O Alentejo é destino para quem busca por um enoturismo autêntico com rótulos familiares e variados, acompanhados de atrações históricas e paisagens bucólicas
Portugal tem “apenas” 92 mil quilômetros quadrados, o que significa que seu território caberia 90 vezes dentro do Brasil. Mas seus rios, mares, vinhas, estradas, construções históricas e deliciosos pratos revelam uma interessante diversidade que transcende generalizações e expectativas. Entre as descobertas está o Alentejo, ao sudeste do país – uma região vibrante conhecida pela produção de vinhos e pela gastronomia que preserva a autenticidade nacional.
No centro do Alentejo se situa Évora, a duas horas de carro de Lisboa. Apesar de ser a principal cidade do centro-sul português, o lugar respira ares medievais e reúne muitas atrações históricas, e garante opções mais diversificadas de hospedagem. A área central do município – cercada por uma muralha – é Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco e conta com museus, jardins, restaurantes e lojinhas.

Vinícola Fita Preta – foto divulgação
Por ali, está a Capela dos Ossos, construída no século 17, com paredes e pilares revestidos de milhares de ossos e crânios humanos que, à primeira vista, podem causar estranheza, mas materializam a mensagem franciscana muito em voga à época sobre a transitoriedade da vida. A visita sai pelo valor de 6 euros por pessoa.
Nas proximidades, destaque para o Jardim Público de Évora, que convida para um agradável passeio entre vegetação, majestosos pavões e mais monumentos, como os restos da Muralha Medieval, do século 14, o Palácio de D. Manuel, do século 16, e as Ruínas Fingidas, do século 19 – que possuem esse bem humorado nome por não serem originais do local. Ao adentrar as ruelas centrais, avista-se ainda a majestosa Catedral de Évora, de estilo neogótico, e o Templo Romano – construído incrivelmente na primeira metade do século 1, que evidencia a expansão do Império no período e a enorme riqueza histórica e cultural do Alentejo.

Palácio do D. Manuel, em Évora – foto iStockphoto
Os solos da região parecem mesmo absorver não apenas as influências do clima e da fauna e flora, mas também toda a história que atravessou essas terras. Representativa de como o passado e o presente se misturam, a técnica de fermentar o vinho em talhas de barro existe até hoje em vinícolas e nas casas de algumas famílias locais – que fazem vinhos sem intervenção e perpetuam a tradição de séculos distantes.
E, ao passar do tempo e diante da enorme produção vínica – são mais de 40 tipos de uvas plantadas na região –, em 1988 regulamentaram-se as primeiras denominações de origem alentejanas e foi criada a Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), que garante a certificação aos vinhos. Em Évora, a sede da comissão é também um importante ponto de informações aos viajantes.
Para experimentar alguns desses rótulos na cidade, o discreto restaurante Lombardo enfatiza uma cozinha moderna e descontraída ao mesmo tempo que valoriza ingredientes regionais. Os jovens chefs João Miguel Lombardo e Carolina Bravo surpreendem com pratos como Vieiras com Crumble de Legumes e puré de batata doce e o Tornedó de Vitela, que acompanham muito bem taças da vinícola Bojador – como de seu espumante, que é fresco, mineral e ainda assim marcante.

Restaurante Lombardo – foto divulgação
No centrinho de Évora há também a Enoteca Cartuxa, que conta com um ambiente informal de uma taberna com ares contemporâneos. No lugar, é possível encontrar rótulos do vinho Pera Manca – encorpado e complexo, com aromas de passas, frutas escuras e toque de madeiras nobres, que é um ícone local.
Vinhedos na paisagem
É indispensável programar passeios por vinícolas no Alentejo, onde se agendam degustações ou refeições para harmonizar com os rótulos, passeando entre os diferentes estilos de uvas que variam de norte a sul. Évora está mais ao centro do Alentejo e, a 40 minutos de carro ao norte, chega-se a Entremoz. Conhecida por suas casas brancas e principalmente pelas jazidas de mármore branco, a cidade tem como um verdadeiro ponto turístico a primeira vinícola de João Portugal Ramos que, antes de fazer seus próprios vinhos, foi enólogo nas principais regiões vitivinícolas de Portugal.

Vinhos de talha da Carturxa – foto divulgação
Projetada respeitando as linhas da arquitetura tradicional alentejana, a Adega Vila Santa, construída em 1997 e posteriormente aumentada em 2000 e em 2017, é hoje a sede do Grupo João Portugal Ramos e produz 4 milhões de garrafas ao ano. Por ali, os visitantes podem reservar visitas a adega e caves, além de almoçar no agradável restaurante local, que mais se assemelha à sala de uma acolhedora e espaçosa casa familiar.
Pelo valor de 65 euros por pessoa, degusta-se entrada, prato principal e sobremesa, que são harmonizados com os vinhos. No menu, destaque para os lombinhos de porco preto – muito consumidos na região – acompanhados com feijão à moda da adega e salada. As reservas devem ser feitas pelo site
www.jportugalramos.com
Outro nome respeitado e consolidado na história dos vinhos alentejanos é António Maçanita. No alto Alentejo, a 10 km de Évora, a Herdade Fita Preta materializa o espírito explorador do fundador. Em uma área de 100 hectares e com uma construção do século 14 – uma das edificações mais antigas da região –, a adega funde modernidade e tradição, em um projeto que propõe um diálogo entre um palácio medieval e a arquitetura contemporânea. Apenas a visita ao local já vale a viagem!

Restaurante na capela da propriedade de Antonio Maçanita – foto divulgação
Mas é irresistível conhecer esse lugar histórico e provar seus vinhos. Lá, são oferecidos diferentes tipos de experiências, em que enólogos apresentam a história da marca, os processos de vinificação e o valor histórico e patrimonial do local – acompanhados de snacks, queijos e prova de ao menos três vinhos. Os valores começam em 30 euros por pessoa e as reservas podem ser realizadas no site www.antoniomacanita.com.
Neste ano, a Fita Preta deve abrir ao público um restaurante dentro da antiga capela de sua construção histórica, que reservará jantares únicos com um menu degustação que fará uma releitura dos ingredientes do Alentejo com apresentação em nível de alta gastronomia internacional.
Modernidade na medida
No equilíbrio de respeitar o passado com a sabedoria de incorporar tecnologias necessárias, a recente Mainova produz apenas 140 mil garrafas por ano e apresenta 14 diferentes rótulos, em seus 15 anos de história. O lugar conta com maquinário novo e decoração contemporânea que reflete a personalidade da fundadora, Bárbara Monteiro – a filha mais nova de três irmãs, por isso o nome divertido de sua marca.

Jantar harmonizado na Mainova – foto divulgação
As primeiras referências da produção incluem seis variedades de vinho (tinto, branco e rosé) com três diferentes assinaturas – Mainova, Moinante e Milmat – e dois tipos de azeite extra-virgem – Clássico e Early Harvest. Em comum todos têm uma abordagem sustentável, com regimes de produção biológica e integrada, o que, no caso dos vinhos, resulta em pouca intervenção, baixos sulfurosos e maioritariamente veganos. E as garrafas são majoritariamente de vidro reciclado.
Entre as experiências oferecidas no local, vale apostar no piquenique à sombra de oliveiras com idades entre 600 e incríveis 2.400 anos. Há ainda opções de visita à adega com degustação de vinhos e azeites, com valores que começam em 40 euros por pessoa. Destaque também para a possibilidade de almoço ou jantar com assinatura do chef João Narigueta do restaurante Híbrido, de Évora, com a harmonização de ao menos cinco vinhos, pelo valor de 135 euros por pessoa. Os agendamentos devem ser feitos no site www.mainova.pt/
Já a Reynolds, no Monte da Figueira de Cima, é muito mais antiga, mas também segue atenta às tendências da produção sustentável de vinhos. De origem britânica e espanhola, a família Reynolds faz vinhos de qualidade no Alentejo desde 1850 e as principais variedades plantadas são as tradicionais da região: Trincadeira, Aragonez e Alicante Bouschet – essa última introduzida em Portugal pela própria família há mais de um século e meio. No local, cada variedade de uva é colhida à mão em pequenas quantidades, depois fermenta nas cubas por decantação, sem pisar, em um processo totalmente manual.

Barris de carvalho da vinícola Reynolds – foto divulgação
O vinho Gloria Reynolds, em homenagem à matriarca, apenas é produzido em anos de colheita excelente, e é oferecido exclusivamente aos clientes por meio do Clube de Sócios Gloria Reynolds. As visitas à adega podem ser reservadas pelo email wine@gloriareynolds.com.
Essa garrafa e tantas outras materializam o Alentejo, com tradição, história, clima e cultura diversas em elegante harmonia.

Degustação na Fita Preta – foto divulgação
Influências na taça
Os solos predominantes no Alentejo são de xisto, argila, mármore, granito e calcário. O sol forte e altas temperaturas no verão e frio seco no inverno possibilitam a produção de uvas excelentes, com uma combinação natural de maturidade e frescor.
Frutos alentejanos
Entre os vinhos brancos, a uva Antão Vaz é a maior aposta da região. Também se encontra com maior facilidade as castas nativas Arinto Fernão Pires e Roupeiro. Enquanto nas tintas, destacam-se Alicante Bouschet, Aragonês e Trincadeira.
Ponto de partida
É possível se hospedar em Évora e seguir para passeios em outras cidades na região em carros e vans. O Vila Galé Évora é uma alternativa e está a apenas 5 minutos do centro histórico do município, com diárias que começam em R$ 700.
Para comprar já
Manuel Chicau, fundador da importadora Adega Alentejana, destaca vinhos do Alentejo que estão disponíveis no Brasil:
• Redondo Single Block – R$ 76,09
• COM Premium – R$ 104
• Monte do Pintor – R$ 188
• Monte dos Cabaços – R$ 220
• Mouchão – R$ 700
• Azeite EA garrafa 500 ml – R$ 59
*A jornalista viajou a convite da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana
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