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Aos 89 anos, Nathalia Timberg estreia monólogo homenageando a designer Iris Apfel, de 97

por | dez 27, 2018 | Pessoas & Ideias | 0 Comentários

Tanto quanto talento e gentileza, Nathalia Timberg esbanja vitalidade. Basta dizer que, depois de uma temporada bem-sucedida no Rio, no dia 12 de janeiro a atriz carioca chega a São Paulo, no teatro Faap, com o monólogo “Através da Iris”, de Cacau Hygino, em que interpreta a designer americana Iris Apfel. Em seguida, leva o espetáculo para outras cidades. Já escalada para a próxima novela das 21h e uma minissérie da Globo, também anda estudando dois novos personagens para o teatro. Resultado: está com a agenda cheia até 2021 e nem pensa em aposentadoria. Nada mal para quem comemora 90 anos neste 2019. De onde vem, afinal, tanta energia?

— Ah… deve ser genética — desconversa ela, nessa entrevista exclusiva à Revista 29HORAS. — Minha mãe era muito ativa, meu pai também. Minha avó, por exemplo, foi sozinha para o Japão quando tinha 80 anos. Todos da família eram muito ativos. Quem se mantém ativo chega melhor a qualquer idade.

Genética tem a ver, OK, mas também há algo ali nos olhinhos da atriz que deixa clara a gigante paixão pelo seu trabalho – e isso é vital. Essa atividade frenética, aliás, é constante também na vida de Iris Apfel – que, aos 97 anos de idade, não sossega e continua sendo uma referência no mundo da moda. É tentador traçar paralelos entre Nathalia e Iris. Seriam almas gêmeas?

— Eu trabalho muito, e a Iris também. Esse é um ponto de coincidência. Também temos muita liberdade na maneira de ser e de pensar. Mas ela é um ícone da moda, apesar de não ser estilista, enquanto sou low profile, bem o oposto na maneira de me apresentar.

E que parem por aí essas associações. Nathalia prefere não traçar paralelos com suas personagens, de quem procura manter um distanciamento saudável.

— Não tenho o hábito de fazer essas comparações. Pelo contrário, eu procuro esquecer de mim mesma ao máximo. Porque estou fazendo um personagem, não estou misturando. Eu sou intérprete.

Ela sabe do que está falando. Com apenas seis anos já estava experimentando a arte da interpretação, graças a um convite para participar do filme “O grito da mocidade”, de Raul Roulien, que só chegou às telas em 1937. Não restaram registros da estreia precoce da pequena Nathalia, mas a menina não parou. Sua vida de atriz amadora foi ocupando os espaços da vida real, e tudo se tornou uma coisa só.

A criança talentosa cresceu entre grupos teatrais e, no início da vida adulta, conseguiu vencer a resistência da família, ganhou uma bolsa do governo francês e foi estudar em Paris. Queria uma formação mais sólida para reafirmar “seu papel no mundo”, e foi justamente isso o que encontrou, além de reforçar sua cultura geral preciosa, que já vinha de berço. A propósito, um registro: ela fala sete idiomas.

Em 1954, aos 25 anos, voltou para o Rio e logo ganhou seu primeiro papel profissional. Encarnou Eduarda na primeira montagem de “Senhora dos Afogados”, de Nelson Rodrigues, então dirigida por Bibi Ferreira – desde então, sua grande amiga. Na estreia da peça, com o Theatro Municipal lotado, o autor recebeu uma vaia  histórica da plateia em fúria. Seu texto, afinal, tão ao estilo evidentemente rodrigueano, era demasiado chocante para os padrões conservadores da década de 1950 (e até hoje, talvez).

Mas nada abalou Nathalia. Sabendo o que queria, seguiu em frente e não parou mais. É workaholic assumidíssima, com muito orgulho, com muito amor. Fez de tudo desde então, dividindo a cena com grandes nomes do teatro brasileiro. É tanta gente boa povoando seu panteão que ela prefere não falar quais são seus heróis. Tem medo de esquecer alguém, e isso seria uma indelicadeza, o que não condiz com Nathalia.

— É injusto lembrar de uns e não de outros. Nós somos uma soma. Não tenho uma única formação; tive uma formação aqui, com diretores e colegas maravilhosos dentro da minha área, uma formação eclética, assim como em Paris.

A consciência sobre o trabalho do ator é uma das suas qualidades mais sensíveis. Outra é sua consciência política. Preocupada com os rumos da formação geral das nossas crianças, Nathalia diz que parece que já vivemos tempos mais civilizados que os atuais. Será que há uma receita contra esse retrocesso?

— Taí uma palavra com a qual eu não concordo e que todo mundo procura para tudo. É essa tal de receita. Não há receita. Acho que o que está havendo é uma formação malfeita, porque cada vez pior. A formação está sendo sucateada, e o resultado é muito triste. Quanto mais nos afastamos da formação humanística, mais difícil é encontrar um lugar para viver condizente com as conquistas a que já tivemos acesso.

E por aí vai Nathalia, bastante crítica em relação ao que tem visto no nosso dia a dia, reforçando que ainda há muito a ser feito. A propósito, uma pergunta fica no ar: depois de tantos anos de estrada, o que a atriz ainda sente falta de fazer no palco? A resposta é imediata: Tudo!

Ou seja, Nathalia não vai sossegar tão cedo. Até porque, como diz Iris Apfel, “enquanto a gente estiver na vertical, está tudo bem”.

Sorte a nossa.

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