Criadora de marca de ovos plant based, Amanda Pinto, expande portfólio e aproveita momento favorável de aposta global nesses produtos
Alternativas às proteínas animais estão em um momento de grande ascensão e expansão. Puxados por consumidores “flexitarianos” – aqueles que não são veganos ou vegetarianos, mas que apostam na redução da alimentação à base de carne –, produtos “plant based” encontram terreno fértil no Brasil, assim como em diversos países. De acordo com The Good Food Institute Brasil, o ano de 2021 foi de investimento recorde no ecossistema dessas empresas.
Nesse setor estão incluídas não apenas marcas de proteína vegetal, mas também as de carne cultivada e de fermentação – aquelas desenvolvidas em laboratórios, por meio de uma tecnologia chamada “cultivo celular”, e as opções que são feitas a partir de microrganismos, como fungos e bactérias, respectivamente. Desde 2020, foram investidos quase US$ 11 bilhões – sendo US$ 8 bilhões (73%) após o início da pandemia e a consequente disrupção dos mercados globais.
Bem recebidas pelo público, as empresas de carne, frutos do mar, ovos e laticínios vegetais receberam US$ 1,9 bilhão em investimentos em 2021, quase três vezes os US$ 693 milhões arrecadados em 2019. A startup brasileira N.ovo, com escritório em São Paulo e fábricas espalhadas pelo país, está inserida nesse mercado e amplia gradualmente seu portfólio desde sua criação, em 2019. “Hoje vemos novos players, uma maior concorrência, os brasileiros estão receptivos ao plant based, graças à comunicação amigável que aplicamos para uma maior conscientização entre as pessoas. Não estamos mais falando de produtos para um nicho, mas, sim, para todos”, afirma Amanda Pinto, fundadora e head do business da empresa.
A N.ovo oferece treze produtos: a N.ovo Receitas, um substituto vegetal para ovos, em pó, para aplicação em receitas, como bolo e massas; o N.ovo Mexido, que é uma alternativa vegetal para ovos mexidos e omeletes; a linha de maioneses veganas e a linha de frangos vegetais – feitos à base de ervilha e fibra de broto de bambu, apresentados em forma de filé de peito à milanesa, empanadinhos (nuggets), coxinha, filé de peito e cubinhos, que replicam as características do produto animal. “Pensar alternativas ao consumo de carne e derivados é um assunto de todos! É insustentável alimentar quase 8 bilhões de pessoas da forma como se faz hoje em larga escala, com a destinação da maior parte dos grãos para animais.”
A empreendedora criou a startup enquanto trabalhava na empresa da família como gerente de inovação e marketing, e lançou no mercado ovos veganos em pó. Amanda é filha de Leandro Pinto, presidente do Grupo Mantiqueira. “Claro que no início não foi fácil falar disso dentro do grupo, que é líder no segmento da avicultura na América do Sul. Mas a empresa entendeu a proposta de produzir alimentos à base de plantas, que já se apresentava como uma tendência global.”
Gôndolas brasileiras
O mercado brasileiro de proteínas alternativas conta atualmente com cerca de 100 empresas e exporta produtos para mais de 25 países. O primeiro hambúrguer vegetal do Brasil foi lançado pela startup Fazenda Futuro, que iniciou suas atividades em maio de 2019. Rapidamente o setor também acolheu os grandes players, como as gigantes da alimentação nacional Marfrig (Plant Plus), a JBS (linha Incrível Seara) e a BRF (Sadia Veg & Tal), que aumentaram seu portfólio com produtos à base de proteínas vegetais.
Segundo dados da agência Euromonitor, nos últimos cinco anos o Brasil registrou um crescimento anual de 11% nas vendas de produtos substitutos da carne animal. Para 2025, a projeção é atingir US$ 131,8 milhões (R$ 666,5 milhões). “Para criar a N.ovo, viajei ao Vale do Silício para colher referências, já era perceptível que as gigantes do setor de alimentos nos
Estados Unidos começavam a investir em plantbased para não perder fatia de mercado”, lembra Amanda.
Por suas pesquisas para chegar às fórmulas dos produtos, a empresária entrou na lista dos 35 principais inovadores da América Latina com menos de 35 anos, pelo Instituto de Tecnolo
gia de Massachusetts (MIT). “Foi uma honra, o Brasil é um grande exportador de proteínas animais e acredito que também se tornará um exportador de proteínas alternativas”, diz ela.
Ainda de acordo com a The Good Food Institute, 50% da população do país afirma já ter diminuído o consumo de carne em 2020, um crescimento de 73% em relação a 2018, quando
a população de flexitarianos era de 29%. A saúde é o principal motivador para essa mudança de comportamento entre os brasileiros.
Além da conquista de hábitos mais saudáveis, a sustentabilidade é outro fator que se destaca. Um estudo realizado pela Beyond Meat em parceria com a Universidade de Michigan mostra que, em comparação à produção de um bife animal, a carne vegetal emite 90% menos gases de efeito estufa e usa até 99% menos água, 93% menos terra e 46% menos energia.
Mas, apesar da demanda promissora, a oferta de produtos plant based enfrenta desafios tecnológicos no Brasil. Em uma pesquisa feita em 2021 com 21 empresas do setor de alimentos feitos de plantas, foram apontados sete temas cruciais para o desenvolvimento do setor. Entre eles, 84% das empresas afirmaram que sentem falta de mais matérias primas nacionais. “Usamos ainda tecnologia estrangeira e grande parte da nossa equipe, neste ano com 25 pessoas, agora está focada em inovação.”
Uma das barreiras, exemplifica Amanda, é que o Brasil não tem tecnologia de processamento dos ingredientes. Como a soja, que é plantada aqui, exportada, mas retorna processada para servir de matéria-prima para a indústria de alimentos. “A nossa meta é entrar na briga e alcançar todo mundo, uma vez que basta as pessoas experimentarem os produtos plant based para aderir. Com tecnologia brasileira, isso acontecerá.”
Tendências do setor
Com as gôndolas mais repletas de opções de origem vegetal, algumas lacunas tendem a ser preenchidas nos próximos anos. O The Good Food Institute identifica que o desenvolvimento
de produtos para lanches rápidos, como coxinha e empadinhas, estão em alta a curto prazo, além de opções de produtos com preços acessíveis e competitivos. Há ainda a abertura para “smart products”, ou seja, produtos com mais de uma funcionalidade, como pasta de leite de castanha da marca Nice Foods, que vira leite, creme culinário e pode ser usado em receitas.
Há ainda, segundo pesquisa realizada pelo BHB Foods e Suplementos, plataforma da consultoria Equilibrium Latam, e pela Decode, braço de inteligência de dados do grupo BTG Pactual, uma procura crescente por alimentos clean label – que significa “rótulo limpo”, ou seja, produtos com menos ingredientes, sem aditivos como corantes e conservantes –, além de uma maior preferência pela proteína como ingrediente e o uso de suplementos. Tudo tende a se agregar cada vez mais ao plant based.
“Acredito que as mudanças estão acontecendo porque somos empáticos à potência do agronegócio. Vim de uma família que está no setor há gerações, até brinco que a minha primeira palavra foi ovo (risos)! Reconheço o trabalho daqueles que levantam cedo todos os dias para que a comida chegue ao prato!”, reflete a empresária. “Por essa aproximação toda, por eu ter crescido na Granja Mantiqueira (em Itanhandu, MG), vejo que vamos conseguir equilibrar e diversificar a indústria alimentícia com diálogo e inovação, agregando todos”, finaliza.
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