo.

Agora, o espetáculo chega ao Brasil, no Teatro Bradesco, em uma temporada que vai de 7 de junho a 1º de setembro, e traz no papel principal Reynaldo Gianecchini – que estreia no gênero musical e promete fazer jus ao clássico, mas com um tempero brasileiro. “Nossa versão é bastante atualizada e traz essa drag que canta e dança, ao contrário de antigamente, que era mais dublagem. Não será super fiel à Broadway e ao filme. Terá toques brasileiros bem interessantes, como o nosso humor”, avisa. Para viver o personagem Anthony “Tick” Belrose, que se transforma em Mitzi Mitosis, Gianecchini fez um mergulho profundo na arte drag e teve como maior inspiração RuPaul, de quem virou fã após assistir a todos os episódios do reality. 

 

foto Pedro Dimitrow

 

Aos 51 anos, com mais de 20 de carreira, o eterno galã da Globo diz estar pronto para alçar novos voos, especialmente fora da televisão – seu último papel em novela foi em “A Dona do Pedaço”, em 2019, como o vilão Régis – e investir em papéis e narrativas diferentes, que o desafiem e permitam mostrar sua versatilidade como ator. É o caso do thriller “Uma Família Feliz”, lançado este ano e que traz Grazi Massafera como companheira de cena, e da série de sucesso “Bom dia, Verônica”, da Netflix, em que interpreta o arquivilão Matias. 

Em entrevista exclusiva à 29HORAS, o artista fala sobre esse novo momento em sua carreira, revela suas expectativas para a estreia da peça, relembra papéis icônicos na televisão e reflete sobre a maturidade. Leia, nas páginas a seguir, os principais trechos dessa conversa.

“Priscilla, a Rainha do Deserto – O Musical” é sua estreia nesse gênero. Como surgiu o convite?
Eu já estava flertando com essa ideia há bastante tempo, quase atuei com a Cláudia Raia na peça “Cabaré”, em 2011, mas fiquei doente naquela época. Concluí que estava na hora, ainda mais com esse personagem que é muito lindo, em um espetáculo que tem muita coisa legal e atual para falar, sobre a liberdade e a beleza de ser. O convite veio pela produção e eu de cara – mas com bastante medo – aceitei e estou muito feliz de ter encarado esse desafio.

Você já tinha feito algum trabalho com canto? Como foi o processo de imersão no personagem?
Venho trabalhando o canto há um tempinho, não exatamente com o objetivo de fazer musical, mas porque eu gosto de cantar e sempre tive muita vontade de ampliar a minha percepção musical. Gostaria de tocar mais instrumentos também, mas como não tenho muito tempo, o canto é algo importante na minha profissão, porque conhecer o seu aparelho vocal te ajuda na interpretação e a trabalhar as nuances da voz. Mas encarar um musical é outra coisa, é um trabalho muito mais vertical para o canto. Então a preparação se deu muito pela voz, claro, mas pela dança também, porque fazer uma drag queen exige expressão corporal, tem que estar com o corpo bem molinho e solto para interpretar danças que são tradicionais do mundo drag, principalmente o jazz. E muito da composição acontece nas trocas com os diretores (Mariano Detry e Jorge de Godoy) e com o resto do elenco maravilhoso. 

 

O ator como a drag queen Mitzi Mitosis, em “Priscilla, a Rainha do Deserto – O Musical” – foto Pedro Dimitrow

 

Como o espetáculo da Broadway te inspirou e influenciou na composição do seu Anthony “Tick” Belrose?
Não vi o espetáculo da Broadway nem lá e nem aqui no Brasil, quando teve a versão anterior. Eu assisti ao filme quando lançou (em 1994) e revi há pouco tempo novamente. Acredito que ele está um pouco antigo, hoje em dia uma drag, principalmente depois do RuPaul, atinge outro patamar! Então a nossa versão é bastante atualizada, tem todos os tipos de drag e traz a moda e essa drag que canta e dança, ao contrário de antigamente, que fazia mais dublagem. A minha inspiração tem sido na presença dos meus colegas incríveis e me alimento de ver tanta gente boa ao meu redor.

Como era o seu contato com o universo drag queen antes da peça? Quais são as maiores descobertas com esse trabalho?
Comecei a me interessar pelo universo drag queen na pandemia, porque comecei a assistir a todas as temporadas do programa ‘RuPaul’s Drag Race’ e fiquei absolutamente fascinado! Eu via com a minha mãe, que estava comigo, e ela também amava. Descobrimos um universo, a arte drag é de muito talento e, hoje em dia, você tem que saber cantar, dançar, atuar, ter senso de humor, ser maliciosa e sexy. Comecei a ampliar o meu horizonte vendo documentários e séries, o que me fez admirar ainda mais essa arte e quem a faz com tanta excelência. São verdadeiros artistas completos, raros de se ver!

O que o público pode esperar do musical? Terá algum toque brasileiro?
O público pode esperar um grande show, porque os números musicais são muito espetaculosos. Também pode esperar diversão, humor, emoção – tem vários momentos lindos que tocam demais –, hit atrás de hit para querer levantar da cadeira e dançar junto. Tem tudo! O figurino é um personagem à parte, muito lindo e criativo, e o elenco é incrível e diverso, com gente talentosa de vários lugares. É um espetáculo de encher os olhos. Tenho certeza de que todo mundo vai sair muito tocado e leve. A peça não será super fiel à montagem da Broadway e ao filme, não é uma franquia, e tem sim toques brasileiros bem interessantes, como o nosso humor. Apesar de se passar na Austrália, tem muitas referências ao Brasil, tem o nosso jeitinho, o que deixa tudo mais especial.

Seu último trabalho na TV foi em 2019, como o Régis na novela “A Dona do Pedaço”. Qual foi o motivo do afastamento? Pretende voltar às novelas?
Depois da pandemia, mudei bastante o meu direcionamento e surgiu o desejo de experimentar coisas novas. Eu venho fazendo novelas há 20 anos, então quis me exercitar em outras narrativas, outros jeitos de contar histórias, mais curtas principalmente, que desgastam menos. A novela toma muito tempo e eu queria aproveitar mais a vida, por isso decidi que, pelo menos por enquanto, eu quero me aventurar em outras áreas e fazer outros tipos de personagens. Quero explorar outros caminhos, como o streaming, que ainda está engatinhando, mas vai crescer. Há muitas possibilidades novas e agora que não tenho um contrato fixo, tenho liberdade de poder escolher e não ficar preso a nada. Como artista, essa liberdade é fantástica, estou gostando bastante dessa fase!

Já se passaram 24 anos desde a sua estreia na TV, na novela “Laços de Família”. Quais recordações você tem desse primeiro trabalho e quais foram os maiores aprendizados nessas mais de duas décadas?
Eu tenho lembranças maravilhosas dessa primeira novela, porque quase me misturei ao meu personagem. Assim como o Edu, eu também estava descobrindo o Rio e morava no Leblon. Tinha um lado muito lúdico, com colegas incríveis e pessoas que admirei a vida inteira. Por outro lado, talvez tenha sido o ano mais difícil da minha vida, porque trouxe muita mudança e responsabilidade. E agora olhando, depois desse tempo todo que passou, sou muito grato por ter adentrado nesse universo da televisão e por ter recebido tantos convites depois para que pudesse continuar a minha carreira. Fui aprendendo, especialmente com tantos excelentes profissionais, atores e diretores incríveis com quem trabalhei, e ganhando repertório, experiência e ferramentas para trabalhar cada vez melhor. Fui conquistando tranquilidade, o que é fundamental para o trabalho do artista, ficando cada vez mais presente e me divertindo mais.

 

Gianecchini com Vera Fischer em “Laços de Família” – foto Globo | divulgação

 

Qual é seu personagem favorito na TV?
É muito difícil escolher um personagem, tenho seis planetas em libra (risos), para mim é muito difícil escolher qualquer coisa. Parece clichê, mas de fato a gente aprende com todo papel. Mas claro que tem alguns que são ‘turning points’. O Edu de ‘Laços de Família’ foi um, porque me deu uma oportunidade incrível. Em ‘Esperança’, fazia um italiano, então mexeu muito comigo e com as minhas origens. Até hoje assisto e falo ‘que beleza!’, tenho muito orgulho de ter feito. 

O Pascoal de ‘Belíssima’ também foi importante, porque ele me inseriu no mundo da comédia. Em ‘Da Cor do Pecado’, eu fiz os gêmeos Paco e Apolo e é uma novela que até hoje as pessoas falam muito. Amei fazer o remake de ‘Guerra dos Sexos’, pois foi logo após meu autotransplante de medula e eu era apaixonado pelo meu personagem Nando desde os anos 1980, quando estreou a original. Depois veio ‘Verdades Secretas’, que para mim é uma das melhores coisas que a televisão fez até hoje. Adorei fazer o vilão Fred em ‘Passione’, ao lado de Fernanda Montenegro, foi um exercício gigante! Na última, ‘A Dona do Pedaço’, começava vilão e depois me apaixonava, tinha uma curva bonita e eu gosto de personagens que começam de um jeito e terminam de outro, que trazem várias camadas.

Você lançou este ano o filme “Uma Família Feliz”, ao lado de Grazi Massafera, que chamou a atenção por ser um suspense, gênero ainda pouco trabalhado no cinema nacional. Como foi o processo de produção e atuação? E como foi a recepção do público?
Eu adoro esse filme e tenho muito orgulho! É um gênero que a gente não faz muito no Brasil, mas ele é muito bem-feito, tem todos os elementos que um bom cinema de gênero precisa. Tenho um carinho gigante por essa equipe, pela Grazi, pelo diretor José Eduardo Belmonte e pelo escritor Raphael Montes, com quem já tinha feito a série ‘Bom dia, Verônica’. O processo foi muito feliz e rápido, fizemos tudo em menos de um mês e foi filmado em Curitiba, o que é bacana porque foge do eixo Rio-São Paulo. O filme exigia uma interpretação que não fosse óbvia, era tudo meio escondido, eram as camadas que estavam por trás que interessavam – foi bem difícil de fazer. Eu percebi que o público gostou muito, impressionante a repercussão nas minhas redes sociais, como as pessoas vibraram e ficaram impactadas. Fico muito feliz, porque esse é o grande objetivo do ator: impactar de alguma forma a audiência. É muito legal fazer cinema e é algo que eu quero explorar mais.

 

Com Grazi Massafera no filme “Uma Família Feliz” – foto divulgação | Pandora Filmes

 

Quais gêneros você mais gosta de trabalhar? Há ainda um estilo ou formato que deseja experimentar na atuação?
Gosto de me experimentar em todas as frentes e cada vez mais quero tentar novas narrativas. O fundamental é sempre contar uma boa história, com bons personagens. Quando exploramos o universo do personagem, estamos explorando esse universo dentro de nós também. Então, crescemos muito como seres humanos e como artistas. Esses processos me interessam cada vez mais, tanto no cinema quanto no teatro e na televisão, mas eu não tenho preferência, gosto de intercalar. Eu não tenho preconceito com nada, acho que o ator tem que se testar mesmo em tudo, ter um olhar atento para todas as artes. Agora estou testando o formato musical e sinto que está começando uma fase muito legal de experimentação na minha vida. 

Você sempre foi considerado um galã brasileiro. Ao longo de sua carreira, quais foram os prós e contras desse rótulo?
Nunca briguei com esse rótulo, porque acho que tem um lance legal em ser galã. Mas também nunca me vi preso ou resumido a isso, sempre quis experimentar outras coisas. No teatro, tive a oportunidade de fazer uns personagens mais diferentes, e mesmo na televisão tive várias chances de fazer o anti-herói e quebrar um pouco isso do galã perfeitinho, do mocinho, do príncipe. No streaming, por exemplo, o Matias de ‘Bom dia, Verônica’ é um personagem muito forte. Eu não acredito muito em rótulos, em gavetas fechadas, acho que tudo é aberto e muda o tempo todo, não tem nada estático ou definitivo na vida, podemos sempre mudar de ideia, criar, recriar.

 

Cena da segunda temporada de “Bom Dia, Verônica”, série da Netflix – foto divulgação | Netflix

 

E como você definiria o Reynaldo Gianecchini hoje?
Difícil a gente se definir em poucas palavras. Mas quando penso em mim, penso sempre nessa pessoa que quer muito ampliar o horizonte, tentar ver além do microcosmo em que vivemos. Estou nessa fase de descobrir coisas novas, olhar para o novo e achar beleza e potência em muita coisa que não eu enxergava antes. Precisamos discutir, sair da bolha e do nosso umbigo e olhar mais adiante, com empatia. Eu amo viajar, explorar e descobrir novas culturas e novos jeitos de ver a vida. O grande objetivo é a gente aprender a amar e ter mais autoconhecimento, abrir o coração.

Como está sendo a vida aos 50 anos? É melhor do que aos 20?
Estou amando a vida depois dos 50, é uma maravilha essa coisa da maturidade. Definitivamente me sinto muito melhor hoje do que qualquer década atrás. Ainda tenho muito vigor, virilidade e prazer de viver. Sou menos ansioso e mais consciente de mim. Estou pegando a rédea da minha vida. Quando você se conhece mais, fica mais confortável, forte e não liga tanto para o que as pessoas pensam, não se preocupa mais em agradar tanto. Quero viver em paz na minha verdade, com o meu prazer, fazendo as coisas de que gosto.

Como enxerga o futuro? Ainda tem algum grande sonho para realizar?
Nunca faço planos a longo prazo, porque entendo que a vida surpreende o tempo todo. Eu deixo a vida me levar, vou sentindo o fluxo, vivendo muito a partir do que ela me apresenta e fazendo as escolhas diante do que eu sinto que é melhor, seguindo minha intuição e minha verdade. Além de curtir a vida, ter espaço para as amizades, para me sentir na natureza e viajar, eu sinceramente me vejo trabalhando até velhinho, porque eu amo minha profissão e ela me leva para lugares e pessoas incríveis, além de me proporcionar muito autoconhecimento.   

Foto da capa: Soul; TZ Assessoria; TZ Produções; fotógrafo: Muraca

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