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CEO da Dengo, Estevan Sartoreli encabeça projeto de preservação de áreas remanescentes de Mata Atlântica
Estevan Sartoreli é quem comanda os trabalhos na Dengo, cobiçada por seus deliciosos chocolates bean to bar e admirada por seu bonito trabalho na remuneração justa aos pequenos agricultores e na preservação das florestas originais do sul da Bahia
Desde 2017 atuando como CEO da Dengo, o ituano Estevan Sartoreli encabeça um projeto que une prazer e propósito, saberes e sabores, tradição e inovação, brasilidade e sustentabilidade, ética e estética. A marca de chocolates é uma das mais apreciadas e admiradas do país. Faz a felicidade de quem está envolvido na sua produção e a de quem consome. E, de bônus, ainda ajuda na preservação de um dos últimos trechos remanescentes de Mata Atlântica nativa do país, no Sul da Bahia.
Na entrevista a seguir, o executivo de 40 anos que estudou na Universidade Federal de São Carlos e na Harvard Business School fala um pouco de seu trabalho, da evolução da marca e das pontes que ela constrói entre a mentalidade empresarial da Faria Lima e o conhecimento ancestral das comunidades que, há mais de um século, tiram seu sustento da cultura cacaueira nessa paradisíaca região. Local que já foi palco dos romances de Jorge Amado e que, agora, é o cenário de uma revolução agroindustrial com impactos positivos nas esferas econômica, social e ambiental.
Veja os principais trechos da conversa que Estevan teve com a 29HORAS.
Como um engenheiro industrial nascido em Itu foi parar no Sul da Bahia, comandando o novo Ciclo do Cacau?
Logo depois que me formei, fui trabalhar na Natura. Entrei lá como trainee em 2005 e fiquei praticamente dez anos. Foi um aprendizado muito grande, mas em 2014 resolvi sair, tirar um período sabático, para repensar o que queria para o meu próximo ciclo profissional. Queria um trabalho com propósito, estava encantado com as possibilidades das indústrias 2.5, que operam adotando várias práticas que em outros tempos eram exclusivas do Terceiro Setor. Abri então uma empresa de consultoria especializada em desenvolver projetos dessa área. E um dos meus primeiros trabalhos foi para o Instituto Arapyaú, que havia sido criado anos antes pelo Guilherme Leal, meu ex-chefe na Natura. Ele tinha uma casa de veraneio em Itacaré e criou esse instituto para melhorar a saúde, a educação e a qualidade de vida das pessoas que viviam ali entre Itacaré e Ilhéus. Fui lá para revigorar e reestruturar a economia cacaueira, arruinada em 1989 por causa de um fungo que infestou e matou boa parte das árvores em produção.
E foi desse projeto que nasceu a Dengo?
Sim. Inicialmente, nossa intenção era apenas criar uma fonte de renda para a população local, revitalizando o ciclo produtivo do cacau, com a introdução de técnicas de manejo para mitigar os efeitos do tal fungo conhecido como Vassoura de Bruxa e ensinando os agricultores a cultivar cacaus de qualidade superior. Fizemos tudo isso, mas a situação da população não mudou. Quem comprava os frutos ali ainda pagava um valor muito baixo, insuficiente para efetivamente melhorar a vida da comunidade. Foi então que decidimos nós mesmos nos tornarmos os compradores do cacau, criando uma cadeia mais justa, solidária e sustentável. Assim que surgiu a ideia de montar a Dengo. E eu fui o executivo encarregado de estruturar essa empresa, já que eu conhecia todas as potencialidades, os problemas e os desafios do negócio.
Como o modelo da Dengo beneficia os agricultores?
Quando começamos os trabalhos de revitalização do cacau na Bahia, em 2015-16, menos de dez pequenos produtores aderiram ao nosso projeto. Hoje temos mais de 200 agricultores. Damos capacitação para que eles produzam cacaus de qualidade superior e remuneramos de maneira transparente e justa essa qualidade. Pagamos um preço bem maior do que o pago por quem negocia cacau como commodity, na cotação internacional. Cada lote é avaliado individualmente, para seu real valor ser determinado a partir de critérios técnicos. Alguns produtores recebem 70% a mais, outros 160%. Em 2021, pagamos em média 91% a mais do que os preços estipulados nas bolsas de mercadorias! Nosso objetivo é gerar valor compartilhado.
Se a proposta é criar renda para as comunidades no Sul da Bahia, por que a fábrica é em São Paulo?
Produzimos chocolates bean to bar, cujo transporte requer refrigeração. É muito mais barato trazer toneladas de cacau em amêndoas da Bahia até São Paulo do que levar chocolates em contêineres refrigerados de São Paulo até o Rio, por exemplo. Pelo nosso planejamento inicial, a fábrica seria em São Paulo para ficar mais próxima dos mercados consumidores.
Somos uma empresa agroindustrial, apesar de não termos um centímetro de terras na Bahia. Toda a parte de produção de cacau fica a cargo dos nossos fornecedores, mais ou menos como em uma cooperativa. Se nós fossemos cultivar o nosso próprio cacau, não estaríamos gerando renda para os agricultores envolvidos no projeto. Essa é a nossa meta primordial. Existe um ditado na língua inglesa que prega: “Businessmen don’t make good beans, farmers do” (Executivos não produzem bons grãos. Quem faz isso são os fazendeiros). Queremos que cada um faça a sua parte da melhor maneira possível. Os agricultores cultivam o cacau, nós fazemos o chocolate!
E quem mais é beneficiado com essa marca de chocolates “do bem”?
Ele é bom para o planeta e para quem o consome. O cacau cultivado pelo método cabruca, típico do Sul da Bahia, é um sistema agroflorestal, que preserva a vegetação original da região. É a mata que fornece a sombra que o cacaueiro “gosta”. E os nossos chocolates bean to bar são feitos sem o uso de aditivos químicos e de gordura hidrogenada, presentes nos chocolates industrializados. Nosso chocolate, além de ser delicioso, é saudável, faz bem para quem o consome! Nenhum chocolate é verdadeiramente “do bem” se não for um bom chocolate e não for fabricado seguindo os princípios da sustentabilidade.
A Dengo dá lucro?
As lojas já operam no positivo, mas, no geral, a empresa ainda não atingiu o break even. Pelo nosso planejamento inicial, essa meta seria atingida no nosso 5º ano de vida, ou seja, agora, pois começamos em 2017. Mas, como tivemos a pandemia, adiamos isso para 2023 e, pelo andar das coisas, acredito que não teremos problemas. Hoje estamos com 30 lojas, e devemos fechar o ano com 33 o que já é um número superior ao que imaginávamos no início. Está tudo indo muito bem. Um negócio de impacto social precisa ser autossustentável. Não é à toa que a palavra ‘negócio’ vem antes das outras! É o lucro que oxigena e garante a continuidade da iniciativa. Como diz um amigo meu, “não dá para ser verde estando no vermelho”. É verdade, mas aqui o lucro não é o nosso único objetivo.
A megaloja da Faria Lima, conhecida como Fábrica de Dengo, é um sucesso estrondoso. Ela já virou uma atração turística da cidade, não?
A cada fim de semana, recebemos em média 4 mil visitantes! Desde a sua abertura, em novembro de 2020, ela funciona como um parque de diversões para crianças, adultos, chocólatras e pessoas que quiserem conhecer mais sobre a cultura cacaueira. Temos uma área de pâtisserie com delícias à base de chocolate, um balcão de customização de barras e um agradável restaurante de comida brasileira. É um espaço onde nossos clientes vivem experiências. Com quatro pavimentos, tem 1.500 m² dedicados ao universo chocolateiro.
Os chocolates da Dengo já foram premiados no exterior?
Nunca nos inscrevemos em nenhum concurso internacional. Não temos uma visão award-oriented. Mas já fomos muito bem avaliados em degustações às cegas promovidas por publicações respeitadas como a revista “Prazeres da Mesa” e o caderno “Paladar”.
A marca tem planos de internacionalização?
Neste momento, não temos. Mas aqui nada está fora de cogitação. Se aparecer uma boa oportunidade, ela será estudada com carinho. Ia ser bacana termos uma marca mostrando nos Estados Unidos ou na Europa que o Brasil não é apenas um grande produtor de cacau algo que nem todo mundo sabe lá fora mas é também um produtor de ótimos chocolates. Neste momento, a marca não pensa em internacionalização, mas está ampliando sua atuação nacionalmente.
Fale um pouco sobre a recém-lançada linha de chocolates amazônicos.
A Floresta Amazônica é um dos berços do cacau. Há cerca de 5,5 mil anos o fruto já se desenvolvia na Amazônia Equatoriana. Só depois ele foi levado ao México, onde os astecas criaram o chocolate. Nossa ideia, ao incorporar o cacau amazônico em nosso portfólio, é proporcionar aos nossos clientes a possibilidade de conhecer variedades de cacaus, de terroirs distintos e com notas sensoriais peculiares. Fomos convidados por um grupo de pequenos produtores do Pará, que queriam aderir ao nosso modelo de produção. Se tudo der certo, no futuro a Dengo terá também chocolates feitos com bons cacaus da Rondônia e do Espírito Santo. Nosso sonho é, um dia, estarmos presentes em todas as regiões produtoras do país.
Esse modelo da Dengo pode ser replicado para outras culturas?
Acredito que esse nosso modelo não é exclusivo para o cacau, não. No universo dos cafés especiais, várias empresas operam de forma semelhante há anos. Já fomos procurados por um grupo de produtores de macadâmia interessados em conhecer melhor o nosso sistema. Outro dia vieram também uns pequenos produtores de polpa de frutas e frutas secas querendo transformar esses produtos em algo com mais charme e maior valor agregado. Nós estamos sempre abertos para compartilhar as nossas experiências até para outras marcas de chocolate! Não temos a menor ilusão de que vamos mudar o mundo sozinhos. Queremos ver esse modelo replicado em todos os segmentos, no país todo. Quanto mais gente, melhor!
Por fim, como é trabalhar assim, com um pé na riqueza da Faria Lima e outro na pobreza do Sul da Bahia?
Isso é o que move uma pessoa que se envolve em um negócio de impacto social. Meus pés estão na Faria Lima, mas meu coração é cabruca. Somos uma ponte entre esses dois mundos tão distantes. Nosso objetivo é reduzir a desigualdade entre eles. Os produtores rurais do Sul da Bahia precisam ouvir algumas dicas importantes do pessoal do dinheiro, para que seus negócios se tornem mais eficientes. E os ‘farialimers’ também têm muito a aprender com a sabedoria ancestral dos agricultores, principalmente no que diz respeito a qualidade de vida e preservação ambiental.
No ano em que completa 40 anos de carreira, Nando Reis celebra os encontros e suas muitas parcerias na arte
O cantor e compositor Nando Reis se lança no metaverso e investe alto em parcerias com artistas da nova geração
Nando Reis não compõe todos os dias. Pelo contrário, a religiosidade do hábito dessacraliza seu processo. “O jeito como eu faço música não obedece a uma rotina. A vida me nutre, e é do tempo dela que nasce o que eu quero dizer”, explica. Nesses momentos fortuitos em que, esporadicamente, o tempo da vida e o tempo da arte se encontram, ele se mune de papel, caneta e um violão, se senta em meio ao silêncio absoluto de um quarto de hotel ou de uma sala de estar vazia, e deixa as palavras e melodias fluírem, naturalmente. “A calmaria é meu ritual. Gosto do silêncio porque ele me permite ser atravessado, exclusivamente, pelo ruído de minhas ideias.”
Parece curioso que um processo criativo tão solitário esteja nas gênesis de um artista de tantos encontros. Em quatro décadas de carreira, Nando compartilhou suas letras com vozes que não eram suas e viu seus acordes se multiplicarem entre o público quando divididos com outros artistas da imortalizada amizade com Cássia Eller, com quem viu nascer o “Segundo Sol” em 1997, ao match recente com os moderninhos Jão, Anavitória e Melim.
Para celebrar essa trajetória de colaborações, no dia 8 de outubro, Nando pisa com seu All Star no palco da novíssima casa de shows Qualistage, na Barra da Tijuca, para a estreia carioca da turnê “As suas, as minhas e as nossas”. Ao lado da roqueira Pitty, ele performa um repertório recheado de canções suas, dela, dos dois e de outras pessoas.
Sujeito low profile e pouco afeito às regras sociais da internet, Nando só se aventura no mundo digital se for para continuar promovendo esses encontros. Em agosto deste ano, lançou seu “Nandoverso”, espaço onde fãs de todo o mundo podem se encontrar, interagir e ter acesso a NFTs, shows, documentários e outros conteúdos produzidos para circularem, exclusivamente, no metaverso. Enquanto descobre esse novo mundo, também prepara, a papel e caneta, mais um álbum, com lançamento previsto para o segundo semestre de 2023. Se der tempo e há de dar, ainda planeja reservar “algumas horas de desincumbência” para torcer pelo Brasil na Copa do Mundo do Catar, em novembro.
Nesta entrevista para a 29HORAS, Nando Reis revive parcerias célebres, expõe os desafios da vida artística em tempos digitais, relembra seu tempo como jogador e colunista de futebol e medita sobre o futuro político do país. Confira os principais trechos dessa conversa a seguir:
Suas canções versam sobre os mais diversos assuntos, da beleza dos encontros à efemeridade da vida. Qual temática mais te inspira? O que move suas letras?
Engraçado, eu nunca me agarrei muito às temáticas. Não sei dizer sobre o que escrevo, a vida é tão múltipla que a cada dia me pede algo diferente. Gosto de falar sobre amor, encontros, desencontros, chegadas e partidas, e sobre todo o resto. Os assuntos são detalhes. Me interessa mais a forma como as coisas são ditas. É o desenho das palavras que me atrai, o invólucro do sentimento. A música é estimulante porque permite que embalemos nosso abstrato interior e o apresentemos ao mundo. E aí pouco importa o que foi dito, mas que está lá, vivo.
Como é um dia de composição na vida de Nando Reis? Como funciona o seu processo criativo? Algum exercício para manter a mente sempre em um turbilhão de ideias?
Eu não tenho exatamente um processo, o jeito como eu faço música não obedece a uma rotina. Acho que meu exercício diário é viver. Estar atento, absorver as coisas ao meu redor. A vida me nutre, e é do tempo dela que nasce o que quero dizer. Quando o momento chega, gosto de trabalhar com violão, papel e caneta, invariavelmente. Escrever manualmente me permite criar uma relação visual com a obra, além de me impedir de incorrer em um erro típico de quem se acostumou à lógica do computador. No papel, não fico tentado a apagar o que, à primeira vista, desagrada. Num processo de composição, nem sempre o que você substitui é melhor do que o que veio antes. E o que desagrada pode ser o que instiga.
E como é compor dessa maneira, livre, nos dias de hoje? Nesses tempos digitais, abarrotados de referências estéticas, remixes e hits do TikTok surgindo e desaparecendo em poucas horas, imagino que haja certa pressão sobre a arte…
O mundo digital tem essa coisa do imediatismo e da finitude. É um universo dispersivo, que nos rapta a atenção e os sentidos e nos faz perder tempo precioso com inutilidades. Eu não me dou muito com essa coisa volátil das redes sociais. Gosto de fazer discos, de apostar nas embalagens de ideias que duram. Na realidade, enquanto José Fernando Gomes dos Reis (minha pessoa física), só uso o Instagram e olhe lá. A questão é que para o artista Nando Reis toda essa lógica digital se tornou necessária. A internet é uma importante ferramenta de trabalho, que me ajuda a divulgar minhas mídias e mantê-las circulando. Então eu lido com ela. Lanço singles, faço o que o fluxo me pede. Mas do ponto de vista da composição, acho que nada muda. Minha vida está muito mais fora das telas e, enquanto for da vida que me saírem inspirações, minha arte seguirá na mesma essência.
Ainda assim, você tem mergulhado fundo no universo digital ultimamente. Em agosto deste ano, lançou o “Nandoverso”, seu próprio canal no metaverso. Quais são suas impressões sobre esse novo mundo? Você é ou pretende ser usuário assíduo do metaverso?
Por essa vertente específica do mundo digital, eu tenho me encontrado particularmente atraído. Essa ideia de existir um espaço virtual capaz de promover encontros muito me encanta. Através da “Nando Reis Wallet”, minha loja de NFTs, e do Nandoverso, tenho conseguido levar minha arte a pessoas de todo o mundo e aproximá-las ainda mais do que eu produzo. É uma sensação semelhante à de se estar distribuindo filipetas de divulgação de um show nas ruas de São Paulo, só que por dentro de uma tela de computador e com um alcance inestimavelmente maior. Em agosto, comemorei os 22 anos do meu álbum “Para Quando o Arco-Íris Encontrar o Pote de Ouro” com um show virtual e o lançamento do documentário “Cordas de Aço – Em Busca do Pote de Ouro” (dirigido por Raimo Benedetti e realizado pela Relicário Produções, que revive os bastidores da gravação do álbum), em um evento exclusivo no Nandoverso. Fãs de todos os cantos puderam acompanhar esses e outros conteúdos em primeira mão. Foi algo realmente fascinante! Mas, ainda não me considero um usuário do metaverso, estou mais para um agente em aprendizado.
E por falar em encontros, você é um artista de muitas parcerias. Da saudosa Cássia Eller aos jovens Jão, Anavitória e Melim, a coleção de “feats” é extensa e tem crescido ainda mais com seu projeto NandoHits, em que você apresenta regravações de grandes sucessos da carreira ao lado de artistas da nova geração. O que mais te atrai nessas trocas? O que significa dividir uma música com alguém?
Eu amo o inusitado. Novas interpretações me emocionam. Acho muito interessante observar como outros artistas, de outras gerações, outros estilos e outras referências conseguem reimaginar e ressignificar meu trabalho. Ver como a voz deles traz novos ângulos para as minhas letras e novos caminhos para as minhas melodias é algo que me rende muito aprendizado. Me unir a essas pessoas, além de me permitir alcançar públicos diversos que vão muito além do meu, é uma maneira de manter o que faço atualizado, fresco e sempre em movimento. Por mais que eu goste de compor sozinho, sou um cara apaixonado pelas trocas da vida. Nasci artista no meio de bandas, cresci vendo minhas letras ganharem vida na voz de outras pessoas. Acho que, no fim, o barato da arte é que ela deixa de ser só sua quando ganha o mundo.
Uma dessas parcerias, com Pitty, rendeu uma turnê duo especial, que tem rodado o país e agora em outubro passa pelo Rio de Janeiro. O que o público pode esperar desses shows? Como é trabalhar com Pitty?
Pitty tem uma voz autêntica e autônoma, não se amarra a nada que não seja sua crença na liberdade para o ser, na singularidade do suingue, no barato da universalidade. Esse gerúndio que criamos, o “Pittynando”, é uma simbiose do que construímos e acreditamos enquanto artistas. Eu a vi cantar uma versão de “Relicário” no programa ‘Saia Justa’ (GNT), e me emocionei muito com aquela presença fortíssima. Daí nasceu nosso primeiro “feat”, “Tiro no Coração” (2021) e, agora, essa turnê. Em um setlist com aproximadamente vinte músicas, cantamos composições minhas, dela e nossas, em versões que conectam nossos estilos e histórias. Tem sido lindo. Até o fim do ano, ainda passamos por Porto Alegre, Curitiba, Salvador, Belém… E no dia 8 de outubro, estaremos no palco do Qualistage, no Rio de Janeiro.
Ainda nessa onda de parcerias, recentemente você se reuniu em São Paulo com Peter Buck, Barrett Martin, Alex Veley, Walter Villaça e Fernando Nunes, colegas de trabalho de longa data. Fizeram shows comemorativos na capital paulista e no Nandoverso, e agora estão gravando um novo álbum juntos. Depois de tanto tempo, muita coisa mudou no trabalho em conjunto? Ou se reencontrar é como se o tempo não tivesse passado?
Com a gente é sempre tudo igual e, ao mesmo tempo, sempre tudo diferente. Nós trabalhamos muito bem juntos, sempre saem frutos memoráveis. Foi assim nos anos 2000, quando gravamos “Para Quando o Arco-Íris Encontrar o Pote de Ouro”, álbum que me rendeu tantas recordações e conquistas profissionais, e desta vez não foi diferente. Igualmente frutífero. Tanto que nossa ideia era que esse reencontro gerasse uma ou duas músicas, e, no fim, acabamos com 15 canções gravadas e um álbum duplo em mente. O lançamento está previsto para o segundo semestre de 2023 e é uma celebração desse nosso quinteto.
Você também gosta muito de futebol, já escreveu músicas sobre o esporte… O que espera do Brasil na Copa, que está chegando?
Para falar a verdade, eu não espero nada. O futebol tem seguido uns caminhos estranhos, a camisa verde e amarela foi contaminada por um ideal ao qual sou avesso. Essa coisa toda de “patriotismo” a mim não diz nada. Hoje, vestir a camisa da seleção significa carregar simbolismos que vão além do futebol e que não me representam. Mas, falando sobre bola na rede, eu sigo torcendo. Sou louco por futebol, já joguei, inclusive. Também mantive, por anos, uma coluna sobre o esporte no jornal ‘Estado de São Paulo’. Isso sem falar da minha alma são paulina, hereditária, que me levou inúmeras vezes ao Estádio do Morumbi e me inspirou músicas que chegaram a virar trilha sonora de documentários sobre o clube. Acho que no futebol brasileiro eu ainda tenho esperanças. Há alguns meses, assisti a um jogo da seleção e me surpreendi com a qualidade técnica. Pode ser que tenhamos chance de comemorar vitórias no final do ano.
Falando em fim de ano e recomeços, no single “Espera a Primavera”, lançado no auge da pandemia, você versa sobre a vida, a diversidade, o amor, a mudança e o futuro. Para além da estação, o que Nando espera da primavera?
Nesta canção, a primavera é mais que as flores: é uma metáfora para “transformação”. A primavera de que falo representa a superação desse obscurantismo em que nos encontramos. Em vias de superação do vírus da Covid, ainda precisamos aniquilar o vírus da ignorância que ronda esse governo inepto e negacionista. Estamos vivendo um inverno enquanto nação, reduzidos a patriotismos e significados vazios. Não sei exatamente quando nossa primavera virá ou exatamente como ela se manifestará, mas sei que trará de volta as cores, a diversidade, a liberdade e a riqueza que é, de fato, o Brasil. Para o país e para nós, espero a liberdade. Um primeiro de janeiro que traga de volta quem somos.
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