No mês em que completa 41 anos, o cantor, compositor, sanfoneiro e técnico do “The Voice Brasil”, Michel Teló fala sobre o sucesso planetário de “Ai Se Eu Te Pego”, elucubra sobre os rumos da música sertaneja e comenta recentes lançamentos
Em 2011, não adiantava tentar fugir. Em todos os cantos do planeta, só dava Michel Teló cantando “Ai Se Eu Te Pego”. A canção ficou meses em primeiro lugar nas paradas do mundo todo, da Colômbia à Holanda, de Israel à República Tcheca. Mais recentemente, em junho do ano passado, a faixa atingiu a fabulosa marca de um bilhão de views no YouTube.
Mas, mesmo com essas realizações todas no currículo, o cantor, compositor e musicista nascido no Paraná e criado no Mato Grosso do Sul continua o mesmo. Com seu jeitinho acanhado, Teló segue atuando na TV como jurado e mentor do “The Voice Brasil“, se prepara para colocar novamente em cartaz nos teatros o espetáculo “Bem Sertanejo” e ainda consegue tempo para namorar sua esposa, a atriz Thais Fersoza, e participar da educação dos filhos Teodoro (de 4 anos) e Melinda (5). Dividindo-se entre São Paulo (onde fica a humilde residência oficial da família) e o Rio (onde todos estão morando por causa do trabalho na TV), ele concedeu entrevista à 29HORAS. Confira a seguir os principais trechos dessa prosa:
Você é o intérprete de uma canção que, durante meses, foi a mais executada em todo o planeta. Ainda assim, preserva um jeito simples, de “gente como a gente”. Como conseguiu escapar das armadilhas da fama e resistiu à tentação de se comportar como um superstar desagradável?
Eu me sinto muito abençoado por tudo o que eu tive a alegria de viver devido à “Ai Se Eu Te Pego”. Já se passaram 10 anos e nenhuma música em português alcançou uma marca tão grandiosa, de ficar em primeiro lugar em tantos países. Eu acho que essa minha postura tranquila vem dos meus pais. Eles sempre pregaram a questão do res- peito, do amor ao próximo, de tratar as pessoas com carinho e, para mim, é muito claro que somos todos iguais e vamos todos para o mesmo lugar. Sempre tive a consciência de que a vida é feita de ondas para a gente surfar, que toda carreira tem seus altos e baixos. E eu surfei, e ainda surfo, a onda dessa música com muito respeito e gratidão.
Por falar em estilo sertanejo, você é um dos raros artistas que valorizam as raízes desse gênero musical. Nos últimos tempos, os temas do cancioneiro sertanejo vêm mudando bastante. Deixou de enaltecer a natureza e as coisas da roça para falar de amor, dor de cotovelo, balada e até de empoderamento feminino. E agora? Para onde caminha a música sertaneja?
Realmente o sertanejo, a música caipira, nasceu pela viola, que veio com os portugueses e foi tomando a forma da viola caipira, através dos nossos tropeiros e boiadeiros. Antigamente, a maioria dos brasileiros vivia no campo e as músicas falavam dessa vivência. Quando o país começou a se urbanizar, a trilha passou a abordar outros temas. Até os anos 1960, as músicas falavam do cara que saiu do campo pra ganhar a vida na cidade. Nos anos 1990, veio o momento “Amigos”, mais romântico; nos anos 2000 veio a pegada mais acústica, da balada; e agora estamos vivendo esse momento especial das mulheres brilhando. Eu acho que o sertanejo sempre sabe se reinventar e é isso que permite que o estilo esteja há pelo menos três décadas no topo das paradas no país.
Não seria interessante, nesse momento de destruição desenfreada, que o universo sertanejo abraçasse a questão ambiental?
Acho importante a gente se atentar à questão ambiental, vivenciar e falar sobre isso. Eu tenho fechado algumas parcerias, realmente pensando nessa questão. Lá no Mato Grosso do Sul tenho trabalhado em um projeto de reflorestamento de madeira, incentivando o uso de energia solar também. Temos que falar desse cuidado com o campo, da harmonia entre o agro e a preservação.
Você, como bom sanfoneiro, curte essa mistura cada vez mais comum de sertanejo com forró?
Aos meus 9 anos ganhei a primeira sanfona. É a minha grande paixão, um instrumento que eu amo. Tive uma influência grande dos acordeonistas da região Sul, do Centro-Oeste e do Nordeste. Cada um tem um estilo, um jeito de tocar, e eu sempre gostei muito de misturar. Gosto da mistura do forró, do sertanejo, do axé, do vaneirão, da música gaúcha. Onde tem sanfona, tem alegria.
Sendo um artista que já se apresentou nos mais diversos palcos do planeta e tem amizade com músicos de todos os gêneros e estilos, você consegue enxergar uma fusão maior entre a música sertaneja, o funk e o rock?
O sertanejo já faz essas misturas, existem muitas vertentes. Tem a música de festa, a música caipira, a sofrência: são muitas portas que o sertanejo abre. Já tivemos a mistura com o rock, inclusive, essa influência aconteceu lá atrás com Leo Canhoto e Robertinho, quando a música sertaneja não tinha bateria e baixo, e eles inovaram. A turma do sertanejo sempre esteve muito ligada com tudo o que está acontecendo.
E você se incomoda com a crítica musical, que insiste em colocar a música sertaneja como um gênero comercial e esteticamente pobre? Como você rebate esse estigma?
A música sertaneja tem origem no campo, em uma vida simples. E você conseguir cantar o simples e alcançar o coração das pessoas é muito difícil e especial. Essa é mágica que a música sertaneja tem. Dentro do gênero existem grandes instrumentistas que se dedicam a canções simples, mas muito elaboradas musicalmente. Uma simplicidade sofisticada. O sertanejo é um estilo que está no sangue, na veia, na raiz do povo brasileiro. E eu não me incomodo com as críticas, porque acredito que muitas das pessoas que falam isso apenas não conhecem o estilo. Se olharem com carinho, vão encontrar muita coisa maravilhosa dentro do universo sertanejo e vão se encantar também.
E como foi a sua vida durante o período de quarentena e de pandemia? Em tempos de coronavírus, a última coisa que a gente podia cantar era “Ai se eu te pego” ou “assim você me mata”…
Exatamente! [risos] Logo que surgiu a notícia da chegada do vírus aqui no Brasil, fui um dos primeiros a cancelar as apresentações marcadas. A gente se trancou em casa. Ficamos muito assustados por causa dos nossos pais e dos nossos filhos. A partir daí, as lives foram uma maneira de a gente se conectar com o público. Também gravei um álbum intimista que, com certeza, se não fosse a pandemia, eu não gravaria. E o lado bom para mim – um cara que viajou muito e esteve ausente por muito tempo – foi ter tido a oportunidade de conviver mais com meus filhos, de estar mais com eles e com a Thais. Foi muito especial.
Ficou bem bacana o álbum “Para Ouvir no Fone”, com faixas intimistas, apropriadas para este momento de introspecção e reflexão. E agora que esse pesadelo de pandemia parece estar perto do fim, para onde você vai?
Fico feliz que você gostou. Esse projeto foi bem diferente e o resultado me agradou demais. A música nos proporciona isso: tem canção para todos os momentos. Na hora da festa você coloca “Humilde Residência”; já quando estiver viajando ou reflexivo, querendo ficar de boa, você pode escutar esse álbum. Eu gosto disso. E gosto também dos meus projetos na TV. No ano que vem, a ideia é voltar com o projeto de teatro musical “Bem Sertanejo”, e retornar com os shows já no Carnaval. Ainda tenho outros projetos em andamento, que são diferentes de tudo que eu já fiz. Se tudo o que eu tiver em mente acontecer, será um ano de muito trabalho.
Mudando de assunto, como foi trabalhar nessa nova configuração do “The Voice Brasil”, como um jurado diferenciado?
Eu tive a alegria de ser o quinto técnico, com uma cadeira especial e uma função diferente para mim. Passei metade do programa só assistindo e montando um time com vozes que estariam indo embora da competição. Tive essa alegria de dar uma segunda oportunidade. Montei um time muito forte e fiquei feliz demais com esse formato. É um programa de que gosto muito, que é potente em entreter as pessoas de casa, além de trazer oportunidades para artistas incríveis que o nosso país precisa conhecer.
E no “The Voice Kids”, o que mais te agrada e o que mais te surpreende nesse incrível show de calouros infantis?
Eu me encantei completamente e sou apaixonado pelo The Voice Kids. Como aquelas crianças são talentosas! E é muito especial vê-las cantando ao vivo. A vibe delas é de alegria, sem pretensão ou responsabilidade, e isso é muito legal porque deixa o programa leve.
Por falar em kids, o seu filho Teodoro ou a sua filha Melinda já estão tendo aulas de acordeão?
Aqui em casa a sanfona está sempre à disposição, tem uma bateria pequena na sala que até eu toco as vezes, tem violão e saxofone, e tudo quanto é instrumento espalhado pela casa, para eles curtirem e aprenderem. A gente conduz isso de uma maneira natural, os deixamos livres porque são pequenos, mas os dois passam o dia cantando. Os dois nasceram com muita facilidade artística, até porque a mãe deles também é uma grande artista, isso está no DNA. Eles terão todo nosso apoio e o nosso incentivo para o que quiserem ser. Mas a música, com certeza, estará presente na vida deles.
Por fim, agora em janeiro você completa 41 anos e, apesar de ainda bem jovem, já atingiu bilhões de pessoas com a sua arte e conquistou muitos prêmios e reconhecimentos. Está pensando em desacelerar?
Eu comecei muito cedo, cantando profissionalmente com 12 anos, tocando baile. Então, dos 12 até os 40 eu abdiquei praticamente de todos os finais de semana da minha vida para estar na estrada, trabalhando. Quando as crianças nasceram eu comecei a controlar a agenda. Ter a minha família sempre foi o meu maior sonho e passei a organizar melhor o tempo. Também limitei a quantidade de shows para poder tocar outros projetos, como o “The Voice” e os outros trabalhos na TV. Aprendi que, planejando, dá para fazer tudo de uma maneira tranquila. O importante é dar prioridade ao que merece ter, e saber escolher melhor. Não pretendo desacelerar, mas organizar melhor para poder fazer tudo o que eu gosto e estar em família também. Achar esse equilíbrio é sempre o grande desafio.
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