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William Kamkwamba tem uma história que já rendeu filme e livro, e agora inspira empresários brasileiros na HSM

por | nov 1, 2019 | Pessoas & Ideias | 0 Comentários

São Paulo é o palco da 19ª edição da HSM EXPO este mês. Durante os dias 4, 5 e 6 de novembro, o evento acontece na Transamérica Expo Center com o tema “Ouse Aprender”, expondo para o público os principais cases, conceitos e técnicas que permeiam o mundo corporativo, além de permitir o diálogo das principais tendências internacionais e os negócios brasileiros.

Entre os palestrantes deste ano estão a empresária grega Arianna Huffington, que discute como a comunicação tem se transformado ao longo dos anos. Fundadora do portal The Huffington Post, criado em 2005, ela vendeu, em 2011, o site para a gigante AOL por US$ 315 milhões. Yuval Noah Harari, professor israelense de história e escritor, conhecido pelo best-seller “Sapiens: uma breve história da humanidade”, também fala ao público.

Harari será um dos palestrantes na HSM

Ambos serão palestrantes na HSM

Acima, o escritor israelense Yuval Noah Harari e a empresária Arianna Huffington

Seu livro discorre sobre como a criatividade e a vulnerabilidade são resultados de revoluções que nos levaram ao lugar onde estamos hoje. Saímos das savanas, deixamos o instinto biológico e criamos conceitos que nos mantêm unidos socialmente. Demos valor subjetivo para as tecnologias e, apesar de não sermos tão diferentes de outros primatas, povoamos o planeta inteiro devido a esse processo evolutivo e revolucionário. Para Yuval, hoje já temos a capacidade de mapear células e trilhões de outros planetas, tendo acesso a um enorme conhecimento, mas permanecemos insignificantes diante do universo. A conclusão, talvez, seja que ainda há muito a aprender para continuarmos escrevendo nossas histórias. E tentar é sempre o primeiro passo.

A capa de novembro da 29HORAS traz o perfil de outro palestrante da HSM Expo de 2019, que parece ter experienciado bem o que diz esse best-seller – sabe o que é ser criativo e estar vulnerável. Do Malawi, no sudeste do continente africano, William Kamkwamba conversou com a reportagem por email, contando a sua jornada inspiradora. “Eu tentei e consegui!”, afirma modesta e espontaneamente o engenheiro e escritor de 32 anos.

William Kamkwamba. Foto: Myles Standish

William foi o responsável por trazer, pela primeira vez, energia elétrica e irrigação para sua comunidade, em Wimbe, quando tinha apenas 19 anos e construiu um moinho de vento. Sua região vive da agricultura e a família tirava da terra o sustento. Porém, em períodos de seca, cada vez mais extensos devido aos desmatamentos, toda a comunidade de agricultores sofria com a baixa nas colheitas.

“Para mim, se trata de fazer o trabalho e encontrar uma solução onde for necessário”, resume de forma pragmática William, recusando qualquer adjetivo sobre ser inovador. Mas a inventividade já está em sua história. Em 2000, o Malawi passou por uma forte seca, causando a morte de mais de 10 mil pessoas. “Tivemos que cavar o solo para achar raízes e cascas de banana, qualquer coisa para forrar o estômago”, recorda. A anuidade da escola onde William estudava era de US$ 80 e, por causa da situação, seu pai não conseguia pagar. “Tive que parar de estudar com 14 anos”, lembra. Assim, era necessário encontrar uma solução rápida e inovadora diante do enorme obstáculo.

Revolução criativa

William, então, começou a estudar sozinho na biblioteca da escola. “Uma das partes mais difíceis foi fazer a lição de matemática, porque não havia como saber se minha resposta estava correta. Com a matemática, você não sabe onde errou ou o que deve mudar ao fazer isso sozinho”. Mas, mesmo assim, parece que ele estava no caminho certo.

Encontrou um livro de física avançada para sua idade, “Using energy”, que explicava conceitos de geração de energia através do vento. Vendo sua família e comunidade sofrer com a fome, percebeu que podia irrigar as plantações, independentemente da época do ano, se tivesse energia para bombear a água. “Poderíamos aumentar a colheita e nós nunca mais passaríamos fome! Não tinha instruções, mas sabia que haviam construído antes, então eu podia tentar também”.

E conseguiu. Com a ajuda de seu amigo Gilbert e de seu primo Geoffrey, ele começou a procurar as ferramentas para a construção do moinho em um ferro-velho da região. “As pessoas duvidavam, achavam que estávamos loucos carregando os ferros achados no lixo”, lembra. Com pedaços de uma bicicleta, um dínamo, fios e bateria de carro eles passaram a gerar energia pela primeira vez na comunidade.

Moinho de vento de William em Wimbe, no Malawi

O feito de William era quase inédito por ali. Em 2009, na África Subsaariana, onde se localiza o Malawi, mais de 90% das pessoas não tinham acesso à eletricidade e usavam lenha para cozinhar e se aquecer. A história surpreendente virou livro e um longa da Netflix, lançado este ano – “O Menino que Descobriu o Vento”. “Talvez o filme possa inspirar algumas pessoas que ouvem minha história a fazer algo semelhante em suas próprias vidas”, diz.

Uma vida que é um filme

Depois da construção do moinho de vento, William ficou conhecido no Malawi, deu uma conferência no TED Talk e concluiu seus estudos na African Leadership Academy, na África do Sul. Em 2014, recebeu um diploma de Bacharel em Estudos Ambientais do Dartmouth College, em New Hampshire, nos Estados Unidos, onde foi eleito para a Sphinx Senior Honor Society, uma organização de jovens líderes em diferentes áreas de estudos. “Eu tento fazer de cada dia uma jornada especial”, resume.

Hoje, o engenheiro arrecada fundos para construir um centro de inovação em Kasungu, no Malawi, com sua organização sem fins lucrativos, a Moving Windmills Project. “O Centro de Inovação Moving Windmills vai estimular o espírito de inovação em jovens e agricultores. Nosso modelo enfatiza o envolvimento, a ação participativa e o design centrado no ser humano, para criar ferramentas que mudem vidas, aliviem as cargas de trabalho e tragam maior segurança alimentar e liberdade econômica nas nossas comunidades”.

Do Malawi para o mundo

William frisa a importância de dar espaço e condições de aprendizado às novas gerações. “Assim, os jovens têm orientação, estímulo e as ferramentas para criar soluções transformadoras”. Mesmo depois de tantos feitos, ele não descansa. Os planos são muitos. “Quando eu era criança, meu maior sonho era ser engenheiro, queria trabalhar com grandes máquinas, queria saber como consertar e manter as coisas”. Depois de construir o Centro de Inovações em seu país, o menino que descobriu o vento prossegue sonhando: “Gostaria de aprender a pilotar aviões”.

O ator Maxwell Simba em cena do filme “O Menino que Descobriu o Vento”, da Netflix

O evento da HSM traz a chance de conhecer de perto William Kamkwamba, com toda a sua sensibilidade e inteligência. Comentando as convergências entre a história brasileira e a de países africanos, o engenheiro crê que o respeito pode ajudar a superar as injustiças sociais e econômicas. “Elas ainda são presentes, são reflexos de momentos históricos de exploração e preconceito. Mas você não pode pensar que alguém é menor do que você por causa da cor da pele, de sua nacionalidade ou de sua origem social. Um ser humano é um ser humano”, afirma.

As raízes são motivo de inspiração. Assim como para muitos brasileiros, seu país de origem significa amor às artes e às pessoas. “Para mim, ser um malauiano é tudo sobre cultura, música, pessoas, paisagem. Estamos lutando contra as dificuldades, mas geralmente somos felizes e gentis. Em todas as sociedades, você sempre pode encontrar algo que gostaria de mudar. Eu tenho muito orgulho de ser do Malawi”.

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