Nabil Bonduki fala sobre a urgência de adaptar as cidades para as mudanças climáticas

Nabil Bonduki fala sobre a urgência de adaptar as cidades para as mudanças climáticas

Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), Nabil Bonduki foi relator do Plano Diretor e Secretário de Cultura de São Paulo. Na entrevista a seguir, ele reflete sobre o modelo urbano das cidades e a relação com os alagamentos, que também envolvem uma mobilidade focada no automóvel.

 

Nabil Bonduki - Foto Nelson Antoine

Nabil Bonduki – Foto Nelson Antoine

 

O que deve ser feito para evitar tragédias como a de São Sebastião, já que os eventos climáticos extremos serão cada vez mais comuns?
É essencial garantir que as cidades sejam mais permeáveis e arborizadas. As Áreas de Proteção Permanente (APP), faixas nas beiras dos córregos e rios, precisam ser protegidas e/ou recuperadas. As águas pluviais devem ser retidas nos lotes (e reutilizadas), antes de chegarem nos sistemas de drenagem, evitando os alagamentos. A impermeabilidade está vinculada ao modelo de desenvolvimento urbano do século 20, voltado para o automóvel, que gerou avenidas nos fundos de vale e estacionamentos nos subsolos, que são péssimos para a drenagem urbana.

Na mobilidade, o que é importante fazer?
Promover a transição energética, abandonando gradativamente os combustíveis fósseis, e priorizar os modais coletivos e ativos. Trens, metrôs, ônibus elétricos, bicicletas e andar a pé são as melhores alternativas; o automóvel é a pior e precisa ser desestimulado.

É possível mudar essa lógica?
Possível é, mas é necessário um esforço conjunto do poder público, do setor privado e dos cidadãos. Os governos precisam sair do discurso e da demagogia e priorizar os investimentos em transporte coletivo movido a energia limpa. Os modais coletivos e ativos precisam ter faixas exclusivas para aumentar velocidade e segurança. Significa reduzir drasticamente os investimentos voltados para os carros e limitar seu espaço no viário, além de aumentar o seu custo para circulação.

 

Foto shutterstock

Foto shutterstock

 

Como educar a população para usar menos o carro?
Com educação desde a primeira infância para criar uma nova mentalidade. Precisamos formar pessoas que estejam conscientes de que a mudança é inevitável para sobreviver no planeta. Sem apoio da população, as mudanças não serão viabilizadas do ponto de vista político.

O que é prioritário fazer em São Paulo nesse sentido?
Por um lado, investir na formação de professores e na cultura urbana, contribuir na formação de uma mentalidade baseada na sustentabilidade. Por outro, promover um novo modelo de desenvolvimento, contendo o crescimento horizontal das cidades, ocupando terrenos e edifícios vazios ou subutilizados e adensando ao longo do transporte coletivo, de modo que a moradia esteja mais próxima do trabalho. O transporte coletivo precisa ter conforto, rapidez, segurança e custo acessível. As ciclovias e calçadas precisam ser mais seguras, iluminadas e articuladas. Sem melhores condições, o cidadão continuará desejando usar o automóvel. A formação para a cidadania será insuficiente.

Circuito Vale Europeu é o ponto de partida de uma cicloviagem repleta de natureza, cultura e gastronomia

Circuito Vale Europeu é o ponto de partida de uma cicloviagem repleta de natureza, cultura e gastronomia

Primeiro roteiro brasileiro planejado para o cicloturismo, o Circuito Vale Europeu envolve cenários de grande beleza, muita história – já que essa região de Santa Catarina foi povoada por imigrantes europeus, especialmente alemães e italianos – e atrativos como arquitetura colonial e gastronomia típica.

Os 300 km de estradas de terra entrecortam nove municípios – Timbó, Pomerode, Indaial, Ascurra, Rodeio, Dr. Pedrinho, Rio dos Cedros, Benedito Novo e Apiúna – com vilarejos charmosos e planejados para serem percorridos de bicicleta. Há pontos de apoio, ótima sinalização pelo caminho, boas pousadas e restaurantes.

A base do roteiro pode ser Pomerode, conhecida como a cidade mais alemã do Brasil. É um lugar encantador por reunir dança, idioma, arquitetura, culinária e costumes herdados da cultura alemã e que são preservados pela população com carinho e dedicação.

Casa Siewert, que vende produtos coloniais na região - foto Sergio Luiz Pereira

Casa Siewert, que vende produtos coloniais na região – foto Sergio Luiz Pereira

 

A cidade mantém ciclovias em toda sua região central e as estende em circuitos turísticos, como a Rota do Enxaimel – um percurso de 16 km onde mais de 50 casas feitas com a técnica construtiva enxaimel compõem o cenário. Trazida por imigrantes alemães na segunda metade do século 19, essa técnica consiste no uso de peças de madeiras unidas por encaixes, sem nenhum prego ou parafuso. Os vãos são preenchidos por tijolos ou taipas, e o interessante é que, por ser toda encaixada, a casa pode ser desmontada e remontada!

Embora as belezas de todo o Vale Europeu sejam inúmeras, vamos nos ater nessa coluna aos atrativos de Pomerode, onde uma semana de pedal é uma experiência inesquecível, especialmente porque a cidade é um verdadeiro presépio germânico, muito bem cuidado e preservado.

 

Estrada na cidade de Pomerode, em Santa Catarina - foto divulgação

Estrada na cidade de Pomerode, em Santa Catarina – foto divulgação

 

Na Rota do Enxaimel, não deixe de visitar a Casa Siewert, que vende produtos coloniais e passe também pela casa da família Baumann, que produz ótimas conservas. Para almoçar, tanto o Rancho Lemke como o Rota da Truta são incríveis. O aconchegante Lemke tem ótimas cervejas, especialidades alemãs e até pratos vegetarianos. A Rota da Truta oferece sequência de trutas preparadas em sete diferentes receitas, trazidas à mesa com vários acompanhamentos. Vale conferir!

Outros pontos de interesse são o tour interativo na fábrica Nugali, de chocolates; a Casa Radünz, uma das mais belas construções da imigração alemã, toda preservada e com móveis de época; a Trilha da Natureza, onde se percorre um caminho curto pela Mata Atlântica, com belas cachoeiras; e a Delicaten Bolachas e Cucas, quitutes feitos por Dona Elia Maske e família, conhecida também por produzir a melhor cuca de Pomerode. Pausa perfeita para quem pedala e precisa de uma energia extra para ganhar fôlego!

Descubra São Paulo a pé e se surpreenda com lugares, visões, histórias e segredos da capital

Descubra São Paulo a pé e se surpreenda com lugares, visões, histórias e segredos da capital

Conheça tours guiados e passeios incríveis para fazer pela cidade de São Paulo

No verão, as caminhadas tornam-se ainda mais convidativas. Com roupas leves, uma mochila pequena e um par de calçados confortáveis dá vontade de perambular pela cidade o dia todo… E São Paulo é uma cidade particularmente especial para isso, pois tem um panorama histórico, cultural e gastronômico incrível, com inúmeras opções de passeios.

Uma boa dica é se juntar a grupos experientes nessa área. Um exemplo é o Free Walking Tour de São Paulo, que trabalha com o conceito de economia colaborativa: quem participa define o quanto vale o passeio, deixando contribuições como forma de apoio ao projeto. Os quatro tours oferecidos são feitos em português ou inglês para grupos de no máximo 25 pessoas. É preciso reservar online pelo site https://www.saopaulofreewalkingtour.com.

São Paulo Free Walking Tour na região central de SP | Foto Divulgação

São Paulo Free Walking Tour na região central de SP | Foto Divulgação

 

O roteiro pelo centro histórico de São Paulo dura três horas e meia e passa pela Catedral da Sé, Theatro Municipal, edifício Copan, edifício Matarazzo, Farol Santander, Mosteiro de São Bento, Faculdade de Direito do largo São Francisco, edifício Martinelli, Vale do Anhangabaú, Viaduto do Chá e edifício Itália, entre outros pontos. Acontece aos sábados, às 10h30, e o ponto de encontro é a Praça da República, ao lado do Centro de Informações Turísticas (metrô República).

 

Caminhada Noturna | Foto Eli Hayasaka

Caminhada Noturna | Foto Eli Hayasaka

 

Há um tour pelo Parque do Ibirapuera aos sábados, às 15h30, que envolve todos os atrativos e museus do parque; um roteiro pelos bairros de Pinheiros e Vila Madalena que acontece aos domingos, às 10h30, mostrando os grafites e a arte de rua, como o Beco do Batman e a escadaria do Patápio, além dos bares e restaurantes da região; e ainda uma caminhada em grupo aos domingos, às 15h, na avenida Paulista, símbolo da cidade. Os casarões antigos, o Masp, os parques Trianon e Mário Covas, o Sesc Paulista, a Japan House e o Mirante 9 de Julho fazem parte do roteiro de duas horas e meia, além de outros lugares imperdíveis.

Já a experiência de caminhar à noite pela cidade é o foco do projeto Caminhada Noturna pelo Centro, que já ultrapassou a marca de 300 edições e conta sempre com a participação de especialistas e personalidades de áreas como arquitetura, artes plásticas, administração pública, história e urbanismo.

Os roteiros gratuitos acontecem sempre às quintas-feiras e o ponto de encontro costuma ser a Biblioteca Mário de Andrade, às 20h. Não há necessidade de se inscrever antecipadamente: é só comparecer no horário. Vale conferir no Instagram do grupo: @caminhadanoturnacentrosp. A Catedral da Sé, o Mosteiro de São Bento, o Palacete Tereza, que abriga a Casa de Francisca; e o Farol Santander, antigo Prédio do Banespa, fazem parte desse roteiro noturno e surpreendente.

Diretora de audiovisual da Ciclovia Musical, Denise Silveira fala sobre sua relação com a bicicleta

Diretora de audiovisual da Ciclovia Musical, Denise Silveira fala sobre sua relação com a bicicleta

A diretora audiovisual do projeto que une música e bike, fala sobre sua trajetória e da necessidade de mais segurança nas ruas

Gaúcha radicada em São Paulo, Denise Silveira, de 54 anos, já viajou por vários países para mostrar a relação da bike com as pessoas. As jornadas, desde 2016, renderam a exposição “Ocupação Bicicleta”, exibida no metrô de São Paulo, e “Bicicleta, Identidade Cultural”, na Unibes Cultural.

Diretora de audiovisual da Ciclovia Musical, projeto criado e dirigido por Giane Martins que une música e bike, ela também dirigiu o premiado “Alma de Bicicleta”, filme que é uma criação coletiva de mulheres 40, 50 e 60+ mostrando como superam as dificuldades para pedalar no Brasil, Finlândia, Grécia e Índia.

Denise Silveira - Ciclovia Musica l Foto Leandro Godoi

Denise Silveira – Ciclovia Musica l Foto Leandro Godoi

 

Denise se tornou uma ciclista urbana devido a um problema nos joelhos: ficou oito meses sem andar e a bicicleta foi a salvação. “Mas não posso percorrer grandes distâncias sem o auxílio do pedal assistido”, diz ela, que hoje atua em várias frentes com a bike, fazendo fotos e filmes, palestras e rodas de conversa em escolas públicas. Saiba mais na entrevista a seguir:

Em sua mostra “Ocupação Bicicleta”, você mostrou a íntima relação das pessoas com a bicicleta em várias cidades europeias. Por que no Brasil estamos tão distantes desse cenário?
Por falta de vontade política dos gestores e falta de educação no trânsito. As pessoas ainda querem chegar mais rápido e chegar primeiro. Eu quero ir devagar, saborear o caminho, conversar com uma pessoa desconhecida, desejar bom dia, ouvir os passarinhos. Sem uma conscientização de que a gente precisa mudar o estilo de vida, ter empatia com o outro e preservar o meio ambiente, vamos continuar estagnados no mesmo lugar.

Quais são os maiores obstáculos para que as mulheres pedalem e o que é preciso fazer?
O maior obstáculo, hoje, é a segurança pública. As mulheres são assaltadas, furtadas, importunadas e assediadas sexualmente a pé, de bicicleta, no transporte público. E quando decidem correr o risco enfrentam a falta de ciclovias, a alta velocidade dos carros e a falta de respeito dos próprios ciclistas. As mulheres que começam a pedalar se inspiram umas nas outras, na amiga, na colega, em um grupo do seu bairro.

Quais são as novidades do projeto Ciclovia Musical, que junta música e bicicleta?
Em novembro haverá a Ciclovia Musical em Salvador, onde vou mediar uma roda de conversa com estudantes ao lado do maestro Carlos Prazeres. Em 2023, teremos edições em outras capitais, e a ideia é que as pessoas possam pedalar juntas e parar para apreciar uma programação de primeiríssima qualidade, que transita por diversos estilos musicais.

Como foi sua palestra na Velo-city, conferência global que ocorreu na Eslovênia?
Meu tema foi “Não podemos atrair mulheres com histórias sobre homens”. O ambiente do ciclismo ainda é muito masculino e não chega até as mulheres. A receptividade foi enorme, eu trabalho nos bastidores e fora do Brasil há um interesse maior nesse aspecto profissional. Aqui, querem nos descrever com estereótipos ou esperam que a gente vire influenciadora. Não espero influenciar ninguém, mas promover informações que permitam que as pessoas possam formar a sua própria opinião e fazer a melhor escolha para elas.

Rumo à descarbonização: eletrificação das frotas de ônibus começam a ganhar espaço no Brasil

Rumo à descarbonização: eletrificação das frotas de ônibus começam a ganhar espaço no Brasil

O esforço global para enfrentar as mudanças climáticas envolve a eletrificação das frotas de ônibus

Enquanto um ônibus elétrico reduz as emissões em mais de 184 toneladas de gás carbônico na atmosfera, o equivalente ao plantio de 1.311 árvores por ano, um ônibus comum consome 90 litros de diesel em um dia de operação. Além de sustentáveis, mais econômicos e silenciosos, os ônibus elétricos apresentam melhor desempenho e menor custo de manutenção.

Na América Latina, o país que lidera a operação de ônibus elétricos é o Chile, com 819 veículos em atividade. Em seguida vem a Colômbia, com 588; o México, com 409; e o Brasil, com 350. Já a cidade de Shenzen, na China, destaca-se por ser a primeira metrópole do mundo com 100% da frota de ônibus composta por veículos elétricos. Em seis anos, a cidade eletrificou toda sua frota municipal, e conta hoje com mais de 18 mil ônibus elétricos circulando, em um protagonismo que superou as marcas do continente europeu. Além disso, a cidade chinesa converteu toda a sua frota de 22 mil táxis para veículos elétricos.

O tema vem ganhando corpo no Brasil, com diversas cidades realizando testes com ônibus elétricos, como São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Salvador e Brasília. A capital paulista conta com apenas 219 ônibus elétricos em sua frota, que reúne 14 mil ônibus. Mas de acordo com o Programa de Metas da prefeitura paulistana, até 2024 ao menos 20% da frota deverá ser de ônibus elétricos, cerca de 2.600 veículos.

Para alcançar esse objetivo, a prefeitura anunciou uma parceria com a chinesa Higher Bus, que deve entregar duas mil unidades nos próximos dois anos. Em 2048, a projeção é ter uma frota 100% eletrificada.
Um destaque no estado de São Paulo é a cidade de São José dos Campos, que em novembro de 2021 comprou 12 ônibus elétricos articulados da BYD (Build Your Dreams), com capacidade para transportar 170 passageiros.

 

Frotas de Ônibus elétrico fabricado pela empresa Eletra, de São Bernardo do Campo - Foto divulgação

Ônibus elétrico fabricado pela empresa Eletra, de São Bernardo do Campo – Foto divulgação

 

Francisco Christovam, Presidente da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), também ressalta o inspirador exemplo da empresa Eletra, sediada em São Bernardo do Campo, que há 22 anos se dedica à montagem de ônibus elétricos. Líder nacional em tecnologia de transporte sustentável, o grupo mudou-se em julho para um novo espaço, onde terá capacidade de produzir 150 ônibus elétricos e híbridos por mês, ou até 1.800 por ano.

Para Christovam, a história da Eletra mostra como a eletrificação do ônibus é importante no setor, mas segundo ele ainda é necessária a consolidação de um tripé: disponibilidade, confiabilidade e razoabilidade.

“Precisamos de mais opções tecnológicas e dentro de parâmetros aceitáveis de custo. Não será possível chegar a um bom termo sem planejamento e políticas públicas bem estruturadas. Mas isso não muda o fato de que precisamos migrar, com urgência, para um transporte coletivo limpo nas cidades brasileiras.”